Sabemos hoje muito mais sobre o amor. Que a qualidade da nossa vida é em grande parte determinada pela qualidade das nossas relações, que somos mais fortes e resilientes quando amamos bem, quando nos relacionamos intimamente e nos vulnerabilizamos.
Sabemos que o amor é a força mais poderosa do mundo. E como é importante para o ser humano, para a sua saúde e quais são as reações que permitem ao casal unir-se ou distanciar-se.
Sabemos também que é através do amor e da conexão emocional que este permite, que reside a maior possibilidade de transformação relacional e individual.
O amor é já há alguns anos, e até ao momento presente, objeto de estudo da ciência. As relações, os casais, as emoções.
O mapa mental do que é o amor
A ciência por detrás do amor avançou, permitindo-nos construir um mapa concreto do amor, permitindo-nos alcançar aquilo que, ao longo de séculos, desejámos: compreender o amor e as relações, observar como somos de verdade, compreender o que ativa as nossas reações, como funcionamos.
Esta compreensão, permite-nos igualmente ganhar uma perspetiva mais profunda e verdadeira das nossas fragilidades e forças. Compreendermo-nos melhor, permite-nos repensar o caminho que queremos que as nossas relações amorosas tomem, permite-nos amadurecer e crescer, tanto enquanto casal, como enquanto indivíduos.
Sabemos hoje que o amor consiste no mais complexo código ou mecanismo de sobrevivência. É porque amamos e nos vinculamos emocionalmente a um outro ser especial (ou seja, que criamos um vínculo ou uma ligação de profunda conexão com um outro), que garantimos que conseguimos enfrentar melhor as tempestades da nossa vida.
Reconhecemos hoje que o amor romântico é como uma espécie de versão adulta do vínculo emocional que uma mãe estabelece com um filho. Estamos a falar do mesmo tipo de vínculo, de onde faz parte a mesma necessidade de proximidade, de segurança e conexão, mas com a importante componente de atração e de desejo sexual, onde a sexualidade do casal conta a história de como estes vivem o toque, o carinho, o prazer, o suporte, os momentos de insegurança, distanciamento, a reparação emocional e os seus reencontros.
A ciência por detrás do amor explica-nos que todos trazemos uma bagagem emocional com a nossa história e dela fazem parte a forma como aprendemos a sentir segurança (ou não), a receber amor, ou mesmo a descansar de forma segura no amor que nos dão.
Desta forma, o nosso padrão de vinculação seria então moldado pelas nossas relações próximas iniciadas na infância. Este é como se se tratasse de um entendimento que fica biologicamente gravado em nós, como se se tratasse de uma impressão digital sobre como é suposto amar e ser amado numa relação.
Desde que nascemos que necessitamos de proximidade, ligação e conexão, sendo portanto o nosso padrão de vinculação um reflexo de como sentimos lá atrás, no passado, a (in)disponibilidade das figuras cuidadoras.
Quando sentimos as nossas figuras cuidadoras disponíveis, criamos um padrão de vinculação seguro, permitindo experienciar nesta e nas relações que se seguem, baixos níveis de ansiedade e evitamento. A relação é sentida como um lugar seguro.
Quando não sentimos essas figuras disponíveis emocionalmente, ou foram sentidas como inconsistentes nas suas respostas (ou até mesmo negligentes), experienciamos níveis mais elevados de ansiedade e evitamento.
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A ciência confirmou que a vinculação consiste numa necessidade humana tão básica como a necessidade de alimentação, saúde, de proteção/abrigo ou sexo. Que quando construímos no nosso ciclo de vida, um vínculo seguro com os nossos parceiros numa relação amorosa adulta, percecionamos esta pessoa como uma base segura, com quem é tão confortável estar e nos relacionarmos, confiando que num momento de desconexão, as nossas necessidades emocionais continuarão a ser respondidas.
Somos seres relacionais
Sabemos hoje que nascemos para nos conectamos emocionalmente com um outro ser humano. Para estabelecermos relações significativas e próximas. Vínculos seguros.
