Odeia o Natal? Uma especialista explica porquê
Com a ajuda de uma psicóloga, dizemos-lhe o que deve fazer para que o Grinch que há em si desapareça.
Casas cheias de pessoas, mesas fartas, árvore de Natal e restante iluminação a preceito, trocas de presentes e muita conversa e barulho. Este é o cenário típico do Natal e, se muitas pessoas gostam desse momento, outras detestam-no, à semelhança de Grinch, que muitos conhecem do livro Como Grinch Roubou o Natal, de Dr. Seuss, ou dos filmes de animação com o mesmo nome da personagem.
Esta criatura verde odeia a alegria que as pessoas irradiam nesta época do ano e, por isso, decide roubar os símbolos associados à festividade e terminar de vez com o espírito natalício. É por esse motivo que há quem fale de síndrome de Grinch para caracterizar a tristeza e a irritabilidade que muitas pessoas sofrem na época natalícia.
Mas, nomenclaturas à parte, a verdade é que algumas pessoas não gostam desta época do ano e há várias razões para isso. “Tem muito que ver com que o Natal representa e com as relações e vínculo familiares”, afirma Diana Cruz, psicóloga clínica e terapeuta familiar.
Quem mais sofre
Olhemos, então, para as causas que transformam o espírito natalício em irritabilidade, tristeza, angústia, uma menor tolerância e crítica aguçada.
“O Natal é sempre sinal de encontros com pessoas com as quais não temos tudo resolvido; é altura de nos confrontarmos com projetos de família que não foram aquilo que gostaríamos e de, nos casos em que há filhos, ter de dividir a quadra com o outro progenitor”, enumera a também autora do livro Não É Amor, É Uma Relação Tóxica.
Mas há mais razões, sublinha a terapeuta familiar, e uma delas é o luto pela morte de alguém querido: “O Natal é uma coisa bonita, mas também nos leva a pensar em quem já não está, pois fica sempre aquela saudade”.
Outras pessoas que podem ser mais afetadas negativamente por esta altura do ano, segundo Diana Cruz, são os casais em crise, pais e filhos com relações muito tensas e partes de famílias que não estão bem entrosadas.
“O Natal pode ser uma altura que traz ao de cima os conflitos que deixamos ligeiramente debaixo do tapete. Pode ter
o mesmo efeito que as férias grandes têm nos casais: os que não estão bem ficam ainda piores e, às vezes, só decidir onde vão passar o Natal é um desafio. Parece algo mundano, mas são as coisas mundanas que são verdadeiramente desafiantes para os casais”, explica.
Por fim, “a fricção natalícia pode ainda advir dos balanços do ano. É ambivalente, mas, enquanto está tudo no êxtase do Natal, há quem comece a sentir aquela barreira psicológica do balanço do ano e a pensar que, passado um ano, continuam sem dinheiro para comprar os presentes que queriam; mantêm-se num casamento infeliz; não perderam os quilos que desejariam ou não mudaram de emprego. Tudo isso se adensa porque vão estar com a família e queriam mostrar o melhor de si próprios”, remata a psicóloga.
A solução
Depois de nos desvendar o que está por trás desde espírito antinatalício, a psicóloga Diana Cruz deixa alguns conselhos para o ultrapassar:
Não gosto do Natal porque…
… os meus pais divorciaram-se
“Nunca é fácil, mas há algo que serve tanto para os filhos como para os pais – tem de se aceitar que nunca se estará com todas as pessoas ao mesmo tempo. Com essa condição de base, é centrar a questão na forma como vão passar o tempo. O que faz com que os filhos se sintam mal é a sensação de que estão a fragilizar os pais e isto, para eles, significa estar a escolher uma das partes, portanto, o melhor é os pais abdicarem da posição de força entre eles e darem-lhes espaço para também eles darem ideias para a melhor solução de forma a não se sentirem desleais para nenhuma das partes.”
… o ano não me correu como queria
“Primeiro que tudo convém não tirar os pés do chão e perceber que a noite de 31 de dezembro é um marco psicológico e que depois daquela vem um novo dia, mas na verdade as pessoas ficam muito frustradas quando fazem o balanço do ano e isso estraga-lhes a época natalícia. O melhor é fazer planos para cada mês, mudar pequenas coisas e desistir dessa autoexigência castradora de ter uma lista infindável de objetivos.”
… odeio o consumismo do Natal
“Há uma série de coisas que podemos fazer para tornar o Natal engraçado se percebermos que esta época não tem de ser sobre consumismo. O amigo secreto é uma delas. Se cada um der um presente a uma só pessoa, até pode dar um presente bastante melhor e gastar muito menos dinheiro. Outra solução é só dar presentes aos miúdos e não dar aos adultos ou, então, acordar com estes que é só uma coisa simbólica, como um chocolate. Há ainda algo mais económico, que é escrever uma carta; é barato e cria um momento de reunião.”
… não gosto de uma ou mais pessoas da minha família
“Acho que gostamos de filmes italianos porque temos aquela imagem de toda a gente à mesa, ora a rir, ora a gritar. Isto para dizer que os confrontos diretos são inevitáveis, o ideal é aceitar as limitações de cada um. Depois, em termos práticos, o melhor é não se sentar ao lado dessas pessoas, mas, se isso acontecer, deve ser cordial e falar mais com quem está do outro lado. Pode também optar por ignorar essas pessoas ou fazer uma espécie de cessar-fogo em nome da família, uma vez que não está ali por causa delas, mas porque estão ali os elementos mais importantes da sua vida. As famílias são redes complexas, mas, regra geral, se formos um bocado mais humildes relativamente ao nosso ego, não é assim tão difícil.”
… divorciei-me
“A solução é ter uma boa rede de suporte de familiares e amigos e não ter a tendência de ficar sozinha. Até pode parecer que é aquilo que quer, mas quando chegar o momento, poderá sentir que foi uma má ideia, até porque o Instagram e o Tik Tok vão começar a respirar famílias vestidas de igual e mesas lindas. Outro aspeto importante é abrir-se a novos rituais. Se a família mudou, aqueles também devem mudar porque são sistemas de comportamentos que revelam a identidade das famílias.”
… estou de luto
“É uma situação muito difícil, mas a melhor maneira é não fingir que o elefante não está na sala. O luto é ainda um tabu na sociedade ocidental, mas podemos relembrar a pessoa, recordar como eram os Natais quando era viva e dar abertura para que as pessoas verbalizem a falta que lhes faz; até se pode fazer aquele arroz-doce que ela adorava.”