São mais ou menos 25 horas semanais que os atletas-artistas do Cirque du Soleil treinam para estar em forma para o novo espetáculo prestes a chegar a Lisboa. Uma equipa composta por atletas de alta competição (alguns até participaram nos Jogos Olímpicos) que vivem, respiram, treinam e emanam talento e esforço para um dos mais grandiosos espetáculos do mundo.
Como é o seu treino? Procurámos saber todos os pormenores junto do Head Coach (treinador principal) do Cirque du Soleil. Emerson Neves tem 46 anos, é natural de São Paulo e pessoalmente tem uma história que vale a pena contar (ou escrever). Ao contrário do que se poderia esperar, Emerson sempre esteve longe de circos e, nos primórdios da sua carreira, foi a natação que o encaminhou para a vida de atleta.
A vida trocou-lhe as voltas e depois de uma lesão grave, admite ter-se sentido “perdido”, sem saber que caminho haveria de tomar. O destino acabou por lhe dar um mapa e o circo tornou-se a sua casa.
Hoje, treina a equipa de atletas desta companhia circense e prepara-se para um novo espetáculo, Cirque du Soleil – OVO, com estreia marcada para 3 de janeiro, na Altice Arena – e ficará até dia 13 do mesmo mês. Os bilhetes já estão à venda e variam entre os 40€ e os 79€.
“Tenho de estar presente em todos os treinos no palco e, quando não estou no palco, estou em treinos no backstage. Tenho um dia longo onde trabalho de 10 a 12 horas sem parar.” Emerson Neves, Head Coach do Cique du Soleil
“OVO é a natureza sem filtros. Um retrato fictício repleto de imaginação, luz, som e emoção, onde cada personagem assume um papel que promete transformar a nossa maneira de olhar para a natureza”, lê-se em comunicado. A história mergulha num mundo de insetos que é agitado pela chegada imprevista de um ovo misterioso. O espetáculo é composto por 50 artistas, oriundos de 14 países, especializados em atos acrobáticos.
Conheça um pouco mais sobre o treinador de uma das mais famosas companhias de artes circenses no mundo e o que é preciso para organizar o um espetáculo desta dimensão.
Entrevista ao treinador principal do Cirque Du Soleil
Começou na natação aos 9 anos e competiu até aos 27. Como é que foi o processo de passagem para a vida artística?
Desde pequeno fazia show de aqualoucos (comédia na piscina) com os atletas do saltos, foi assim que o gosto pela vida artística começou. E profissionalmente, quando tinha 18 anos, fui fazer uma temporada de show na Áustria e Itália onde saltava de 20 metros, saltos com fogo e aqualocos.
A sua desistência dos Jogos Olímpícos foi provocada por uma lesão. Quão difícil foi ultrapassar essa fase?
Muito difícil, como atleta você abdica de muitas coisas na vida. Vive para treinar, foi uma vida inteira sonhando e batalhando para chegar a uma olimpíada, e quando este sonho é arrancado de você por questão de lesões, é muito difícil digerir. Demorei para me levantar e passei por uma fase onde me encontrava perdido até que uma amiga me chamou para fazer uma temporada de show em França e aí voltei a apaixonar-me pela vida artística.
Como foi a passagem de fazer diving shows para espetáculos em terra? Quais foram os maiores obstáculos?
Já não era tão novo, estava com 32 anos e a adaptação foi difícil, muitas lesões e algumas cirurgias. No meu caso, o maior obstáculo foi adaptar ao chão fazendo modalidades circenses, pois a vida toda treinei na água. Trabalhei no circo como acrobata até aos meus 40 anos, que é uma idade avançada para acrobatas… (risos)
Em que ano entrou para o Cirque du Soleil? Qual é o maior desafio de trabalhar num dos maiores espetáculos do mundo?
Entrei para a companhia em 2006. As lesões e a dor foram as maiores dificuldades, mas o prazer de estar em palco não tinha preço.
Como é que é a sua rotina e dos atletas que trabalham consigo?
Chego cedo à arena e começo meu dia fazendo relatórios, planos de treinos e respondendo a emails. Verifico se tudo está bem para começarmos os treinos. Tenho de estar presente em todos os treinos no palco e, quando não estou no palco, estou em treinos no backstage. Tenho um dia longo onde trabalho de 10 a 12 horas sem parar. Na hora do show, assisto a alguns números para verificar o nível de performance de cada artista, faço notas de elementos que não foram realizados bem e verifico também se há problemas técnicos ou não, para que estes mesmos sejam evitados no futuro.
Quantas horas treinam por dia para este novo espetáculo, OVO? Há alguma dieta específica que sigam?
Geralmente há uma média de 25 horas de treinos acrobáticos por semana, divididas entre os artistas, sem contar com a preparação física, e mais os shows. Alguns artistas seguem uma dieta especifica dada por uma nutricionista, mas a maioria faz sua própria dieta. Se há a necessidade de algo especifico, fazemos o requisito para o catering.
Quanto tempo demorou a criar o OVO?
O processo de criação de todos os espetáculos demora entre 3 a 6 meses.
Como é feita a seleção de artistas que entram para o circo?
O casting é responsável pela apresentação dos artistas e a escolha é feita por mim e pelo diretor artístico, onde se verifica o perfil mais indicado para o show e o ato acrobático que o artista irá executar, a forma física, força, experiência passadas, lesões, personalidade… tudo isto conta na hora de escolher um artista.
Costumam ocorrer muitas lesões? E se acontecer próximo da data do espetáculo, têm substitutos?
Temos versões diferentes do show e também de cada ato. Temos um ‘ato de back up’ também, tudo isto para garantir sempre a qualidade do show. Isto porque não somente são lesões que ocorrem, mas também doenças que podem tirar os artistas ou qualquer um da trupe do show, que vai de uma alergia, a gripe, etc…
Ao nível mental, os atletas fazem algum tipo de exercício para se manterem tranquilos e menos ansiosos?
Temos uma psicóloga que trabalha connosco, ela está baseada em Montreal. Alguns artistas aconselhamos a fazer um trabalho psicológico e outros escolhem-no por si mesmos. E há alguns que não necessitam, pois já possuem uma estratégia própria para superar os problemas que possam ocorrer ou o stresse relacionado com a tour ou a atuação, assim como problemas pessoais que podem interferir na performance.
Tem saudades do Brasil? Quantas vezes por ano é que consegue ir lá?
Tenho muitas saudades do Brasil, da família e dos amigos. Geralmente, uma vez ao ano vou para o Brasil, mas sempre por pouco tempo pois as férias são sempre curtas e tenho que dividir o tempo com o meu marido, que mora nos Estados Unidos, e minhas filhas, que moram na Austrália.
Já alguma vez viu um espetáculo do Cirque du Soleil? Conheça ainda o treino de abdominais que vai querer experimentar.