Se a meditação é um mundo novo para si, mas no qual quer entrar, então este artigo é para si. Caso já medite, também não irá ficar desiludida, pois vai lembrar-se por que meditar lhe faz tão bem e, se por algum motivo, tiver deixado de o fazer, vai querer voltar.
Para nos ajudar nesta tarefa, estivemos à conversa com Elizabeth Reninger, especialista em mindfulness e meditação e autora do livro Meditação Passo a Passo (Clube do Autor), Inês Roseta, professora de ioga e meditação, que em conjunto com a arquiteta Mariana Crespo aproveitou a quarentena para desenvolver um site de meditação – Brave Maryan – e Sara Montes, professora de ioga e meditação que viu a abertura do seu estúdio de ioga e meditação ser adiada devido à Covid-19 e voltou as suas atenções para a criação de uma plataforma onde promove aulas de meditação, ioga e de alimentação consciente.
A meditação promove o relaxamento, aumenta a energia, melhora a concentração, desenvolve a compaixão e traz clareza ao pensamento. Além disso, estimula o autoconhecimento, o que faz com que lidemos melhor com o que nos rodeia.
O objetivo desta prática milenar é cultivar uma sensação permanente de bem-estar durante as atividades do dia a dia. E lembre-se que a meditação não se resume a estar sentada, pode meditar em movimento.
Razões para se iniciar nesta prática e como começar a meditar
1. O que é
Apesar da sua ligação a algumas religiões, a meditação está ao alcance de qualquer pessoa, mesmo que não tenha uma fé ou crença.
A meditação é, segundo Elizabeth Reninger, “uma ferramenta para conhecer, moldar e libertar a mente. Da mesma maneira que os exercícios de cardio ou o treino com pesos ajudam a cultivar um corpo saudável, forte e flexível, a prática de meditação ajuda a cultivar uma mente saudável, forte e flexível. Também lhe dá acesso a um nível subtil de consciencialização (a sua própria sabedoria interior) a partir da qual perceciona a realidade diretamente e com grande clareza”.
Já para Inês Roseta, “a grande iluminação da meditação é vivermos o presente em vez de estarmos constantemente e ansiosamente a olhar para o futuro através das experiências vividas no passado”.
2. Com objeto ou sem objeto
Há vários tipos de meditação. Elizabeth Reninger diz que a podemos categorizar com ou sem objeto. “A meditação da respiração é um exemplo da primeira – a respiração é o objeto que focalizamos. O objeto é usado como suporte, para nos ajudar a treinar a mente na direção de uma maior concentração, clareza e equanimidade. Objetos que podem ser usados são a chama de uma vela e as perceções sensoriais (imagens, sons, etc.)”, explica a autora do livro Meditação Passo a Passo.
Por sua vez, “a meditação sem objeto significa retirar a atenção de todas as coisas às quais prestamos atenção habitualmente. Iluminamos apenas a luz da consciência em nós próprios, tal como o sol nos ilumina naturalmente. Este tipo de meditação é menos um ato e mais sermos quem somos, essencialmente”, realça Elizabeth Reninger.
Para Inês Roseta, é crucial “experimentar várias técnicas e ver qual a que resulta e faz sentido para si”.
3. Benefícios físicos e mentais
“A ciência ocidental já validou uma vasta sequência de benefícios físicos e psicológicos, tais como diminuição do stresse, relaxamento, um sono mais reparador, mais inteligência, maior capacidade de concentração, uma maior perceção e criatividade, energia vibrante, compaixão e equanimidade”, garante Elizabeth Reninger.
O ponto principal, continua, “é que a meditação tende a relaxar profundamente o corpo e a mente, o que naturalmente facilita a cura emocional”.
Sara Montes defende que “a meditação faz com que não fiquemos tão reativos às pessoas e ao que nos acontece. Ficamos com uma sensação de bem-estar e harmonia que nos permite tomar decisões mais sensatas”.
Outro benefício, para Inês Roseta, “é aprendermos a respirar e, ao conseguimos respirar bem, o nosso corpo físico alinha-se e tudo começa a funcionar como deve ser”.
4. Autoconhecimento
“Um dos benefícios mais profundos da meditação é reconhecer e estar consciente do nosso verdadeiro Eu – quem somos na nossa essência”, arma Elizabeth Reninger.
