O conto que narra a história de uma pequena sereia e do seu amor não correspondido por um príncipe é tão encantador e delicado quanto o signo de Peixes.
Escrito por Hans Christian Andersen e publicado em 1837, o conto A Sereiazinha é muito mais do que um simples conto de fadas para pré-adolescentes. Ele fala-nos da ilusão, do sacrifício, mas também do amor que extravasa as fronteiras do físico e do romântico e se torna sublime e universal.
Como no conto do Patinho Feio, Andersen sabia do que falava. Com Vénus em Peixes a tocar o sonhador Neptuno, durante a sua vida ele alimentou vários amores impossíveis e nunca chegou a concretizar nenhuma dessas relações.
• Aqui aproveito para fazer um aviso à navegação: neste artigo vou referir-me sempre ao original de Andersen e não da versão da Disney. Essa traz consigo uma simbologia bem diferente, mais pesada e mais terrena e por isso não cabe neste texto.
A Sereiazinha
O início da história passa-se no fundo do mar, onde a água é a mais transparente e mais azul e tudo à volta é de uma subtil delicadeza, inigualável por qualquer coisa que possa existir à superfície.
Peixes é um signo de água, o elemento que simboliza o sentimento e as emoções, é o mais leve e gracioso de todos os signos e também o mais etéreo e mais distante da matéria e de tudo o que é terreno. É o signo menos real e menos concreto.
A suave beleza do ambiente submarino estende-se à Sereiazinha, a mais nova de seis irmãs, que é descrita como “uma criança estranha, calada e pensativa”, características bem piscianas.
Pessoas com muita energia de Peixes ou com a casa 12 acentuada no seu mapa natal têm facilidade em abstrair-se da realidade e em sonhar acordadas, mas também de se ligarem a mundos imateriais e intangíveis, desconhecidos da maioria das pessoas.
A pequena sereia sonha com um mundo para além do seu, um mundo que só conhece através dos fantásticos relatos da avó e, mais tarde, também das irmãs.
Quando a Sereiazinha completa os quinze anos e lhe é permitido nadar até onde o mar acaba e a terra e o céu começam, ela encontra um navio e apaixona-se pelo jovem príncipe que nele viaja.
Uma tempestade aproxima-se e a embarcação naufraga e, ao ver o seu amado a afogar-se, a sereia salva-o e leva-o para uma praia onde ele recupera os sentidos, mas o jovem nunca chega a conhecer a sua salvadora e desconhece o amor que a sereia nutre por ele.
Depois de descobrir onde mora o príncipe, a sereia sobe todas as noites à superfície para o ver e para saber dele, sem nunca se aproximar.
Peixes tem mais facilidade em envolver-se com a fantasia do amor do que com a outra pessoa propriamente dita. O amor idealizado, por ser intangível e intocável, é sempre mais perfeito do que a realidade, que tem os defeitos e as imperfeições inerentes à nossa natureza humana.
Ao conversar com a avó, a Sereiazinha fica a saber que, ao contrário das sereias, os humanos têm alma, uma parte de si que nunca morre mesmo quando o seu corpo deixa de existir. A avó conta-lhe que para ela ganhar uma alma seria necessário um humano amá-la tanto que quisesse unir a sua vida à dela.
Peixes, Neptuno (o seu regente moderno), Júpiter (o regente tradicional) e a casa 12 são, no nosso mapa natal, pontes para esta outra dimensão de nós mesmos, uma dimensão onde nos tornarmos unos com tudo o que existe e assim nos transcendemos. Esta é a energia do amor universal, o amor que tudo acolhe e que tudo aceita.
A nossa jovem anseia por ter essa alma eterna, que tudo transcende, e para a conseguir vai fazer com que o príncipe se apaixone por ela. Mas, para isso, precisa primeiro de trocar a sua cauda de peixe por duas pernas.
A pequena sereia vai então pedir ajuda à velha bruxa do mar, que mora na zona mais profunda e desconhecida do fundo do oceano, aonde a Sereiazinha nunca tinha ido antes. Quando chega, a bruxa anuncia-lhe que sabe ao que a jovem vem e avisa-a que não é uma boa ideia, pois vai dar mau resultado.
A velha bruxa encontra a informação num nível intuitivo e não precisa que os acontecimentos se materializem para sentir qual a energia que lhes está implícita. Pessoas com Mercúrio em Peixes, na casa 12 ou ligado a Neptuno têm a capacidade, consciente ou não, de captar este tipo de informação tão ténue e subtil, que não é perceptível a pessoas mais práticas ou racionais.
Em troca das pernas, a Sereiazinha dá à bruxa do mar a sua linda voz. Em todas as mitologias o canto da sereia é famoso por ser de uma beleza extrema, tão belo que nenhuma voz humana se lhe pode comparar. Mas o canto desta sereia é o mais bonito de todos os cantos de sereias.
