Como começa por explicar Cristina Coutinho, especialista em eneagrama, “o reconhecimento do nosso perfil de personalidade no eneagrama aumenta a autoconsciência sobre as nossas motivações nucleares, estilo de comunicação e de relacionamento; talentos naturais e qualidades inatas; pontos de compulsão, distorções de perceção e vícios de carácter”.
“À medida que é aplicado o conhecimento do eneagrama a nós mesmas e o vivemos, somos mais capazes de nos aceitarmos e valorizarmos de forma mais total e genuína”, esclarece.
Para além disso, passamos também a reconhecer e valorizar o quanto os outros são diferentes de nós, com as suas motivações, talentos e distorções particulares, tão diferentes das nossas quanto as diferentes cores do arco-íris. Contudo, todos são igualmente necessários e complementares nas suas diferenças.
Por este motivo, o eneagrama é também aplicado em dinâmicas de equipas, desenvolvimento de liderança, resolução de conflitos e trabalho de relacionamentos.
A origem do eneagrama
A palavra “eneagrama” provém do grego (ennea – nove e gramma – traço) e significa uma figura de nove pontas.
O eneagrama começa então por ser uma sabedoria ancestral codificada em formas geométricas e que diferentes escolas e tradições procuraram interpretar.
Em 1930, este símbolo é introduzido no mundo ocidental por G. I. Gurdjieff como parte integrante da sua escola esotérica de Quarto Caminho e cujo conhecimento lhe terá sido transmitido dentro da ordem sufi Naqshbandi. Atualmente, uma vertente esotérica do eneagrama é aprofundada pelo Centro de Psicologia Sufi, na Argentina.
Mais tarde, na década de 60, Óscar Ichazo desenvolveu o eneagrama da fixação do ego, que deu origem ao que atualmente se conhece como eneagrama da personalidade, e que faz a correlação dos nove pontos da figura geométrica com nove tipos de personalidade.
O eneagrama mostra-nos que todos partilhamos uma condição humana comum e dinâmica, dividida em três tríades e nove tipos
O que é o eneagrama da personalidade?
O eneagrama da personalidade consiste em aplicar a sabedoria do símbolo do eneagrama ao estudo da personalidade e diz-nos que:
- Existem nove tipos diferentes de personalidade, que correspondem aos nove pontos do símbolo;
- Todos partilhamos uma humanidade comum, simbolizada pelo círculo, o que nos permite sentir a unidade apesar da diversidade;
- Os nove tipos organizam-se em três tríades representadas pelos três pontos do triângulo e associada à predominância de uma inteligência: pessoas mentais, emocionais ou instintivas;
- A nossa experiência subjetiva é dinâmica e inclui movimentos de expansão e movimentos de stresse ou contração, simbolizado pelo hêxada.
Em resumo, o eneagrama mostra-nos que todos partilhamos uma condição humana comum e dinâmica, dividida em três tríades e nove tipos.
Para estudar o que significa um tipo de personalidade, o eneagrama considera que os nossos comportamentos visíveis ocultam uma motivação. É o reconhecimento da motivação base do nosso comportamento que permite que nos identifiquemos com um dos eneatipos. Essa motivação revela a raiz daquilo que acreditamos que precisamos de ser ou fazer para sermos amadas.
Ou seja, segundo o eneagrama é universal a necessidade humana de sentir-se amada, mas existem nove formas diferentes de a procurar satisfazer.
Um exemplo concreto…
Tomemos agora o exemplo de duas pessoas, ambas muito sensíveis aos outros, diplomáticas e avessas ao conflito. Como sabemos qual é o seu eneatipo?
É preciso averiguar a motivação base desse comportamento visível. Podemos imaginar que a pessoa A faz isso porque deseja preservar o vínculo com pessoas próximas importantes para si (tipo dois) e a pessoa B faz isso porque tem uma profunda necessidade de sentir harmonia em todo o ambiente ao seu redor (tipo nove).
Ou seja, apesar do comportamento visível ser semelhante, a motivação base é diferente: vínculo com pessoas especiais versus harmonia entre todas as pessoas.
Por este motivo, a identificação do eneatipo, ou seja, do tipo de personalidade no eneagrama, é um processo íntimo de cada pessoa. É o próprio quem tem a última palavra nessa avaliação porque só ele pode observar o que se passa internamente em si mesmo.
