Os benefícios do Hatha Yoga Funcional: estética vs. bem-estar
A palavra funcional está em todas as bocas, em qualquer lugar onde se promove o movimento e onde alguém tem sempre uma nova ideia de como se deve ou não mexer o corpo. Este é o último buzz no mundo do fitness e do bem-estar, e o yoga também não escapa a esta tendência.
Mas o que é que isto quer dizer realmente? O que é que se pretende com uma abordagem funcional? O que é que isto implica de novo, na prática do que sempre fez da mesma forma?
Funcional implica fazer algo que promove a eficácia da forma como o “todo” funciona, e que permite efetuar alguma coisa da melhor maneira. Quando usada com a palavra movimento, implica mover-se de uma maneira que suporta o bem-estar e a mobilidade de todo o corpo.
Eu prefiro esta segunda definição, “projetado para ser útil, e não atraente”. A utilização de alinhamentos no yoga sempre foi polémica, e no Hatha Yoga projeta-se muito para o mundo a ideia do alinhamento que visa a perfeição (da estética da postura, das curvas suaves e graciosas, dos corpos sem ângulos, da fluidez) ao desaproveitamento dos alinhamentos biomecânicos, que respeitam as capacidades de mobilidade e flexibilidade de cada individuo, bem menos harmoniosos à primeira vista.
Afastar-se da necessidade subjetiva de apresentar posturas esteticamente atraentes – Asanas – é mais fácil de dizer do que fazer. A pressão social é grande.
Atrai-nos mais o olhar para uma foto com uma jovem, e toda a flexibilidade e mobilidade características da sua idade, do que para aquela de um corpo mais maduro e pouco inclinado à atividade física. E é difícil para nós, profissionais do yoga mais terapêutico, pois queremos “parecer certos” e mesmo assim manter uma qualidade de atratividade visual ao apresentarmos o nosso trabalho.
Só quando se percebe mais do corpo, quando a prática se torna mais madura, é que o nosso olhar muda, e a imagem que precisamos projetar se transforma. Prevalece a ideia de bem-estar e realidade corporal à de uma estética pouco viável para a maioria de nós.
É um facto que quem experimenta o Hatha Yoga Funcional sente a diferença no seu bem-estar corporal e mental, e por isso dificilmente regressa a uma prática mais “tradicional”, mais preocupada com a representação da postura e não tanto como cada corpo tem a sua forma única de projetar a mesma.
A sua prática de yoga não deve fazer de si algo que não é, mas sim estimulá-lo para que se torne a melhor versão possível de si mesmo.
De facto, um “cão de cabeça para baixo”, Adho Mukha Svanasana, ou uma cobra, Bhujangasana, com alinhamentos funcionais, podem parecer esteticamente menos apelativos numa foto, mas claro que os benefícios não se veem no Instagram.
É preciso apenas uma mudança na maneira como percebemos uma postura do yoga: integrar os seus benefícios em vez de avaliar a idealização da sua representação.
Em vez de o inundar com muitos detalhes, apresento-lhe quatro pontos importantes para incluir uma abordagem mais funcional à sua prática, ou seja para ter uma prática que irá beneficiar as particularidades do seu corpo:
Como incluir uma abordagem mais funcional à sua prática
1. Mobilidade versus flexibilidade
Mobilidade é a capacidade de se mover livre e facilmente. Para se mover livre e facilmente precisamos de uma combinação de força, flexibilidade, equilíbrio e coordenação.
Mobilidade é o que precisamos para nos movermos adequadamente e confortavelmente. É, por exemplo, o que nos permite agachar para levantar e carregar objetos pesados.
Quando nos referimos ao corpo, a flexibilidade equipara-se à elasticidade. Por vezes é descrita como a capacidade de mover uma articulação numa amplitude específica de movimento.
A prática de yoga (Hatha Yoga) é frequentemente associada à ideia de se ficar mais flexível ou que precisa de ter de antemão uma boa flexibilidade para se iniciar. É fácil entender-se este erro comum quando se vê quão extremas algumas posturas possam ser.
