Sempre associei o Natal ao tempo em família, à altura de rever os primos e tios e à azáfama de todos os preparativos para a ceia.
Era tão feliz quando acreditava que nos tínhamos que esconder no quarto dos fundos da casa da minha avó para aguardar a chegada do Pai Natal.
Acabei por nunca o conhecer, diziam-me sempre que tinha que visitar imensas casas, então não tinha tempo para falar com ninguém.
Guardo imensas memórias dos jogos, das conversas com os meus primos, de ficar com a minha avó a arrumar a casa até de madrugada. E o que permaneceu comigo depois de todos estes anos? As memórias.
O Natal é isto mesmo, uma época para estarmos com aqueles que verdadeiramente importam, a recordar as velhas memórias e a construir novas tradições. Os presentes na verdade pouco importam, aquilo que verdadeiramente interessa é o tempo que dedicamos uns aos outros.
Afinal, as memórias estão em nós e não nos objetos. Mas parece que por alguma razão nos esquecemos disto.
Acredito que o Natal seja mais convívio e menos bens materiais, mais tradições e menos comparações, mais aquilo que realmente importa e menos fazer só porque é suposto.
Não somos obrigados a comprar presentes para todos só porque sim, a perder horas e horas no trânsito em busca do presente perfeito ou, às vezes, só mesmo para riscar esta tarefa da lista.
Podemos fazer mais, muito mais. Tornar esta época festiva em algo maior, com mais significado e com menos tralha.
Num tempo de correria, em que nem paramos para pensar, numa era de aquecimento global, em que os recursos do planeta Terra se estão a esgotar, urge viver um Natal mais simples, consciente e sustentável.
E não custa assim tanto. Para além disso, ganhamos mais tempo e qualidade de vida.
E os presentes?
Há já alguns anos que combinamos não oferecer presentes na minha família e, sinceramente, adoro! Afinal, podemos dar presentes em qualquer altura do ano.
Se não quer abdicar dos presentes, há inúmeras alternativas:
• O seu tempo, ajudando uma amiga com a mudança de casa ou a preparar a ceia de Natal;
• Convidar alguém para um almoço ou lanche em sua casa;
• Escrever um cartão bonito com uma dedicatória;
• Experiências: um almoço ou jantar, uma estadia num hotel, uma massagem, uma aula de ioga ou de surf, uma consulta de coaching, um workshop;
• E-books;
• Assinatura Spotify, Netflix, etc;
• Música em formato digital;
• Donativo para uma instituição;
• Uma suculenta (são plantas fáceis de cuidar);
• Utilidades para a casa em formato sustentável da Mind the Trash;
• Cabaz com produtos biológicos e a granel da Maria Granel;
• Cabaz com produtos ecológicos para rosto e corpo da Saponina;
• Uma almofada de cereais e alfazema (são óptimas para o alívio de dores, basta aquecer);
• Um difusor para óleos essenciais;
• Um kit desperdício zero: frascos em vidro e sacos em tecido para as compras a granel, escovas de dentes em bambu, escovas da louça também em bambu, copo para café ou sumo, uma palhinha de aço inoxidável, etc;
• Algo feito por nós: sabonetes, esfoliante, saquinhos com cheiro para colocar nas gavetas, sal ou azeite aromatizado, licor de baunilha, etc.
Em relação às crianças, é importante tentar reduzir o número de brinquedos, apesar de a tentação de as encher de presentes ser enorme!
Sei que não é fácil explicar a amigos e familiares, mas pode sempre tentar referir que vão ter imensos brinquedos dos pais e que não precisam de mais, que também não é possível brincarem com tudo ao mesmo tempo e que não quer dar uma educação baseada no materialismo.
Algumas pessoas podem não perceber no início, mas acredite que, à medida que o tempo vai passando, fica mais fácil.
É também importante explicar às crianças a necessidade de partilhar e doar alguns brinquedos a crianças que não recebem nenhum presente nesta altura. Então, é uma boa altura para fazer uma arrumação aos brinquedos mais antigos.
Tal como para os adultos, também é possível dar experiências: bilhetes para um concerto, para uma feira que gostem ou para o cinema, uma viagem (por exemplo à neve).
Como embrulhar de forma sustentável?
Basta sermos criativos. Podemos embrulhar com tecido dando alguns nós, reaproveitando papel já utilizado, preferindo fita de papel em vez da tradicional fita-cola ou usar apenas cordel para atar, utilizar jornais, decorar com folhas ou ramos apanhados do chão ou que já tenham sido utilizados.
Também poderá pedir aos seus filhos para fazerem alguns desenhos e embrulhar os presentes de forma totalmente original.
E as decorações?
Menos é mais. Prefira os materiais naturais e ecológicos e reutilize as decorações de anos anteriores. Pode ainda utilizar itens que têm outra utilidade, como paus de canela, corda, ramos e velas ecológicas feitas à base de soja.
Em vez de optar pela tradicional árvore de Natal, utilize por exemplo ramos e coloque numa jarra ou frasco. Poderá também brincar com a madeira e outros elementos naturais.
A mesa fica linda com toalhas, guardanapos em tecido e louça em cerâmica. Se não tiver louça e utensílios para todos, peça para alguém trazer e façam uma mesa original.
Evite o descartável que, para além de ser prejudicial ao nosso planeta, torna-se feio e sem graça.
E depois da época festiva, há que dar um fim digno a tudo o que foi utilizado:
• Aproveitar as sobras para outras refeições e fazer compostagem com aquilo que não puder ser reaproveitado;
• Reutilizar os embrulhos;
• Reunir todo o material de decoração e guardar para o próximo ano. Todas as plantas podem ser utilizadas noutras decorações ou podemos colocar na compostagem.
Nesta época festiva, aproveite para refletir naquilo que realmente importa, diga mais vezes “não” ao consumismo desenfreado e mais vezes “sim” àquilo que a faz realmente feliz.
Que esta época lhe traga mais amor, menos consumismo, mais aconchego e menos desperdício.
Ana Milhazes, 34 anos, socióloga, formadora, instrutora de Yoga, autora do Ana, Go Slowly, um blogue sobre tudo aquilo que nos leva em direcção a uma vida mais feliz, baseada no ser em vez do ter. É ainda fundadora do movimento Lixo Zero Portugal e vive com a missão diária de fazer o mínimo de lixo possível, de partilhar os desafios que enfrenta e de inspirar a mudança.