No entanto, o apoio de um especialista poderá ser necessário e proveitoso para despistar pontos cegos e ajudar na correta interpretação do que significa a vivência de cada tipo.
9 tipos de personalidade
Como já referimos, organizam-se em três tríades, que se caracterizam pela predominância de uma energia ou tipo de inteligência particular: instintiva, mental ou emocional.
Perante a predominância dessa energia na experiência subjetiva da pessoa, existem três respostas internas possíveis que depois geram os três tipos de personalidade de cada tríade:
- Expressar / exteriorizar a energia;
- Reprimir / interiorizar a energia;
- Suspender a energia da consciência.
Cristina Coutinho, especialista em eneagrama, explica-nos em que consiste cada tríade e quais os diferentes tipos de personalidade. Ora veja.
Tríade Instintiva
A inteligência instintiva, ligada ao corpo, é predominante nesta tríade e traduz-se numa predisposição natural para entrar em ação.
A sensação de certeza e o impulso incontornável para agir surgem primeiro, e só depois é que a pessoa faz a articulação mental da decisão e a avaliação emocional do impacto nos outros. A certeza da ação surge antes do pensar e do sentir emocional e o foco está no presente.
São pessoas muito sensíveis aos valores morais, ao sentido de justiça e à consciência de bem/mal e de verdade/mentira.
• Tipo 1 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite precisa de ser íntegra e perfeita. Desenvolve uma visão de si e do mundo focada na falha e no que está incorreto e busca o aprimoramento constante de si e do mundo.
Reprime a energia instintiva para manter o controlo dos seus impulsos, fazer o que está certo e cumprir o dever, o que alimenta tensão interna e ressentimento. São pessoas disciplinadas, comprometidas, responsáveis, íntegras, focadas nos processos e que buscam a excelência. Podem tornar-se rígidas, inflexíveis, intolerantes, dogmáticas e reativas.
• Tipo 9 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite precisa de estar em harmonia com os outros e em integração total com o todo. Suspende o contacto com a energia instintiva e isso tolda-lhe a perceção da sua posição, da sua importância e das suas prioridades para poder focar-se no ambiente à sua volta e nos outros.
Tem dificuldade em confrontar e em dizer que não e cede nas suas posições em benefício de uma posição mais consensual. São pessoas afáveis, compreensíveis, carismáticas, mediadoras, flexíveis e diplomáticas. Podem ser indiretas e passivo-agressivas quando pressionadas.
• Tipo 8 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite precisa de ser forte e de manter o controlo e o comando de todas as circunstâncias. Perceciona o mundo dividido entre fortes e fracos e, com um elevado sentido de justiça, sente muitas vezes a necessidade de defender os mais fracos.
Externaliza a energia instintiva, derrubando fronteiras e obstáculos com força e determinação, procurando chegar onde os outros ainda não ousaram tentar. São pessoas assertivas, objetivas, realizadoras, autoconfiantes, frontais e diretas. Podem tornar-se agressivas e insensíveis aos outros.
Tríade Mental
A inteligência intelectual predomina nesta tríade e traduz-se na capacidade de planeamento e antecipação de cenários. A mente projeta-se no futuro e procura antecipá-lo para lidar com a incerteza e gerar uma sensação de segurança a partir da qual é possível passar para a ação e relacionar-se.
Planear a ação surge antes do agir e do sentir emocional e o foco está no futuro.
São pessoas com uma mente aguda que buscam penetrar a realidade e compreender o mundo e que, por isso, procuram e valorizam o conhecimento.
• Tipo 5 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite precisa de ser competente e possuidora de conhecimento. O mundo é visto como invasivo e ela precisa de se afastar e defender a sua privacidade para preservar os seus recursos mais valiosos de tempo, energia e informação.
Limita os seus desejos e adquire conhecimento como recursos fundamentais para não depender de ninguém. A energia mental é internalizada e ganha no tipo 5 a sua maior profundidade.
O distanciamento emocional dá-lhe a capacidade de definir critérios e efetuar análises cuidadas, permitindo-lhe compreender tanto o sistema no seu todo como o detalhe de funcionamento de cada uma das partes. São pessoas lógicas, analíticas, criteriosas, objetivas, ponderadas e calmas nas crises. Podem tornar-se frias, apáticas, calculistas, isoladas, contidas e arrogantes.
