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Como a Gen Z está a mudar o trabalho

Como a Gen Z está a mudar o trabalho

“O que eu sou não é o que eu faço.” Ao contrário das anteriores, a primeira geração a nascer com a Internet não quer ser definida pelo trabalho que tem e isso traz muitos desafios para o mundo laboral.

Por Set. 3. 2024

Como posso ter tempo para viver se trabalho das nove às 17h e gasto mais duas horas para ir para o trabalho?” Foi esta frase dita em lágrimas, após o primeiro dia de trabalho, em outubro de 2023, que tornou viral a TikToker Brielle Asero. Apelidada de mimada por muitos, preguiçosa por outros tantos, mas também aplaudida, tornou-se uma espécie de representante do pensamento da geração Z em relação ao trabalho.

Terá a jornada de trabalho de oito horas os dias contados quando esta geração for a maioria da força de trabalho, algo que vai acontecer em 2030? Resposta para essa questão ainda não existe, mas que o mercado de trabalho irá mudar parece inegável. O equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é algo que a Gen Z não quer abdicar. O que é que as empresas devem fazer para reter o talento é uma das questões que mais se põe, como nos disse Kristen Geez, especialista nesta geração, aquando da sua passagem por Lisboa para participar na Happy Conference 2024.

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Não é não

A geração Z é composta por pessoas nascidas entre meados da década de 1990 e 2010 e que já cresceram com a Internet, e, assegura Kristen Geez, a grande diferença para as anteriores “é falar abertamente do que não gosta e do que não aceita. Não há debate sequer, o não é mesmo não”.

A também professora, oradora e CEO da Advising Generation Z, um programa de orientação de diversão sem fins lucrativos que fornece apoio, recursos e orientação a alunos problemáticos entre os 10 e os 24 anos, diz que o que mais a entusiasma nesta geração é “o trabalharem em conjunto e não se importam com a cor, raça ou género. Querem direitos iguais e um tratamento justo em tudo”.

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Kristen Geez vê mais lealdade nesta geração do que nos millennials, geração à qual pertence. “Nós aprendemos a ser muito egocêntricos, porque vimos os nossos pais sacrificarem-se tanto por nós que receamos não nos sacrificarmos o suficiente. É por isso que muitos de nós somos solteiros, mas super bem-sucedidos, no entanto, acredito que a Gen Z não queira ficar sozinha”, diz.

Uma questão de equilíbrio

Para a nossa entrevistada, a principal característica desta geração é ter “um pouco de medo. Muitos deles ficam sob a alçada dos pais, não vão atrás de empregos e não correm muitos riscos. Não creio que esta geração seja tão ousada, porque não gosta de fazer as coisas de forma independente. A pandemia está relacionada com isso, mas não tanto como as pessoas pensam. Já antes faziam as coisas assim; o nervosismo e a insegurança que já estavam a sentir em relação ao mundo é que aumentou”.

Focando-nos no universo do trabalho, a necessidade de equilibrar a vida pessoal e a laboral “faz com que, mesmo quando haja um projeto que é necessário terminar num determinado dia e que requeira, por isso, trabalhar fora de horas, eles não o façam”, realça a mentora. Mas que expetativa do trabalho tem a Gen Z?

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Não querem que a sua identidade seja associada à sua carreira. Vamos encontrar muitos jovens que irão dizer ‘só quero ser pago, não quero estar tão envolvido no trabalho como as gerações anteriores’”, explica Kristen Geez. Contudo, isso não significa que não queiram oportunidades, até porque, a par com os millennials, são a geração mais qualificada de sempre.

Nos Estados Unidos, apelidou-se esta tendência como lazy girls jobs, que são empregos onde há um grande equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. “Não é que a Gen Z não queira trabalhos stressantes, o que não quer realmente é chefias stressadas, que lhes telefonem a gritar e fora do horário de trabalho. Querem um trabalho onde possam sair a horas, se possível remoto, e, ponto assente, não respondem a emails após o horário de trabalho”, sublinha.

Ir atrás deles

Se, até agora, as empresas recrutavam quem vinham ter com eles, com esta geração, diz a nossa entrevistada, não é assim: “São as empresas que terão de ir atrás deles e não aceitarão ser mais um número. Querem que conheçam o seu nome e saber para quem estão a trabalhar. Vamos ver muitos executivos de alto nível a sair da sua concha para mostrar que são humanos para que os jovens queiram trabalhar nas suas empresas e mesmo assim isso não significa que fiquem muito tempo num mesmo emprego”.

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Estarão as empresas preparadas? “Algumas delas ainda estão em negação. As gerações mais velhas defendem que não se pode fazer tudo o que a Gen Z quer, mas a realidade é que, em 2030, 58% da força de trabalho será composta por esta geração”, sublinha a mentora. Posto isto, Kristen Geez assegura que o caminho passa por “ouvir algumas das suas preocupações e começar a enquadrar a integração em torno da narrativa que estes jovens defendem: o local de trabalho precisa de ser um lugar para o qual as pessoas queiram vir, queiram explorar e ser inspiradas”.

O que as empresas têm de fazer para captar a Gen Z:

Durante o primeiro ano de experiência de um jovem talento, a empresa deve focar-se em fazê-lo descobrir quem é enquanto colaborador, quais são as suas capacidades, quais deve desenvolver e mostrar-se disponível para o ajudar a adquirir essas competências.

Para a Geração Z, o smartwork é importante. Querem fazer as coisas com eficiência e querem usar a tecnologia no local de trabalho, mas as empresas têm de dar espaço aos jovens para questionarem ‘como faço isto?’. O toque humano é muito importante. As portas das chefias devem estar abertas.

A geração mais jovem quer flexibilidade, portanto, nos setores em que isso é possível, é importante o trabalho híbrido e remoto.

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Fomentar o equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal e assegurar que há diversão dentro das suas equipas para realmente construir a cultura da empresa. Só assim terão colaboradores felizes e, não esquecer, que a saúde mental é uma das suas prioridades.

Se quiserem que eles estejam realmente comprometidos, apoiem uma causa social e envolvam-nos nisso.

Perceber que nem todos os colaboradores querem crescer na hierarquia corporativa. É importante perguntar que futuro querem ter e perceber como é que a empresa os pode ajudar nesses objetivos, seja através de um salário adequado para sustentar o estilo de vida que desejam, seja através da aprendizagem de novas competências.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº290, agosto de 2024.