Bem-estar

Sabe o que é o barefooting? Descubra tudo sobre esta prática

Tire os sapatos e caminhe para sentir a Natureza. Se o fizer está a praticar barefooting – assim se chama a grande novidade na área de bem-estar que é benéfica para a mente, músculos, equilíbrio e postura.

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Rita Caetano
Escrito por
Ago. 14, 2024

A meio de um passeio em plena Natureza, na ilha do Pico, uma das atividades que fazia parte de um retiro em que participámos, foi-nos pedido, inesperadamente, que tirássemos as sapatilhas e as meias. O gesto de olhar para o chão foi automático e as nossas caras deixavam transparecer alguma relutância. Mas em Roma sê romano, já diz o ditado popular, e começámos a descalçarmo-nos.

O desconforto inicial deu lugar a uma perceção da terra que de outra forma não é possível. Quando os pés tocaram no solo, sobressaíram as diferentes texturas, o frio e a humidade. Foi como se os sentidos despertassem repentinamente. Esta foi uma experiência de barefooting (que, em português, significa andar descalço) inesperada, mas dois anos volvidos, tornou-se a grande novidade na área do bem-estar, pois tem muitos benefícios para a nossa saúde física e mental.

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A força do enraizamento

Numa altura em que a maioria da população mundial vive em centros urbanos, o contacto com a Natureza é cada vez mais premente. Os benefícios que esta nos traz são sobejamente conhecidos e provados pela ciência, e há já quem não passe sem os banhos de floresta (inspirados na terapia japonesa shinrin-yoku), mas saiba que se se puder descalçar ainda melhor.

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“Ainda há não muito tempo, olhava-se com desdém para quem abraçava árvores, mas a verdade é que nos faz bem, tal como andarmos descalços em plena Natureza por causa do enraizamento. Quem não reparou na felicidade de um bebé ou de uma criança a caminharem descalços numa zona relvada”, afirma Bruno Ribeiro do Couto, responsável pelas unidades cognitivas da SHA Wellness Clinic e especialista em Rendimento Cognitivo e Neuropsicologia.

Deveríamos estar em contacto com a Natureza, durante 45 minutos, 3 a 4 vezes por semana, aconselha Bruno Ribeiro do Couto, especialista em Neuropsicologia

“Não sabemos se, no filme Pretty Woman, quando Julia Roberts tira os sapatos e as meias a Richard Gere e atira o telemóvel para longe para ele o ir buscar, sabia os benefícios do que estava a fazer, mas hoje já são conhecidos. Por exemplo, o nível de radiações eletromagnéticas (prejudiciais para a nossa saúde) no nosso corpo diminui quando estamos em contacto com a terra. A tecnologia fez com que fosse possível fazer essas medições”, esclarece o nosso entrevistado.

Atenção plena

Um dos nomes que mais tem alertado para os benefícios de caminhar descalço é Miguel Cunha, podologista e fundador da Gotham Footcare, uma clínica especialista em cuidados dos pés em Nova Iorque. O podologista realça que o barefooting fortalece os músculos dos pés, o que ajuda a melhorar a postura e o equilíbrio. Este também melhora devido a uma melhor capacidade de se saber onde o corpo está no espaço. O contacto com a Natureza através do solo faz com que a nossa atenção se centre no aqui e no agora e na perceção do mundo que nos rodeia, estimulando a calma, reduzindo o stresse e aligeirando os pensamentos.

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Relva, erva, areia, cascas de árvores, madeira, seixos são apenas alguns exemplos dos terrenos que pode escolher para experimentar o barefooting. No entanto, convém que saiba onde está a pôr os pés para evitar lesões e ferimentos. Miguel Cunha sugere superfícies mais macias como a relva ou erva e areia, porque as duras podem gerar enfraquecimento da fáscia plantar, o que pode resultar em dor e desconforto não apenas dos pés, mas também de todo o corpo. Pessoas com neuropatia nos pés (danos nos nervos que podem causar dormência, muitas vezes causados pela diabetes) não devem andar descalças, porque estão em maior risco de lesão e infeção.

Cromoterapia e novidades

Se não se sente à vontade para tirar os sapatos, convém lembrar que mesmo calçada são muitos os benefícios de uma imersão na Natureza. Como nos diz Bruno Ribeiro do Couto, um dos primeiros é a cromoterapia. “Hoje sabemos que a cor verde, devido à nossa evolução como espécie, está muito gravada no nosso cérebro como um sinal de prosperidade. Numa zona verde, o nosso cérebro sente que temos mais possibilidades de ter êxito, porque iremos encontrar comida, água e um local onde nos possamos proteger mais facilmente.”

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O também professor do Departamento de Anatomia Humana e Psicobiologia da Universidade de Múrcia acrescenta ainda a importância do fator novidade. “Vivemos cada vez mais em cidade, onde o padrão visual é muito monótono e, se passarmos todos os dias pelo mesmo sítio, por mais que os edifícios sejam bonitos, não há novidade. Na Natureza, já não é assim. Todos os dias pode haver uma cor diferente, uma erva e uma flor distintas”, explica.

