Foi a psicóloga australiana Melanie Schilling que usou o termo microtraição pela primeira vez para designar as interações online que temos com pessoas fora do nosso relacionamento amoroso.
Os meios tecnológicos, as redes sociais e, mais recentemente, as várias aplicações para smartphones trouxeram-nos inúmeras oportunidades para o fazermos de uma forma, aparentemente, subtil.
O investigador e psicólogo britânico Martin Graff, que se tem dedicado ao estudo deste recente comportamento, na Universidade de South Wales Prifysgol De Cymru, no País de Gales, descobriu, na sua última pesquisa, que “a percentagem de pessoas que mantém este tipo de interação é de 50 por cento”.
Em Portugal, a realidade não é muito diferente. De acordo com a terapeuta de casal Catarina Mexia, “nos últimos anos, têm aumentado as queixas de infidelidade relacionadas com o meio online e as redes sociais”.
Os comportamentos suspeitos da microtrição
De acordo com o psicólogo britânico Martin Graff, o termo microtraição não se refere apenas às conversas que são mantidas no meio online, mas também a todo o tipo de interação que pode ocorrer neste contexto. “A microtraição abrange todos os comportamentos que exibimos e que podem indicar que estamos interessados em alguém fora do nosso relacionamento. Pode ser algo como verificar com regularidade o perfil dessa pessoa nas redes sociais ou até guardar o seu contacto no nosso telefone com um nome diferente”, refere Martin Graff.
Mas, afinal, pode uma simples conversa ser sinónimo de uma traição? Pode.
No entanto, de acordo com os especialistas, depende de dois fatores cruciais. Em primeiro lugar, da intenção e, depois, do contexto. Este tipo de interação pode ser considerado um comportamento infiel se a pessoa tiver a intenção de omitir as conversas do seu companheiro ou mesmo de ser infiel.
Conversas ‘inocentes’ vs. infidelidade
Para Martin Graff, a presença ou ausência do flirt nas conversas online representa a principal diferença entre uma conversa inocente e um comportamento infiel.
Catarina Mexia concorda e acrescenta: “Sempre que alguém opta por se envolver em jogos de sedução, mesmo que não pretenda materializá-los numa relação extraconjugal, está a quebrar a confiança. Estabelecer uma conversa que não podemos partilhar com o outro é uma forma de infidelidade emocional”.
O estudo realizado pelo investigador britânico trouxe, no entanto, outras respostas, revelando que o contexto também é determinante. “Na nossa pesquisa, verificámos que os participantes percecionavam o comportamento de infidelidade quando os intervenientes da conversa se mostravam mais interessados em obter e partilhar informações pessoais e quando estas conversas decorriam mais tarde, especialmente à noite”, revela o especialista.
Em Portugal, parecem ser os homens a cometer este tipo de comportamento com mais frequência, segundo a terapeuta de casal.
No entanto, a especialista ressalva que, neste momento, não dispõe de dados concretos que o comprovem, mas, na sua consulta, “existe uma maior tendência do lado masculino”, revela a terapeuta.
Outra conclusão importante da pesquisa realizada por Martin Graff é que “as mulheres são mais afetadas, do ponto de vista emocional, por este tipo de comportamentos do que os homens”.
Causas da infidelidade online
Estar a par dos fatores que estão na origem deste comportamento pode ajudar a prevenir um caso de infidelidade online.
Neste caso, “a gratificação instantânea associada à proteção emocional ‘tecnológica’ são fortes motivadores”, aponta a especialista. E explica que o mecanismo que está por detrás deste ‘efeito emocional’ pode ser uma autêntica ‘massagem’ ao nosso ego: “Quando iniciamos uma conversação com uma pessoa estranha, usando palavras e frases, que dificilmente seríamos capazes de usar cara a cara, e somos correspondidos, e ainda valorizados, conseguimos um boost instantâneo na autoestima. E é precisamente isto que procuramos num flirt ou numa relação extraconjugal.”
A pesquisa de Martin Graff mostrou ainda que as pessoas ciumentas e que estão magoadas ou zangadas são mais propensas às interações online fora do relacionamento.
Gerir um caso de microtraição
Para prevenir a microtraição, a comunicação é fundamental, assim como o estabelecimento de limites. “O casal deve falar abertamente e construir a base do relacionamento online da mesma forma que o fariam para qualquer outro relacionamento social”, aconselha a psicóloga.
De acordo com Martin Graff, a microtraição pode “levar a uma falta de confiança no casal” e deve ser evitada caso ambos queiram permanecer juntos num relacionamento feliz e saudável.
O psicólogo alerta ainda para a importância de se ser sempre honesto: “A honestidade cria confiança e, se esta existe, ambos vão sentir-se mais relaxados e melhor no seu relacionamento”. Para Catarina Mexia, o impacto de uma traição, independentemente do tipo de infidelidade (online, emocional ou física) é “sempre devastador para uma relação”.
A melhor forma de superar a situação passa pela sinceridade e pelo diálogo. “É importante assumir perante o outro o comportamento, perceber as razões e rever a forma como podem repor os limites da relação nos pressupostos da transparência e da honestidade”, recomenda a especialista. Ignorar o ocorrido é um erro crucial e uma atitude a evitar.”
Já tinha ouvido falar de microtraição? Saiba ainda como lidar com uma traição e seguir em frente.