Somos seres relacionais e isso implica que necessitamos do(s) outro(s) importante(s) da nossa vida e que também por isso somos muito melhores juntos. O amor fortalece-nos, devolve-nos vida e paz, principalmente quando amamos e somos amados bem.
Neste sentido, os indivíduos que trazem consigo um padrão de vinculação seguro trariam dentro de si uma maior consciência e conhecimento de como se constroem conexões seguras, pois já têm dentro de si o mapa mental de como se cria uma conexão profunda com alguém importante para nós.
Este mapa do amor que cada pessoa carrega dentro de si, torna-se numa maneira subconsciente de nos conectarmos com os outros nas nossas relações já enquanto adultos, podendo ser mais ou menos saudáveis e caso não nos propusermos a olhar para ele com atenção, poderemos sem querer perpetuar determinados padrões e ciclos intergeracionais de formas de estar e ser numa relação.
É por isso importante perceber que a forma como vemos e sentimos as relações, a forma como aprendemos a amar, pode ajudar a criar uma vantagem para a forma como iremos amar e ser amados em adultos.
Sem dúvida que alguém que tem em si a impressão digital de uma vinculação segura, estará certamente em vantagem para amar melhor em adulto. Conseguirá mais facilmente reconhecer os sinais do que é uma relação saudável e dançar melhor a dança da relação.
A responsividade emocional que aproxima
Casais felizes sabem como reaproximar-se, mesmo após momentos de desconexão ou conflitos, sabem ler os sinais e voltar a conectar-se. Casais felizes constroem um porto seguro um para o outro. Onde cabe a aceitação, a expressão individual de si e do outro, a vulnerabilidade, o despir das máscaras, dos medos e a possibilidade de expor as suas necessidades.
O amor é uma constante dança de sintonização mútua (de sentir com o outro). É um lugar onde existem encontros e desencontros, acertos e falhas, erros e mágoas, reparação e reconexão. Sem fim.
Uma das estratégias para amar melhor passa pela nossa capacidade de responsividade emocional. Para tal, temos de aprender a estar muito mais presentes para o outro. Porque amar melhor envolve consciência e empatia.
Os neurónios espelho que promovem a empatia
Recentemente, a ciência avançou e fez outra descoberta fantástica no campo das neurociências. Descobrimos que somos constituídos por neurónios espelho, ou seja, por neurónios que disparam ou são ativados quando vemos um outro a ter um determinado comportamento ou emoção, conduzindo-nos a uma sintonização e/ou imitação dos sinais que este outro nos envia.
Assim, são os neurónios espelho os responsáveis por termos a capacidade de sentir empatia, que é simplesmente a capacidade de ouvir, reter o julgamento, conectar-se emocionalmente e comunicar essa mensagem incrivelmente poderosa de que o outro que amamos não está sozinho.
A empatia associa-se assim ao altruísmo, à capacidade de cuidar e sentir o outro. Somos efetivamente seres relacionais, especialmente desenhados para construir conexões emocionais profundas.
A neuroplasticidade, que permite mudar a dança do amor
A ciência por detrás do amor descobriu que o amor é um verbo. Que tem de ser nutrido diariamente. Claro que, se ao longo do nosso ciclo de vida a conexão com os outros tem sido um lugar de constante deceção, desilusão ou de insegurança, teremos maior tendência para adormecer ou desligar os sentimentos (para evitar magoarmo-nos ou ferirmo-nos).
Aprendemos a proteger-nos congelando as nossas emoções. Contudo, felizmente, a neuroplasticidade faz parte do cérebro humano, o que indica que podemos sempre reprogramar e viver de forma diferente. Que vamos sempre a tempo de aprender a amar melhor.
Para além de que, a forma como compreendemos as nossas emoções e necessidades, permite-nos mudar a música com que dançamos na nossa relação.
