Não nasci com esse chamamento de ser mãe biológica. Lembro-me de sempre querer adotar uma criança. Dar uma família a quem nunca teve, ou perdeu, ou lhe foi retirada.
Sempre achei que pôr mais crianças no mundo quando tantas outras precisavam de uma família era uma atitude um pouco egoísta. E nunca entendi comentários como, “Não sei se conseguiria amar um filho que não fosse meu”, “Ai, não é a mesma coisa quando não é teu”, “sabes lá que problemas pode ter essa criança!”, e mais disparates como este. Quando há amor para dar, dá-se. No matter who!
Mas fui adiando esse desejo, porque para fazer isso a dois, também precisamos de ter a pessoa certa ao nosso lado. Ou, ainda mais complicado, ter alguém que partilha da mesma opinião. E a não ser que haja um problema clínico, geralmente não querem ou querem os “seus” primeiro.
Eu queria o inverso e sem colocar a hipótese de haver um segundo filho biológico. Aqui era eu que estava a ser egoísta, eu sei. Mas estas decisões têm de ser mesmo a dois, senão, mais cedo ou mais tarde acaba por dar desentendimento.
Durante muito tempo, cheguei mesmo a correr alguns riscos e a convencer-me de que era “imune à gravidez”. E isso dava-me algum descanso, porque na realidade nunca tinha sido algo que quisesse muito. A relação terminou e cada um seguiu para o seu lado. Esta não foi a única razão da separação, obviamente, mas foi a mais forte.
“Por questões clínicas, tive de interromper a gravidez e foi aí que tudo mudou”
Durante alguns anos fui tendo os meus namoricos, paixonetas aqui e ali, mas nenhuma preenchia os requisitos para ser uma relação mais séria e, quiçá, um projeto de família.
Há dois anos, engravidei de um desses namoricos e, embora a relação não tenha tido muito sucesso, percebi que afinal não era “imune à gravidez” como pensava. E na verdade, não tinha problema nenhum. Por questões clínicas tive de interromper a gravidez e foi aí que tudo mudou…
A vida dá-nos a oportunidade de viver situações que nenhum homem alguma vez poderá viver, mas dá-nos um prazo de validade que os homens não têm. Ou se têm, é muito mais alargado.
Aos 39 anos, questões como: “E se esta foi a minha única chance?”, “E se eu não encontrar ninguém nos próximos anos?”, “Mesmo que encontre alguém, quanto tempo vou precisar de esperar para conhecer essa pessoa ao ponto de querer ter uma família com ela?”, ” E se já for tarde?“, e muitas outras dúvidas e preocupações começaram a surgir.
No ano passado conheci uma pessoa que cumpria alguns dos requisitos mais importantes para mim, mas uma proposta de trabalho desviou-o do meu caminho. A nossa diferença de idades era/é grande e a perspetiva de relação também não era/é a mesma e por isso, terminou.
“Deixei de acreditar no amor em pares”
Foi exatamente nesse momento que decidi deixar de hipotecar a minha vida em prol de uma pessoa que se calhar não existe para mim. Deixei de acreditar no amor em pares (embora tenha exemplos incríveis e muito inspiradores à minha volta) e comecei a ver que a minha panela não tem tampa.
Em brincadeira com amigas, dizia sempre: “Eu sou uma frigideira, porque as frigideiras não têm tampa!” E ria-me. Nunca me senti mais completa por ter alguém ao meu lado. Ou mais feliz. É claro que se tivermos alguém com quem partilhar muitas coisas, e sobretudo amor, é melhor. Mas isso nunca foi uma questão para mim. Portanto, eu também não deveria precisar de um companheiro para poder criar a minha própria família.
“Uma produção independente”
Este pensamento e a questão da hipoteca da vida levaram-me à decisão de uma produção independente. Já com a decisão tomada, partilhei a mesma com os amigos mais próximos e com a minha mãe, e ao sentir o apoio, força, encorajamento e amor total de todos, foi só uma questão de tempo até me dirigir a uma clínica de fertilização.
Não foi uma decisão nada difícil porque colocando a minha estória de vida em perspetiva, poucas dúvidas me restavam. Como não tenho nenhum problema de fertilidade (aliás, fiquei a saber que aos 40 anos a minha reserva de óvulos era muito boa), todo o processo foi extremamente simples e rápido, porque só tive de fazer uma inseminação.
Existem dois tratamentos muito comuns: a inseminação artificial e a Fertilização in Vitro (FIV) . A inseminação é exatamente isso, uma inseminação de esperma feita no consultório do médico. Uma FIV responde a um problema de fertilidade. Eu fiz uma inseminação artificial.
Sei que este processo pode ser feito no serviço público ou no privado. Confesso que não procurei muita informação sobre o processo no serviço público, até porque tinha conhecimento de ser um processo mais demorado, com longas filas de espera, e a minha idade não permite grandes esperas, para além de eu não querer esperar.
“O processo em si”
Marquei uma consulta na clínica IVI e a partir daí foi fazer alguns exames e tratamentos. Tendo em conta que se recorre a um dador anónimo, o exame de genética é importante. Não só para ver o nosso histórico genético. Acredito que esta é uma boa ferramenta na hora de procurar um dador.
Não é possível escolher o dador. Este match é feito com base num formulário que preenchemos com as nossas características físicas e tipo de sangue. Com base nestes indicadores, procuram um dador que seja o mais parecido connosco. Da mesma raça, cor de pele, cor de cabelo, cor de olhos, altura, peso, etc…
O processo em si (se não houver qualquer tipo de problema) tem a duração de um ciclo menstrual. Durante 15 dias, tomamos uma injeção por dia com hormonas para ‘alimentar’ os óvulos. Não custa nada! De 3 em 3 dias fazemos uma ecografia (na clínica) onde somos seguidas à risca. Não só veem a evolução do crescimento dos óvulos, como vão medindo a parede do endométrio.
Com estes resultados também se ajusta a quantidade de líquido que é injetado. No dia anterior à inseminação, toma-se uma outra injeção para estimular a ovulação. A inseminação é feita duas vezes (dois dias seguidos). É um processo muito simples, totalmente indolor, sem anestesia e muito rápido.
Depois é só aguardar durante 15 dias que a natureza faça o seu trabalho! No 15º dia fazemos uma recolha de sangue e no mesmo dia sabemos se conseguimos ou não. Caso o resultado seja positivo, ainda somos acompanhas pela clínica até aos dois meses. Depois daqui passamos para o nosso médico e somos acompanhadas como uma gravidez normal.
Este ‘tratamento’ não é muito caro se compararmos com uma FIV, por exemplo. Diria que anda à volta dos 1800€ (já com os exames). Este valor contempla todas as ecografias, a compra do esperma e a inseminação em si. A primeira consulta é paga à parte. No entanto, o melhor é sempre consultar a tabela de preços que pode ter sido atualizada entretanto.
Um conselho bastante útil é a inscrição na Associação de Fertilidade de Portugal. Essa inscrição permite ter um desconto de 10% em todo o tratamento.
Entretanto já estamos de cinco meses e meio e a crescer. É um rapaz e vai se chamar Luca.