“Quando se medita, tudo aquilo que antes nos tirava do sério passa a ser digerido de forma diferente. É como se a nossa mente estivesse enevoada e as nuvens começassem a desaparecer, ou seja, vamos clarificando a mente. É uma almofada que levamos para a vida. Nós achamos que somos superpoderosos, mas a única coisa que controlamos é como reagimos, porque tudo o resto vai continuar a acontecer”, assegura Inês Roseta.
Nos tempos em que vivemos, mexer na cara é proibido e Inês Roseta lembra que quando meditamos temos consciência de que esse é um gesto muito frequente. Tal como temos consciência de que a nossa mente se dispersa facilmente.
“No fundo, a meditação acontece naturalmente no nosso dia a dia, quando temos essa consciência, em vez de reagirmos às circunstâncias, agimos e deixamos de usar o mecanismo de resposta de luta ou fuga. Este deve ser usado para situações de perigo, mas andamos tão stressados que o sistema nervoso fica muito reativo e é daí que vêm a ansiedade e os ataques de pânico, cada vez mais comuns”, explica Sara Montes.
5. Como começar a meditar
O melhor, para Elizabeth Reninger, é “começar com uma prática simples, tendo como ponto de partida seguir a respiração”.
Dedique dez minutos ou mais a este exercício aconselhado por esta especialista. Encontre um lugar tranquilo para se sentar e sente-se numa cadeira ou numa almofada no chão.
Feche os olhos e concentre a sua atenção no fluxo da respiração: as inalações e exalações. Não faça nenhum esforço para mudar nada sobre a respiração. Simplesmente observe: a sua respiração é superficial ou profunda? É rápida ou lenta? Existem sensações físicas associadas à respiração?
Cada vez que sentir a mente a afastar-se da respiração – não há problema –, volte a prestar atenção àquela.
6. Um minuto
Sabia que pode meditar num minuto? Faça pequenas pausas durante o dia.
“A respiração é um barómetro para percebermos como estamos, pois já sabemos que quando estamos stressados a nossa respiração acelera”, diz Sara Montes, que aconselha, “em situações-chave, contrair a zona abdominal, inspirar profundamente pelo nariz e expirar pela boca”. Já sabe que o foco é levado para a respiração.
Elizabeth Reninger recomenda começar por contar as inspirações e expirações e depois passar a contar só as segundas. Por fim, é deixar de contar e apenas observar. Faça essas mudanças de dez em dez dias.
7. Rotina diária
No livro Meditação Passo a Passo, Elizabeth Reninger sugere que tenha uma rotina de meditação:
- Agende uma hora e medite sempre no mesmo local.
- Medite três a seis dias por semana. Seja firme, mas também flexível. Reserve um dia da semana para ser espontânea, preguiçosa, selvagem ou errante.
- Repare no modo como se sente antes e depois da sua sessão de meditação. Esta informação importante motivará a continuar ou a mudar de rumo, conforme necessário. Perceba como se sente. Quando o temporizador tocar, respire fundo e devagar várias vezes e tome nota de quaisquer sentimentos ou sensações que possam ter surgido.
8. A importância da consistência
Quando se estabelece uma prática de meditação pela primeira vez, o mais importante é a consistência. Por isso, escolha um período de tempo que seja razoável e viável, e não intimidatório.
“Quando estou uns dias sem praticar, noto logo diferença, fico logo mais reativa”, diz Sara Montes.
No livro Meditação Passo a Passo, Elizabeth Reninger aconselha quem está a começar a meditar três vezes por semana, com sessões de dez minutos, pelo menos, durante três semanas”.
9. Um local para meditar
Crie um canto de meditação em casa. Elizabeth Reninger sugere um espaço calmo e organizado, que pode, por exemplo, ter umas flores ou plantas e uma vela de cera de abelha.
Além disso, a especialista em mindfulness e meditação diz, no livro já citado, que pode usar uma almofada redonda de meditação (zafu), um banco baixo de meditação (seiza) ou um bloco de meditação plano e quadrado (zabuton) para tornar a sessão mais confortável.
Também se pode sentar num cobertor dobrado ou numa cadeira de costas direitas.