De facto, fazer algo como colocar o pé atrás da cabeça exige uma elasticidade extrema dos tecidos moles, bem como uma grande mobilidade nas articulações das ancas. Mas, no fundo, não se consegue entender qual é a contribuição do desenvolvimento de uma elasticidade tão excessiva para o bom funcionamento do corpo.
Esta é frequentemente relacionada com lesões, degradação ou distúrbios do tecido conjuntivo. Alegre-se, pois uma prática sólida de yoga não exige que se façam posturas tão extravagantes.
Porque nos alongamos no yoga? De quanta flexibilidade precisamos? Para recuperar a mobilidade natural do corpo. Os tecidos moles podem perder sua flexibilidade por muitas razões, limitando a nossa capacidade de movimento, causando rigidez e dor.
No fundo precisamos apenas de alongar o suficiente para:
• Oferecer um pouco de stresse saudável aos tecidos corporais;
• Reconfigurar o sistema nervoso somato-sensorial para ativar e/ou soltar conscientemente áreas esquecidas;
• Recuperar o nosso equilíbrio e uma amplitude natural de movimento.
2. Variabilidade
Uma das grandes vantagens do yoga é que promove o movimento nos diferentes planos existentes, o que não acontece em muitas outras práticas, como sejam o running ou o cicling.
Uma prática equilibrada oferece movimentos nos três planos anatómicos. Estes são uma espécie de placas planas ou superfícies que dividem o corpo. Os movimentos podem ser descritos como tendo lugar em cada um destes planos, ou em paralelo com estes.
• Plano sagital: este plano vertical atravessa o centro do corpo dividindo a metade esquerda da direita.
O termo sagital vem da palavra latina sagitta que significa seta. Pode imaginar um arqueiro levantando um braço para cima e para trás para atirar uma flecha, puxando o braço para trás e disparando a flecha para a frente. Todas essas ações estão no plano sagital.
A maioria dos movimentos das saudações ao Sol ocorrem no plano sagital.
• Plano coronal (ou frontal): este plano vertical divide as partes dianteira e traseira do corpo.
Coronal vem da coroa latina que significa coroa ou guirlanda (embora, um par de fones de ouvido seja uma imagem mais útil). Executar um pião ou mover-se de Guerreiro II tem lugar no plano coronal.
• Plano transversal: um plano horizontal (como um tampo de mesa) que divide as metades superior e inferior do corpo.
As torções ocorrem normalmente no plano transversal. Embora estes planos não sejam referidos diretamente nas aulas de yoga, é importante tê-los em mente para que os movimentos sejam feitos regularmente em cada um dos três planos.
A principal tendência diz respeito aos movimentos efetuados no plano sagital (tal como o formato dos tapetes de yoga).
3. Bio individualidade
Todas as pessoas são diferentes, todos os corpos são diferentes: assimétricos, com mais ou menos flexibilidade, mais ou menos sensibilidade. Não há dois corpos iguais, não há duas formas de sentir idênticas. Não podem existir duas representações iguais da mesma postura.
Treina-se o corpo com a consciência funcional do mesmo, respeitando os seus limites, definidos pela relação entre a nossa força de vontade e a biomecânica individual (ou seja, capacidade física).
4. Divirta-se
Tire o melhor partido das técnicas que o yoga oferece testando diferentes modalidades, diferentes estilos e novas sequências, procurando uma prática cada vez mais funcional e adaptada às suas necessidades.
No yoga não se trata de ser mais flexível ou mais forte, mas de encontrar o melhor ponto de equilíbrio para a saúde interior e física.
Jean-Pierre de Oliveira é professor de yoga, autor e um earth activist. A sua inspiradora abordagem ao yoga adapta esta sabedoria antiga à vida dos ioguis modernos como um estilo de vida além das aulas. É conhecido pelo seu estilo genuíno de ensino e instrução técnica profissional reconhecida que o tem levado a participar em diversos eventos.