Pela sua sensibilidade invulgar, Peixes está ligado a todas as artes, em especial à música e à dança. Ao entregar a sua voz à feiticeira, a pequena sereia abdica do maior dos seus encantos.
Para alcançar a sua alma eterna, ela tem de se tornar humana e tornar-se humana é tornar-se imperfeita, mas é precisamente este o caminho para a transcendência. Apenas porque somos imperfeitos almejamos a perfeição e ao trabalharmos no nosso aperfeiçoamento, todos os dias, como se fossemos aprendizes do ofício de ser humanos, temos a oportunidade de nos transcendermos.
Neste aperfeiçoamento contínuo encontramos a energia de Virgem, que se opõe à de Peixes e que a complementa.
A velha bruxa adverte a Sereiazinha de que a transformação será dolorosa, como se “uma espada de dois gumes lhe atravessasse o delicado corpo”, e depois, ao andar, sentirá cada passo como se pisasse pontas de facas.
A transformação da sereia em humana não é feita sem dor e sofrimento e é nos pés que ela vai sentir essa agonia, pois esta é a parte do corpo regida por Peixes.
Com a sua extrema sensibilidade, Peixes tem tendência a sentir todas as dores do mundo e a chamar para si sofrimentos que não lhe pertencem. Aliada à sua passividade, esta característica pode tornar a sua existência nesta realidade limitada pela matéria demasiado difícil, ao ponto de se achar vítima de tudo o que lhe acontece, justa ou injustamente.
Finalmente a pequena sereia encontra o seu príncipe que, seduzido pela graciosidade da sua dança, o talento que lhe resta para expressar a sua sensibilidade, desenvolve pela jovem uma grande afeição. Mas como ela não fala — Peixes é um signo mudo, como os outros signos de Água — ele nunca a vê verdadeiramente como uma mulher individualizada, com voz própria, e gosta dela como se ela fosse uma mascote, mas não como mulher.
Ela aceita este amor insuficiente e desequilibrado, tão típico de uma Vénus em Peixes ou ligada a Neptuno, que tudo acolhe e tudo perdoa. Mas a sua passividade, simbolizada pela sua mudez, impede-a de passar à acção e de fazer acontecer uma relação, que, para todos os efeitos, é sempre mais bonita e mais perfeita num plano puramente platónico.
Um dia o príncipe reencontra a princesa que ele acredita ser a sua salvadora no dia do naufrágio e que ele nunca tinha esquecido e declara logo o seu desejo de se casar com ela. Com esta decisão do seu amado, a esperança da Sereiazinha desfaz-se, a aurora do dia do casamento do príncipe com outra mulher transformá-la-á em espuma do mar e ela nunca mais poderá ter uma alma imortal.
Mas as irmãs sereias vêm em seu auxílio e trazem-lhe uma faca que a bruxa lhes dera em troca dos seus lindos cabelos. A jovem só precisa de cravar a faca no coração do príncipe e as suas duas pernas voltarão a ser uma só cauda de peixe coberta de escamas prateadas.
Peixes é o signo com maior capacidade de renúncia e de entrega e, mesmo depois de ver o homem por quem sacrificou a sua voz e a sua vida junto das irmãs no fundo mar escolher outra mulher, a Sereiazinha faz o derradeiro sacrifício e atira-se para o mar para se diluir na espuma das ondas, dando uma última prova do seu amor incondicional.
No entanto, em vez de se dissolver, ela viu-se no meio de criaturas etéreas, as filhas do ar. Enquanto sereia o seu futuro eterno dependia do amor de outra pessoa, mas como filha do ar pode ganhar a sua alma imortal através de boas acções.
Por muito paradoxal que nos pareça (afinal este é um signo mutável), a ligação de Peixes com o outro lado da existência é feita através da encarnação, das escolhas que todos os dias fazemos apenas porque nos encontramos deste lado, onde existe dualidade, matéria e imperfeição.
Evitar estas questões não nos aproxima do divino, apenas nos torna passivos, dependentes e vítimas. A transcendência é alcançada sempre que lidamos com temas que nos são difíceis e ainda assim escolhemos não fugir, não voltar para trás, mas enchemos o peito de Amor e seguimos em frente, em direcção ao centro de tudo, que é o centro de cada um de nós.
Bárbara Bonvalot começou a estudar Astrologia em 2005 e inicia o seu percurso como astróloga profissional em 2009. Actualmente é consultora e formadora de Astrologia, membro da AFAN (Association for Astrological Networking) e da ASPAS (Associação Portuguesa de Astrologia). Entende a Astrologia como uma linguagem que nos leva a um conhecimento profundo de nós mesmos, dos outros e da própria vida.