*Acompanhe mensalmente a jornada de uma marketeer a aprender a ciência da felicidade.
Imagine-se nas Bahamas, a desfrutar de uma bebida fresca, a sentir o calor dos raios do sol depois de um mergulho nas águas transparentes e mornas. Paisagem idílica, zero preocupações. Que bela vida! Agora imagine-se a fazer isto um dia após o outro, só isto e nada mais.
Para a grande maioria de nós, faltaria algo. Quantas histórias ouvimos de pessoas que têm “tudo” para se sentirem bem: um casamento de sonho, um emprego bem remunerado, uma casa de revista… Sentem-se bem, mas sentem também que lhes falta algo. Uma espécie de vazio. E por que será?
A palavra anglo-saxónica happiness deriva do verbo acontecer (to happen), ou seja, refere-se a algo exterior ao indivíduo, cujo controlo lhe é alheio. No entanto, nas culturas de origem latina, a palavra felicidade tem um significado etimológico de Fecundidade, de Fertilidade, centra-se, portanto, na capacidade de gerar, de criar, em algo que emana de nós. Nesta abordagem, o que fazemos é o que nos faz felizes; não o que nos acontece.
A Psicologia Positiva distingue também estas duas perspetivas do bem-estar:
• A perspetiva hedónica, associada à procura de prazer, a uma vida agradável, à boa vida, ao que é exterior ao próprio.
• A perspetiva eudaimónica, inspirada no pensamento aristotélico, mais profunda, mais significante, e que remete para uma vida completa, uma vida boa. Em grego, eu significa “bom” e daemon significa “espírito”. Feliz será então aquele que faz e cumpre a sua missão, que se dedica a algo maior do que a si próprio.
Martin Seligman, que desenvolveu um dos mais citados modelos de bem-estar, elenca o Significado como um dos cinco pilares da felicidade completa, de uma vida que floresce. Já antes, Carol Ryff, investigadora da universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, tinha incluído o propósito de vida e o crescimento pessoal nas dimensões do bem-estar psicológico.
Qualquer dos autores sublinha: muitas vezes a prossecução do nosso propósito não está motivada pela procura de prazer, mas sim por um chamamento, por uma necessidade. Uma vida com significado não é necessariamente uma vida agradável. Por exemplo, está demonstrado que os pais sofrem uma quebra substancial de satisfação com a vida desde o nascimento dos seus filhos e até que estes atingem os dois anos de idade.
Quem já passou por isso sabe que há momentos difíceis, de cansaço, de angústia… E voltaríamos atrás? Impensável. Para muitos de nós, gerar uma vida, a nossa descendência, dá-nos a convicção de que cumprimos um dos nossos propósitos, de que pertencemos e servimos a algo que acreditamos ser maior que nós.
Se muitas vezes viver em função do nosso propósito é difícil, o caminho para o descobrir também não é nada fácil. Estamos tão embrenhados a viver os dias uns após os outros, as semanas umas atrás das outras, em cumprir com as nossas responsabilidades, em ser o que esperam de nós, em ser o que nós esperamos de nós próprios, que nos esquecemos. Abafamos o vazio. Assumimos que tem que ser assim.
Mas não tem que ser assim. O caminho pode ter muitas curvas mas vale a pena percorrê-lo. Estudos evidenciam que a família e os relacionamentos estão no topo da lista de propósitos. Outras fontes comuns de significado são cuidar de outros, o trabalho, fé ou religião, a natureza, a criatividade, o sucesso, uma causa ou simplesmente o crescimento pessoal.
E não é suposto termos só um propósito; a vida é feita de muitas facetas. No trabalho, podemos construir uma vida significante através do conhecimento que geramos, do que acrescentamos à sociedade, ou do serviço que prestamos a outros. Encontrar o nosso propósito requer reflexão, mas também ação. Às vezes é preciso ter coragem e mudar o que for preciso para irmos ao encontro de uma vida com significado. Muitas vezes, porém, apenas precisamos de encontrar significado no que já temos e fazemos na nossa vida.
Nunca mais me esqueci de ter visto uma entrevista de um portageiro de uma ponte que dizia que o objetivo dos seus dias era aumentar a boa disposição das pessoas que iam de manhã para o trabalho. O seu sorriso era contagiante e a sua vida cheia de significado.
Também me recordo de um profissional de limpeza de um hospital que tinha como missão ajudar a travar a propagação de bactérias nocivas; o seu papel era importante.
Lembro-me igualmente de uma speaker motivacional que usa o humor para ajudar quadros de empresas: “o meu propósito é ajudar as pessoas a serem quem são de verdade”. Tudo exemplos de vidas boas, não necessariamente de boas vidas.
Uma das formas certeiras de percebermos o(s) nosso(s) propósitos é pensarmos como gostaríamos de ser lembrados por quem nos fomos cruzando ao logo do tempo. Ou numa perspetiva mais radical, o que nos orgulharia que escrevessem no nosso obituário.
As forças, virtudes, interesses, circunstâncias, experiências e sonhos são altamente individuais. O que valorizamos, ou a forma como o interpretamos, é diferente de como os outros o fazem. Há, no entanto, algo que nos une; o tempo e a energia são limitados e ter uma noção das nossas prioridades ajuda-nos a manter as coisas em perspetiva e a fazer escolhas. As pequenas e as grandes. As do dia a dia e as de uma vida.
E se tivesse todo o dinheiro do Mundo…?
Para uma dose extra de inspiração:
• O que faz uma vida boa? Ted Talk de Robert Waldinger, psiquiatra e professor da Harvard Medical School.
PS: Agradecimentos ao Slow J, cuja música que descobri pelo meu filho mais velho inspirou o título desta crónica.
Sara Midões, trabalha em marketing e gestão comercial, e partilhará com os leitores da Saber Viver todas as maravilhas da descoberta da ciência do Bem-Estar. É mãe de dois adolescentes e praticante convicta de yoga.