Segundo o último relatório da Direção Geral de Saúde (DGS), de 2008 até 2011 o número de mulheres que recorreu à IVG aumentou progressivamente.
Depois, a tendência foi oposta. Entre 2011 e 2017, as IVG (até às 10 semanas) decresceram 25,2%. Sendo que, só entre 2016 e 2017, diminuíram 3,4%.
Certo é que continuam a haver mulheres nesta situação, a precisar de esclarecimento e apoio. Foi por isso que falámos com a Associação para o Planeamento da Família (APF), para esclarecer algumas das principais dúvidas que podem ainda existir sobre este tema sensível.
“Esta informa no sentido de as mulheres conhecerem e fazerem valer os seus direitos, preparando-as da melhor forma possível para fazerem escolhas que lhe permita uma vida com saúde”, esclarece Paula Pinto, coordenadora da Sexualidade em Linha (linha de apoio criada pela APF em parceria com o Instituto Português da Juventude e do Desporto).
Contactámos ainda Sónia Lourenço, diretora executiva da Clínica dos Arcos, onde se realizam 30% das interrupções de gravidez em Portugal, segundo dados da Direção Geral de Saúde.
O que é o aborto induzido (IVG)?
O aborto induzido, também denominado Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) é um procedimento usado para interromper uma gravidez. Quando realizado em serviços de saúde legais e autorizados, até à 10ª semana de gestação, é seguro e com riscos reduzidos para a saúde da mulher.
Fonte: APF
Métodos de IVG
Existem dois métodos para a indução do aborto
- IVG Medicamentos
- IVG Cirúrgica
“A interrupção cirúrgica é realizada em bloco operatório, por uma equipa de médicos e outros profissionais de saúde, altamente qualificados”, diz Sónia Lourenço, diretora da Clínica dos Arcos.
Esta consiste na introdução de uma cânula na cavidade uterina através do colo do útero. Após a colocação da cânula, esta liga-se a um aspirador cirúrgico, esvaziando-se assim o conteúdo uterino. Segundo esta profissional, este procedimento é relativamente simples, eficaz e pouco traumático.
Quanto ao método medicamentoso, a diretora da Clínica dos Arcos explica que consiste na toma de duas medicações intercaladas de 48 horas, com o objetivo de interromper a gravidez. Realiza-se entre a 5ª e 7ª semana de gestação. De acordo com Sónia Lourenço, “a escolha do método depende da avaliação médica”.
Paula Pinto, da APF, salienta, no entanto, que a escolha e vontade da mulher também deve ser tida em conta. “Contudo, no final, esta avaliação está muito dependente daquilo que são os recursos disponíveis para dar resposta”, continua
E ressalva: “o mais frequente nos serviços públicos é o método medicamentoso, já que não são necessários certos recursos, como um bloco operatório”.
Quero interromper a gravidez. O que devo fazer?
“A partir do momento que a mulher suspeita que está grávida, deve confirmá-lo com um teste de gravidez”, aconselha Paula Pinto. “Depois, se realmente equacionar induzir o aborto, deve ir de imediato ao centro de saúde da sua área de residência, para iniciar o processo”, continua
É no centro de saúde que a mulher marca a primeira consulta de interrupção da gravidez. Nesta consulta, Paula Pinto diz que é-lhe explicado todo o processo e lhe são prestadas todas as informações necessárias.
“Posteriormente, este centro articula com o Hospital que deverá fazer o aborto. E é já no Hospital que a interessada faz a segunda consulta.”
Entre a primeira e a segunda consulta, a mulher tem um período mínimo obrigatório por lei de três dias para refletir. “Lá por esta já ter iniciado o processo de IVG, não quer dizer que o leve adiante. Em qualquer momento, pode desistir de abortar”, esclarece a coordenadora da Sexualidade em Linha.
Se levar em diante, cerca de duas a três semanas após a interrupção da gravidez, deverá ir a uma terceira consulta médica de controlo, que é fundamental para se poder confirmar se a IVG foi bem sucedida.
Paula Pinto explica que esta consulta faz parte do protocolo estabelecido pela Direção Geral de Saúde para a realização do processo de IVG, pelo que é sempre agendada, quer no SNS quer em clínica privada.