• Tipo 6 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite tem de ser precavida, antecipando o que pode correr mal e preparando-se para isso. Como tudo já foi salvaguardado sente confiança no futuro e a energia do medo, que é o motor do processo mental, está suspensa da consciência.
As figuras de autoridade são respeitadas acima de tudo porque elas são o garante da ordem e da previsibilidade do ambiente, exceto se não forem de confiança, momento em que o tipo 6 precisa de confrontar a autoridade e até derrubá-la.
Detetam com facilidade incongruências na comunicação e muitas vezes testam os outros para verificar se podem confiar neles. São pessoas estrategas, gregárias, leais, cautelosas, responsáveis, cooperantes, organizadas e comprometidas. Podem tornar-se desconfiadas, legalistas, críticas, inseguras, preocupadas ou ansiosas.
• Tipo 7 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite precisa de ser entusiasta e confiante no futuro. Vive num mundo cheio de ótimas oportunidades e opções onde as limitações, a dor e as privações não existem ou são fáceis de superar com soluções práticas e prazerosas. A energia mental está externalizada na permanente aptidão para gerar novas e empolgantes ideias e possibilidades.
São pessoas bem-humoradas, criativas, otimistas, espontâneas, inventivas, curiosas, produtivas e com capacidade de síntese. Podem tornar-se dispersas, impulsivas, rebeldes, descomprometidas e narcisistas.
Tríade Emocional
Nesta tríade a predominância da inteligência emocional permite uma relação mais próxima com as emoções e com os outros.
A pessoa é muito sensível ao impacto que tem nos outros bem como à forma como é vista pelos demais. Isso permite-lhe adaptar-se aos ambientes e às pessoas para que a sua forma de estar seja aceite e compreendida ou para que ela possa compreender os estados emocionais daqueles com quem interage.
Nesta tríade, a perceção emocional vem antes do agir e do planear e o foco está no passado, ou seja, na história da relação.
São pessoas intuitivas com grande capacidade de empatia que conseguem colocar-se no lugar do outro e sentir o que significa ser-se o outro.
• Tipo 2 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite tem de ser prestável e estar disponível para as pessoas que são importantes para si, esperando como moeda de troca receber a mesma dedicação.
A energia emocional está externalizada para a identificação da necessidade dos outros, mesmo antes de elas serem expressas, tornando-se menos capaz de reconhecer e dar resposta às suas próprias necessidades.
São pessoas empáticas, carismáticas, envolventes, generosas, hábeis nas relações e entusiastas. Podem tornar-se manipuladoras, intrusivas, carentes de atenção e iradas quando não reconhecidas.
• Tipo 3 – acredita que para ser amada, respeitada e aceite tem de ser visto como bem-sucedida. A energia emocional está suspensa para se poder focar em definir metas e atingir resultados, desconectando-se dos próprios sentimentos e vontades.
Embora inconsciente, a inteligência emocional manifesta-se na sua habilidade única de negociação por conseguir intuitivamente ler e adaptar-se ao estado de espírito de cada interlocutor.
São pessoas dedicadas, eficientes, orientadas para objetivos, otimistas, confiantes e automotivadas. Podem tornar-se demasiado competitivas, autocentradas, calculistas, manipuladoras, superficiais ou workaholics.
• Tipo 4 –acredita que para ser amada, respeitada e aceite tem de ser original, única, especial ou diferente dos outros. A energia emocional está internalizada e gera um contacto profundo com as suas emoções em todo o seu espetro.
São expressivas e criativas e transportam consigo o encanto e a magia de sonhar com um mundo que ainda não existe.
Têm uma sensação íntima de não pertença e de incompletude e a perceção de que os outros obtêm esse preenchimento com mais facilidade. São pessoas artísticas, criativas, incentivadoras, intensas, exigentes, detalhistas. Podem tornar-se emocionalmente instáveis, queixosas, pouco objetivas, apegadas, dramáticas ou moralistas.
Cristina Coutinho promove o seu trabalho no site Hoon.pt e também pode ser contactada pelo e-mail info@hoon.pt.