Saiba como identificar (e resolver) um ambiente profissional tóxico
Existem sinais típicos de que pode estar inserida num meio tóxico. Conversas de corredor e as críticas constantes não construtivas são alguns dos exemplos.
Ao todo, num ano, passamos cerca de 1960 horas no nosso local de trabalho se trabalharmos 40 horas semanais. Este número representa mais de metade do tempo da totalidade do nosso sono durante um ano (2920 horas, se dormirmos oito horas por dia).
Independentemente da profissão, é certo que o emprego é algo que nos ocupa a maior parte do tempo. É no local de trabalho que muitas vezes discutimos ideias, criamos expectativas, fazemos amizades e projetamos o nosso futuro.
Quando se gosta do que se faz já é meio caminho andado para nos sentirmos felizes, mas, como em qualquer relação, por vezes gostar não é suficiente.
Sendo uma empresa constituída por pessoas, é natural que existam valores e crenças distintos e que estes possam entrar em confronto. O problema surge quando estas crenças e valores são tóxicos e contaminam a empresa e os que fazem parte dela.
Os principais sinais
Um ambiente de trabalho tóxico tem uma enorme influência na vida dos colaboradores e no próprio funcionamento da empresa. Um dos principais sinais de um ambiente tóxico é o absentismo.
“É natural, neste contexto, que as pessoas fiquem doentes e que repetitivamente se ausentem quer para ir ao médico, quer porque pura e simplesmente não tiveram recursos para vir trabalhar e enfrentar a realidade”, explica a psicóloga clínica Vera de Melo.
Contudo, as situações mais evidentes são aquelas em que a crítica negativa substitui o construtivismo e a falta de confiança nos colegas ou nos superiores é claramente percetível. Falta de transparência e de reconhecimento, pressão constante e favoritismo também são indicadores de um ambiente profissional tóxico.
A esta lista podemos ainda acrescentar “a prevalência dos resultados sobre os comportamentos aceitáveis ou a inconsistência na aplicação das políticas e regras da empresa”, afirma Nuno Gonçalo Simões, diretor de capital humano na PwC Portugal, Cabo Verde e Angola.
A falta de foco para o que realmente importa é outro dos motivos de conflito. Normalmente, esta situação ocorre quando “na empresa a maior preocupação é com os interesses próprios em vez dos da organização”, sublinha Vera de Melo.
Empresas que não têm planos específicos de carreira e onde são desconhecidas as políticas internas também são mais propícias a ambientes tóxicos.
Evite as conversas de corredor
Os problemas relacionados com a comunicação (ou com a falta dela) estão relacionados com “a ausência e escassez de informação ou pelas comummente chamadas ‘conversas de corredor’, que poderão ter um impacto devastador nas organizações e nos seus colaboradores”, diz Nuno Gonçalo Simões.
Vera de Melo também é desta opinião e afirma que “‘mexericar’ alimenta o ambiente tóxico e causa esgotamento físico e mental aos elementos que dele fazem parte”.
Uma mensagem que não seja clara também pode levar a que surjam os mal-entendidos. “Os problemas de comunicação no trabalho costumam ocorrer quando esta não é direta, quando é incompleta ou, ainda, quando o seu conteúdo não é verdadeiro. Isso proporciona situações de incerteza e confusão que geram armadilhas mentais nas pessoas envolvidas e, definitivamente, erros ou falhas na atividade profissional”, afirma a especialista.
Trabalho de equipa
Melhorar um ambiente profissional tóxico pode não ser tarefa fácil. Este é um trabalho que depende não só das políticas da empresa, mas também da postura dos colaboradores. Estes “devem ser capazes de comunicar as suas preocupações e necessidades”, clarifica Vera de Melo.
O foco tem de estar orientado para a solução e não para o problema. Existem várias ferramentas que podem ajudar a controlar o ambiente profissional nas empresas. Uma delas são os questionários de clima organizacional, que, “além de permitirem colocar questões direcionadas para o que queremos saber, podem ainda ter perguntas abertas que poderão igualmente trazer informação relevante para as empresas acerca do seu clima organizacional”, exemplifica Nuno Gonçalo Simões
Com a análise destes estudos, é possível agir de uma forma mais objetiva sobre o problema em questão. Também existem as entrevistas de saída, que nos permitem saber quais foram os motivos de despedimento de uma pessoa, nas quais se pode verificar se existiram comportamentos nocivos que levaram à dispensa do trabalhador.
Algumas empresas têm ainda um Código de Conduta e canais formais próprios como “um comité de ética com identificação clara de processos e interlocutores ou uma linha de contacto anónima para que os colaboradores possam colocar dúvidas ou expor situações que consideram inadequadas, sem receio de retaliações e que garante consequências disciplinares sempre que se justifique”, esclarece o diretor de capital humano.
As consequências são para todos
Em situações de ambientes profissionais tóxicos, ocorre uma “quebra do contrato psicológico do colaborador com a empresa, refletindo-se em baixa motivação e reduzida produtividade”, afirma Vera de Melo.
Esta separação pode criar sentimentos negativos que depois se refletem em dores de cabeça, falhas de memória, depressão, ansiedade e em casos mais graves, situações de burnout. “Psicologicamente, abala a autoestima, tendo um impacto direto na forma como a pessoa se vê”, acrescenta a especialista.
No entanto, os problemas refletem-se não só na mente e no corpo dos envolvidos, como também na sustentabilidade da própria empresa.“Do ponto de vista organizacional, acrescem custos de recrutamento, formação de novos colaboradores e também os custos indiretos que são mais difíceis de mesurar, como por exemplo a imagem e reputação que passa para o mercado de trabalho, que, nos dias que correm, pode afetar uma empresa muito facilmente se existirem opiniões desfavoráveis acerca do clima organizacional”, aponta Nuno Gonçalo Simões.