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E por que é que a novidade é importante? “Sabemos, através da teoria da evolução das espécies, que, perante algo novo, o nosso cérebro não sabe se aquela vai ser útil e presta atenção, além disso, faz com que uma série de neurotransmissores seja libertada no cérebro, nomeadamente a dopamina, que é o marcador do prazer. A grande vantagem é que em plena Natureza a dopamina é libertada de forma sustentada e não como acontece quando estamos a fazer scroll no telemóvel. Nesse caso, a dopamina atinge picos e vicia-nos exatamente como acontece quando fumamos um cigarro. A nicotina provoca um pico de dopamina e, quando desce, o nosso cérebro pede-nos mais e o mesmo acontece quando estamos agarrados ao telemóvel”, alerta o responsável pelas unidades cognitivas da SHA Wellness Clinic.

Ativar os dois hemisférios cerebrais

O especialista em Rendimento Cognitivo e Neuropsicologia refere ainda o efeito benéfico que está ligado à neurociência e que tem que ver com a ativação dos dois hemisférios cerebrais, o esquerdo e o direito, que é feita, sobretudo, através do corpo caloso, um conjunto de fibras que une os dois lados do cérebro. “Normalmente, quando estamos na Natureza, como temos tantos estímulos e coisas novas, temos a tendência a utilizar os campos visuais de forma mais ampla e isso ativa ambos os hemisférios cerebrais, ou seja, reequilibramos o nosso funcionamento cerebral”, refere.

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“Isto é francamente importante porque equilibra o nosso lado emocional e o racional, não deixando que um supere o outro. Este princípio da ativação dos hemisférios cerebrais está na base de uma das principais teorias de tratamento para o trauma e para o stresse pós-traumático, que se chama EMDR [Eye Movement Desensitization and Reprocessing, que significa dessensibilização e reprocessamento através do movimento ocular], que faz com que se consiga sair da espiral de negatividade que aquelas situações nos causam, porque se passa sempre a ver as coisas de um ponto de vista objetivo e emocional”, continua.

O bem que faz

Para caminhar num espaço verde, precisamos pouco mais do que vontade e roupa adequada às condições atmosféricas. Os benefícios do barefooting como estamos a ver são elevados, como nos disse, em entrevista, no ano passado, Alex Gesse, fundador do Instituto de Banhos de Floresta de Portugal e do Instituto de Baños de Bosque, que se tem dedicado a estudar os benefícios que a Natureza nos pode proporcionar. A imersão na natureza:

  • reduz o stresse, já que diminui os níveis de cortisol;
  • aumenta o estado de ânimo positivo e dá sensação de bem-estar psicológico;
  • incrementa a sensação de vitalidade e a capacidade de concentração;
  • diminui a tensão psicológica/ansiedade, a depressão, a raiva, a fadiga, a confusão e a hostilidade;
  • melhora o sono;
  • aumenta a perceção da pertença social;
  • reforça o sistema imunitário, com um aumento de células natural killer (NK);
  • diminui os níveis de pressão arterial;
  • ajuda a recuperar mais depressa de uma cirurgia ou doença.

Rodeados de verde

“O contacto com a Natureza e o caminhar em espaços verdes são francamente importantes e retroalimentam a nossa parte genética. Efetivamente nós somos fruto da evolução de muitos milhões de anos, mas a maior parte desse período não foi passada no meio do cimento, mas da Natureza”, realça Bruno Ribeiro do Couto. E é no meio da Natureza que se encontram as duas unidades da SHA Wellness Clinic onde Bruno Ribeiro do Couto lidera as unidades cognitivas. Nestas clínicas de bem-estar, a saúde é entendida não só como a ausência de doença, mas também como um estado ótimo de bem-estar físico, mental e espiritual em harmonia com o meio ambiente.

© Christophe Raynaud de Lage

“Um projeto como o nosso faz todo o sentido numa localização destas, porque também beneficiamos do entorno. Em Espanha estamos numa zona protegida, que se chama serra Gelada, e que se situa perto do mar, não muito longe de Alicante e Valência. Para mim, aquela montanha tem alguma coisa, sente-se ali uma energia muito boa. No México, todos os quartos têm vista para o mar e, quando se sai dos mesmos, somos também impactados pelo verde. Em ambas as localizações, tentamos que todos os quartos e todos os consultórios tenham uma espécie de jardim suspenso e que todas as janelas tenham vegetação”, explica o especialista em Rendimento Cognitivo.

Uma atividade a colocar na agenda

Não é, por isso, de estranhar que a imersão na Natureza seja incentivada na SHA Wellness Clinic. “Em Espanha, temos todos os dias às 7h da manhã um passeio ao farol de Albir, acompanhado por um especialista em atividade física, por um trilho no meio da Natureza que os nossos hóspedes adoram. O mesmo acontece com os passeios na praia. Para os mais resistentes, temos ainda a subida à montanha”, exemplifica o neuropsicólogo. Bruno Ribeiro do Couto não tem dúvidas de que as caminhadas “fazem milagres pela nossa saúde, pois aliviam o stresse, ajudam a controlar o peso, a tensão arterial e a diabetes e melhoram o rendimento cardiovascular. Para obter esses benefícios as pessoas só têm de se esforçar um bocadinho para sentir o seu coração acelerar”.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº289, julho de 2024.

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