Cosmética clean: produtos com ou sem perfume?
De hidratantes a desmaquilhantes e séruns, a tendência dos cosméticos clean chegou ao universo da beleza, levando as marcas a revelar no rótulo mais os componentes que não incluem do que os que lhes dão corpo. A fragrância é só um deles. Afinal, faz bem ou mal?
Limpar a pele com um desmaquilhante perfumado ou um hidratante floral faz parte da experiência de uma rotina de beleza luxuosa. Porém, o debate sobre usar cosméticos com ou sem perfume já existe há algum tempo e conquista apoiantes dos dois lados.
Em conversa com Joana Nobre, farmacêutica e consultora científica em dermocosmética, percebemos que uma fragrância “não é só uma mistura química que tem cheiro, é mais do que isso: engloba um valor cultural, histórico, social, económico e emocional. As substâncias perfumadas são compostos orgânicos de origem natural, como óleos essenciais e extratos, ou de origem sintética, com um cheiro característico que confere aroma a determinado produto. No entanto, é importante frisar que alguns produtos rotulados como sendo ‘sem perfume’ podem conter moléculas odoríficas ou geradoras de notas olfativas; simplesmente não têm perfume adicionado”.
Antes de mergulharmos nos efeitos negativos que as fragrâncias em cosméticos podem ter na pele, é importante referir que estas consequências se aplicam tanto aos perfumes naturais como aos sintéticos.
Neste universo, é fácil cair no erro de acreditar que algo natural é obrigatoriamente melhor, mas nem sempre é assim, e ambos podem originar problemas.
“As substâncias perfumadas naturais não são melhores do que as sintéticas. Os ingredientes mais alergizantes usados em cosméticos vêm de fragrâncias naturais e mitigamos o risco de alergias a fragrâncias quando optamos por compostos de síntese. É essencial perceber que os óleos essenciais, muito usados em fórmulas que são vendidas como não contendo perfume, são perfumados e têm várias substâncias que podem ser nocivas para a pele sensível ou reativa”, adverte Joana Nobre.
Proteger a pele
De acordo com a Academia Americana de Dermatologia, as fragrâncias são consideradas a principal causa de reações alérgicas na pele, afetando cerca de 1% da população.
“Algumas pessoas com condições inflamatórias da pele, como eczema, psoríase, acne ou rosácea, podem piorar com produtos perfumados. Um relatório do American Journal of Clinical Dermatology revelou que de 1,7% a 4,1% da população é sensível a misturas de fragrâncias em produtos”, refere a farmacêutica.
“Sabe-se também que a dermatite de contacto alérgica a ingredientes de fragrâncias é mais frequentemente causada pela exposição a cosméticos e envolve principalmente o rosto, axilas ou mãos”, isto porque a nossa sensibilidade é diferente nas várias zonas do corpo.
Mas se existem consequências negativas por causa de alguns cosméticos perfumados, porquê usá-los? “O perfume nas fórmulas serve para conferir um aroma agradável, mascarar o cheiro inerente de alguns ingredientes da formulação e melhorar a experiência de uso do produto pelo consumidor. Os perfumes conferem benefícios importantes que são tangíveis ou intangíveis, mas sempre valorizados; por exemplo, resolver problemas funcionais importantes e satisfazer necessidades emocionais valorizadas”, começa por explicar Joana Nobre.
“Vários estudos confirmam que as fragrâncias aumentam o bem-estar e têm um impacto positivo na psique, têm o poder de desencadear uma série de emoções positivas e melhorar o humor. Assim, as fragrâncias estimulam o cérebro e criam uma ligação emocional com um produto, aumentam a perceção de valor e permitem um melhor reconhecimento da marca. Os estudos mais recentes de marketing olfativo e de consumo indicam que a fragrância é um fator-chave que afeta a preferência do consumidor por determinado produto cosmético. Uma fragrância agradável favorece também a aplicação dos produtos, algo essencial para conseguirmos ver os seus resultados a médio ou longo termo”, conclui a especialista.
Alerta vermelho!
“Por causa do potencial alergizante de algumas fragrâncias ou moléculas odoríficas, foi determinado pela União Europeia, em 2009, restringir a utilização de 26 alérgenos que compõem determinadas notas olfativas”, refere Joana Nobre.
Existem várias substâncias que podem desencadear reações alérgicas, entre elas o benzyl alcohol, citral, citonellol, eugenol, linalool e limonene.
Os cosméticos não podem ser classificados como bons ou maus por serem perfumados ou não
Futuro positivo
Quando questionada sobre se os produtos sem perfume são melhores do que os restantes, Joana Nobre defende que não. “A fragrância é apenas um dos ingredientes na fórmula do cosmético e a sua presença ou ausência não faz dele bom ou mau. Há muitas outras coisas a analisar. O que acontece é que, em determinadas populações, a ausência de fragrância nas fórmulas oferece, à partida, maior segurança relativamente ao risco de reações alérgicas ou de sensibilidade aos produtos”.
A realidade é que os cosméticos não podem ser classificados como bons ou maus por serem perfumados ou não, até porque produtos verdadeiramente não perfumados cheiram a outros ingredientes e, muitas vezes, podem ser desagradáveis.
Aliás, “16% dos pacientes com eczema são sensíveis às fragrâncias, mas apenas 1% a 3% sofre reações alérgicas com as mesmas, de acordo com o Scientific Committee on Consumer Safety. Logo, podemos concluir que as fragrâncias são consideradas seguras. Apenas uma pequena parte da população pode desenvolver uma reação alérgica e quando isso acontece têm de escolher produtos sem perfume”, conclui a especialista em dermocosmética.