Os bloqueios relacionais que distanciam
A ciência avançou e descobriu que a forma como reconhecemos as emoções (as nossas e a do outro), como estas são ou não faladas, como são ou não acolhidas e como são ou não transformadas, é o verdadeiro segredo para uma relação mais ou menos feliz! Que a partir do momento em que compreendemos, podemos transformar e modificar.
Sabemos hoje o que acontece quando um casal discute, que essa é uma dança de desconexão e que ocorre quando um parceiro pede amor reactivamente (gritando, criticando, revelando a sua raiva, desespero e aflição face à dor de desconexão).
Este comportamento, ativa no outro companheiro um gatilho de ameaça/perigo face às suas necessidades de vinculação (insegurança), produzindo uma determinada emoção e conduzindo-o a um comportamento como resposta.
Este pode desligar-se para evitar magoar-se ou para proteger a relação desse ambiente de conflito com o qual não consegue lidar. Na verdade, nesse momento ambos os parceiros estão a escutar a mesma música de abandono, de medo da rejeição, de desconexão, desencontrando-se cada vez mais na sua dança.
Este ciclo de tensão criado por necessidades de vinculação não respondidas transforma-se em argumentos, discussões ou conflitos que continuamente escalam na relação, até um ou os dois parceiros abandonarem a comunicação para se acalmarem ou porque não conseguem mais aguentar a dor e a angústia do conflito e daquela comunicação, conduzindo o casal ao distanciamento emocional.
Nesses momentos, cada parceiro tem uma perspetiva de si e do outro como responsável por contribuir para estes comportamentos ou discussões. Estas perceções e emoções são normalmente deixadas por comunicar, originando um ciclo negativo que passam a ser expressas sob a forma de culpa, crítica, zanga, desvalorização, irritação ou afastamento.
Estes ciclos negativos são normalmente bastante destrutivos para as relações, mantendo o casal desconectado emocionalmente entre si.
A ciência por detrás do amor descobriu que o salto para sair do lugar escuro da desconexão e deixar de estar refém deste ciclo passa por compreender que o outro não é o inimigo, que o inimigo é esta dança na qual ficam presos, distanciando-se. Que os dois bailarinos em cena, dançam as suas emoções com reatividade ou afastamento, porque estão com muito medo de serem rejeitados, com medo do abandono.
Descobriu que a forma de restaurar a conexão emocional na relação passa por interromper as sequências destrutivas (nas quais a relação fica bloqueada), para que em seguida se possa ativamente construir uma nova interação em casal, com maior recetividade e segurança emocional.
Colocar o casal a falar das suas emoções e necessidades é o primeiro passo para sair deste ciclo negativo de interação e restaurar a conexão emocional. Ou seja, que a magia acontece pelas mãos da responsividade emocional: de como podemos aprender a reconhecer e comunicar as nossas emoções ao nosso companheiro, de como as podemos escutar, para então respondermos de uma maneira vulnerável, acessível e comprometida. Para que ambos consigam sentir que o outro está realmente lá para si.
É um lugar mágico este descoberto pela ciência, de que todos necessitamos de ‘pertenSER’ a um outro especial, como se este fosse um lugar-casa onde podemos descansar e ser. Não num sentido de dependência emocional, onde há espaço para a anulação e desaparecimento individual, mas sim num sentido de verdadeira interdependência (onde cabem dois bailarinos inteiros, que não se diminuem, mas dançam melhor em conjunto).
Um lugar mágico onde descobrimos que a negligência mata o amor. Fica assim cientificamente comprovado que o amor necessita de atenção, cuidado, de ser escutado e visto. Que necessita que nos partilhemos ao outro e que fiquemos ali inteiros com ele. Que o amor pode ser reaprendido para que todos consigamos amar melhor.
Sílvia Coutinho é psicóloga e terapeuta familiar e de casal. Em terapia, procura promover relações com maior conexão emocional, com famílias, casais e a nível individual. Adora refletir sobre as emoções mais profundas que sentimos quando nos relacionamos e acredita ser através destas relações, vividas de forma saudável, que conseguimos também individualmente potenciar o nosso bem-estar, equilíbrio e felicidade. Siga-a no Instagram.