Crónica. A procura do equilíbrio
Num mundo moderno ditado pelas leis do marketing e social media, parece que estamos constantemente a ser orientados e influenciados em todos os aspetos das nossas vidas: somos aconselhados sobre o que deveríamos querer, como pensar e até sobre o que devemos sentir.
Um dos mais indesejados efeitos do nosso estilo de vida é, obviamente, o de perder o contacto com a nossa essência e deixarmos de saber ouvir a nossa voz interior.
Sentimo-nos cada vez mais desconectados, vacilamos nas nossas certezas por não conseguirmos perceber o que realmente queremos e, por fim, temos dificuldade em perceber o que pretendemos da vida: ficamos condicionados, à espera que nos digam o que fazer e como conduzir as nossas vidas.
Por mais estranho que pareça, o mesmo pode acontecer no que respeita às nossas rotinas espirituais e meditação. Ficamos “presos” às orientações dos nossos professores e/ou orientadores, uma vez que é mais fácil não agarrar as rédeas, pois assim não precisamos de assumir os erros que poderíamos eventualmente cometer.
Procurar o equilíbrio e confiar
Não me entendam mal: as aulas guiadas de yoga, os textos espirituais e outras ferramentas são simplesmente maravilhosos. Podem ter um impacto profundo nas nossas vidas e no nosso despertar espiritual.
Contudo, devemos encontrar um equilíbrio entre o conhecimento que nos é transmitido e a nossa liberdade de expressão, entre o que o que nos é dito e aquilo que sentimos.
O problema emerge quando acontece o contrário: ficamos dependentes dos outros e deixamos de confiar no nosso instinto.
Felizmente, sabemos que aulas de yoga bem conduzidas podem facilitar a abertura de espaço em nós, na nossa mente, para podermos assim explorar a nossa sabedoria interior.
É certo que confiar naqueles que nos parecem ter o conhecimento adequado é bem mais fácil e mais rápido! De facto, desde a filosofia do yoga até às técnicas de mindfulness, tudo tem explicação e tudo tem sido amplamente explicado.
Desta forma, como resultado, em vez de aprendermos por nos próprios, através do desenvolvimento da nossa autoconsciência e perceção da nossa sabedoria interior, o processo de aprendizagem torna-se mais num processo de memorização do conhecimento, ao invés de um verdadeiro crescimento espiritual.
É claro que a nossa expansão só será completa quando tivermos a força de olhar para dentro de nós, a paciência para ouvir, e a resiliência suficiente para aceitar.
Precisamos de encontrar o equilíbrio, doseando a nossa necessidade de absorver conhecimento, se tivermos interesse em desenvolver a nossa consciência.
Uma simples sugestão que aqui deixo passa por substituir, pontualmente, as práticas guiadas (yoga, meditação ou outras…) e o estudo por momentos de silêncio, para permitir assim o brotar da consciência.
Valorizar o silêncio
Pode parecer estranho, mas há que perceber que a verdadeira criatividade e conhecimento desenvolvem-se quando a mente não está em constante funcionamento, quando não está a criar milhares de pensamentos inúteis (vrittis).
Isto explica porque muitos de nós têm as suas melhores ideias quando estão debaixo do chuveiro: o duche é um lugar onde não há fatores externos de distração.
‘Abrir espaço’ ao silêncio pode ser vivido de modo diferente consoante os indivíduos. Para alguns poderá ser uma meditação de 20 minutos, para outros poderá ser uma corrida de 30 minutos na natureza. No fundo, a forma de acesso é irrelevante, é o estado vibracional, a sensação e o resultado que importam.
O ideal seria, portanto, combinar as práticas guiadas com orientação inicial e prosseguir, então, com o silêncio adaptado à nossa personalidade (meditar, correr, tomar um duche, etc.).
Quando estamos no início deste processo de querer aquietar a mente, ao deixar de absorver toda a orientação e suporte vindos do exterior, o corpo e os pensamentos poderão ficar desajustados, poderemos ficar mais agitados ainda. Mas, com a prática regular, com calma e recetividade, a mente acabará por ceder e a consciência acabará por crescer.
Será cada vez mais fácil encontrar este ‘espaço‘ onde a criatividade e a inspiração poderão emergir e expandir-se.
Com o treino saberá valorizar este tempo “só seu”, que a levará a ter mais respeito por si e pelos seus sentimentos. Tornar-se-á mais autoconfiante e mais segura.
Jean-Pierre de Oliveira é professor de yoga, autor e um earth activist. A sua inspiradora abordagem ao yoga adapta esta sabedoria antiga à vida dos ioguis modernos como um estilo de vida além das aulas. É conhecido pelo seu estilo genuíno de ensino e instrução técnica profissional reconhecida que o tem levado a participar em diversos eventos.