Estado vs. privado
“No que diz respeito ao que são os requisitos legais e protocolos estabelecidos para a interrupção da gravidez, não há diferenças entre o Estado e o privado. Obedecem aos mesmos critérios”, explica Paula Pinto. “A única diferença é que a mulher chega ao privado e agenda logo o procedimento.”
“Seja como for, os serviços do Estado estão organizados no sentido de darem uma resposta atempada para que a interrupção de gravidez seja feita cumprindo os prazos legais (até às 10 semanas de gestação)”, esclarece.
Paula Pinto aproveita para lembrar que existem Hospitais objetores (contra o aborto). Se acontecer a residência da mulher pertencer a um destes, o mais certo é ser reencaminhada para uma clínica privada com o qual esse Hospital tem protocolo.
“Só em 2018, foram enviadas para a Clínica dos Arcos, em Lisboa, 4122 mulheres. A média anual que o Estado envia para esta clínica é de 75%“, informa Sónia Lourenço.
Mas atenção que não é só por motivos de objeção que os Hospitais reencaminham as mulheres para clínicas. “Na maioria dos casos, é por falta de recursos”, esclarece Paula Pinto.
O Hospital de Cascais, o Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra) e Hospital São Francisco Xavier são alguns dos exemplos de objetores na zona de Lisboa.
Qual o preço do procedimento?
Nos estabelecimentos de saúde públicos e oficialmente reconhecidos, o processo de aborto induzido não tem qualquer custo para as mulheres.
Já no sector privado, os valores variam conforme o tipo de IVG.
A cirúrgica com anestesia geral é a mais cara. Por exemplo, na Clínica dos Arcos, custa 575 euros. Já a IVG cirúrgica com anestesia local é a mais económica (450 euros). A medicamentosa fica por 475 euros.
Há riscos associados ao aborto induzido?
“O aborto induzido não é diferente de qualquer outro procedimento médico ou cirúrgico. Essa questão justificava-se quando a IVG era efetuada em situações que não eram adequadas e não havia o acompanhamento necessário para que esta fosse realizada em segurança”, refere Paula Pinto.
E explica que, atualmente, é feita uma primeira análise, para avaliar o estado de saúde da mulher. Depois, é feito o despiste de algumas situações que possam eventualmente ser tidas em conta, para assegurar que tudo corre pelo melhor. “Nesse sentido, está tudo muito bem articulado”, garante.
Mas como cada caso é um caso e cada mulher reage de forma diferente, há (sempre) alguns riscos a ter em conta. Sónia Lourenço exemplifica:
• Hemorragias;
• Esvaziamento uterino incompleto;
• Infeções;
• Lacerações do colo do útero;
• Perfurações uterinas;
• Aderências intrauterinas.
Será que a mulher sente o apoio necessário?
Paula Pinto lembra que não há estudos de satisfação que assegurem que as mulheres se sintam sempre bem acompanhadas em todo o processo.
As queixas que a APF mais recebe são de mulheres que queriam ser acompanhadas por um só sítio, onde começasse e terminasse o processo. Só que, no que diz respeito à organização dos serviços, muitas vezes, não é possível, como já foi referido.
“Muitas utentes também se queixam de ser tratadas com indiferença, porque querem marcar a primeira consulta e dizem-lhe que de momento não é possível. Esta situação causa-lhes stresse, já que podem ter de fazer a IVG muito em cima do limite permitido por lei”, explica Paula Pinto.
No que diz respeito à Clínica dos Arcos, Sónia Lourenço garante que há sempre uma consulta informativa prestada por um Psicólogo Clínico, onde é feito o acompanhamento individualizado de todas as mulheres que querem interromper a gravidez.
Depois do dia da interrupção, está prevista uma consulta de revisão através de exame ecográfico e uma consulta de aconselhamento contracetivo (CAC). Contudo, “a Clínica dos Arcos observa uma taxa de não comparência às consultas de revisão e CAC muito elevada, na casa dos 40%”, lamenta a diretora desta clínica.
Contactos de apoio ao aborto e interrupção da gravidez
Sexualidade em Linha – 800 222 003
Linha Saúde 24 – 808 24 24 24
SOS Grávida (Ajuda de Mãe) – 808 200 139