10. Conforto
Use roupas folgadas, confortáveis, que não restrinjam a circulação e que deem à pele a sensação de respirar, ou seja, aposte nas fibras naturais, porque, de acordo com Elizabeth Reninger, “quando o corpo está confortável, é mais fácil relaxar. O relaxamento físico apoia o relaxamento mental”.
Além disso, pratique antes de uma refeição e não depois, porque a comida deixa as pessoas sonolentas.
11. A postura
O ideal, como explica Sara Montes, é encontrar uma postura que lhe seja confortável. Premissa à qual Elizabeth Reninger acrescenta que o ponto mais importante é manter coluna na sua posição naturalmente vertical, pois o seu corpo sentir-se-á relaxado e expandido.
A posição de lótus (sentada com as pernas cruzadas e com cada pé em cima de uma coxa) é a que mais se associa à meditação, mas não é fácil. Pode sentar-se em cima dos joelhos, com as pernas cruzadas, numa cadeira de costas direitas ou ergonómica, ficar em pé ou deitar-se.
12. Em movimento
Pode meditar enquanto caminha e isto pode ser feito dentro e fora de casa. No livro Meditação Passo a Passo, Elizabeth Reninger explica como deve fazê-lo:
- Fique direita, respire fundo, liberte a tensão. Fique de pé com a coluna vertebral direita e os ombros relaxados, deixando os braços pender naturalmente dos lados do corpo. Respire fundo e devagar várias vezes.
- Coordene a respiração com os passos. Ao inspirar, dê um passo em frente com o pé esquerdo; ao expirar, dê um passo em frente com o pé direito. Continue a inspirar e a expirar desta maneira à medida que avança, enquanto concentra suavemente o olhar no chão à sua frente.
- Desfrute de cada passo, caminhando devagar, sem pensar em ir a qualquer lado que não aquele onde está neste momento, aqui e agora – até o seu temporizador indicar que acabou o tempo.
13. Meditação vs. relaxamento
Se, muitas vezes, o relaxamento profundo está associado a momentos de sonolência, a meditação não. Como explica Elizabeth Reninger no livro Meditação Passo a Passo, “para a maior parte das pessoas, ficar profundamente relaxado leva à sonolência e depois ao sono“, tal como estar alerta está associado a operar em modo de sobrecarga, de correrias tensas e frenéticas.
“A meditação é a arte de cultivar um estado de corpo-mente simultaneamente relaxado e alerta.”
14. Ajuda a ‘superar’ a pandemia
Foi durante a quarentena que Inês Roseta desenvolveu o seu site, porque “a meditação é uma ferramenta muito importante para superar adversidades e medo e toda a gente sentiu e ainda sente isso devido à Covid- 19”.
“Com o tempo, a prática de meditação pode suportar níveis crescentes de clareza e equanimidade – o que nos ajuda a relacionarmo-nos com mais habilidade com circunstâncias desafiadoras de todos os tipos, incluindo pandemias. E na medida em que as recomendações de ‘ficar em casa’ e de ‘distanciamento social’ nos deram e ainda dão mais tempo sozinhos e tempo livre, isso pode ser usado para iniciar ou melhorar a nossa prática de meditação”, diz Elizabeth Reninger.
“Dito isto, geralmente é melhor abordarmos as nossas explorações de meditação sem grandes expectativas. Em vez disso, venha com a mente de um iniciante – uma simples inocência e curiosidade infantil. E limite-se a ver o que acontece…“, aconselha a autora do livro.
15. Obstáculos
Há quem, mesmo antes de começar a praticar, diga que não é capaz. Mas os obstáculos, como explica Elizabeth Reninger, fazem parte de todo o processo. As dores físicas são um deles, por isso, o segredo é ir ajustando a posição.
Inês Roseta realça que a maior dificuldade é ter “um objetivo completamente irreal em relação à prática” e explica: “Toda a gente já ouviu falar dos benefícios da meditação, mas, se forem à espera de ver flores e unicórnios, não é bem isso que acontece.”
Sara Montes é da mesma opinião: “As expectativas são um obstáculo e é por isso que algumas pessoas acham não estar a sentir nada. Sente-se, observe a respiração, relaxe; não é preciso mais nada. As pessoas são tão exigentes com elas mesmas que acabam por não usufruir das suas experiências fantásticas”.