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Crónica. O que tem a esperança a ver com o trabalho?

Crónica. O que tem a esperança a ver com o trabalho?

Tudo. A esperança é uma forma de pensar orientada para objetivos, que inclui a definição de um plano e a motivação para fazer acontecer.

Por Mar. 20. 2021

Talvez influenciados pela conceção católica da esperança como segunda virtude teologal (a par da fé e da caridade), somos levados a pensar que a esperança é uma crença de que vai tudo correr bem. Mas não é.

No Dicionário Porto Editora, como primeiro significado encontramos “confiança em conseguir o que se deseja”. Esta definição está mais próxima da esperança enquanto conceito definido pela Psicologia, o qual pressupõe – mais do que um desejo ou uma crença – um processo cognitivo, uma forma de pensar que nos leva a adotar determinados comportamentos.

Quem tem esperança é capaz de conceber estratégias para alcançar os objetivos desejados e de acreditar em si, automotivando-se para agir. A esperança, neste sentido, também é feita de ação. Objetivos, plano e ação.

É também a base do nosso capital psicológico. Este é um estado que se pode treinar e desenvolver e que combina quatro forças psicológicas positivas: a esperança, o otimismo, a resiliência e a autoeficácia.

Quanto mais alto o nosso capital psicológico, maior o nosso bem-estar, maior o envolvimento enquanto colaboradores, maior a satisfação com o trabalho, melhor a criatividade e a capacidade para resolver problemas e maior a nossa produtividade.

Uma espécie de sistema imunitário psicológico que nos ajuda a enfrentar desafios, no fundo, a trabalhar e a viver de uma forma mais positiva.

A esperança começa com a formulação dos objetivos. Temos que ter um rumo. “Para quem não sabe para onde vai, qualquer caminho serve”, dizia Séneca. E estabelecer objetivos tem a sua arte.

3 regras para estabelecer objetivos

Primeira regra

É para fazer ou construir algo, ou é para deixar de fazer algo? A ciência diz-nos que os objetivos mais eficazes são os que são formulados na positiva, em direção a qualquer coisa.

Segunda regra

É um objetivo fácil, desafiante q.b., ou é quase inalcançável? Tem que ser percebido como alcançável, mas tem que nos desafiar, tirar da zona de conforto.

Em 90% dos casos, o desempenho dos indivíduos que estabelecem objetivos específicos e desafiantes é superior ao dos indivíduos com objetivos fáceis.

Terceira regra

É um objetivo que eu quero para mim, ou é algo que me sinto forçada a fazer por pressão de terceiros? Devemos procurar que os nossos objetivos sejam pessoais.

Claro que há momentos em que queremos alcançar algo no trabalho, porque sabemos que será benéfico para nós, mas que de certa forma sentimos mais como um dever, um objetivo de tarefa, do que como algo que desejamos profundamente. Faz parte.

Nessa altura, podemos reformulá-lo de forma a que nos apropriemos do objetivo como sendo nosso. Por exemplo, imaginemos que tenho como meta enviar um determinado relatório a um determinado dia todos os meses. Se me relembrar do meu propósito na organização, ou se apelar aos meus valores pessoais, posso transformar um “simples” envio de um relatório na materialização do meu papel na equipa, da minha contribuição para a organização, ou mesmo da minha identidade enquanto profissional (fiável, rigoroso, etc.).

Desenvolver os níveis de esperança dentro de uma empresa não só é o mais correto para as pessoas, como também é o mais acertado para o negócio
Sara Midões

A seguir a perceber para onde queremos ir, há que pensar num plano. Dividir o caminho em pequenos passos e ter pequenas metas ao longo do trajeto faz toda a diferença.

Primeiro, torna acessível o que poderia ser percebido como difícil, ou mesmo inalcançável, motivando-nos a iniciar e depois a continuar. Segundo, permite-nos celebrar os pequenos sucessos ao longo do caminho, aumentando o otimismo e a nossa perceção de que somos capazes. É o efeito mágico dos micro steps.

E depois há a linguagem da esperança. Aquela que nos incentiva e que incentiva a equipa. Que dá confiança e que vê possibilidades. Palavras que dizemos aos outros e a nós próprios. Coisas como substituir o “não conseguimos” por “ainda não conseguimos, mas vamos continuar a tentar”. Ou dizer “vou aprender” em vez de “não sei fazer”. Detalhes tão simples e que podem ser tão impactantes.

Tudo isto tem a ver com as nossas vidas, mas também com o trabalho. Estimular as competências psicológicas positivas dos colaboradores traz vantagens quer para os indivíduos, quer para a performance da organização.

Desde sempre – e agora cada vez mais-, desenvolver os níveis de esperança dentro de uma empresa não só é o mais correto para as pessoas, como também é o mais acertado para o negócio.

Este, sim, é um bom objetivo.

Sara Midões estudou Comunicação, Marketing e, mais recentemente, Psicologia Positiva e Human Experience Design. Num mundo rápido e tecnológico, a sua missão é ajudar organizações e líderes a implementarem uma cultura de empatia e a desenharem experiências humanas positivas. Colaboradores, clientes, parceiros… todos somos pessoas. Criou a Community, um espaço de partilha que pode seguir no Instagram.