A azia surge muitas vezes de forma esporádica após as refeições, sendo frequentemente desvalorizada pelos demais. A verdade é que em alguns casos pode mesmo tornar-se patológica.
Para nos ajudar a compreender em pleno esta condição, falámos com Jorge Augusto Ferreira da Costa Esteves, Coordenador de Gastroenterologia do Hospital CUF Santarém, que de uma forma clara e simplista nos explicou tudo o que precisávamos saber.
Em que consiste a azia e o que a provoca? Que consequências pode ter para o nosso organismo? A que sinais de alarme se deve estar atento? É possível prevenir? E o tratamento?
Foram estas e outras questões que deram o mote a este artigo e às quais procurámos obter resposta. Esteja atenta.
O que é a azia?
Segundo nos introduz Jorge Augusto Ferreira da Costa Esteves, a definição de azia refere-se à sensação de ardor que ocorre por detrás do esterno e que acontece devido à passagem do conteúdo ácido do estômago para o esófago.
Apesar de surgir de forma circunstancial depois das refeições, é um facto que quando persistente e intensa – associada ou não a lesão da parede do esófago (esofagite) – se pode tornar patológica e integrar a Doença de Refluxo Gastroesofágico (DRGE).
O gastroenterologista começa por nos dar a explicação científica: “a sua existência deve-se ao mau funcionamento do esfíncter esofágico inferior (EEI), um músculo circular localizado no terço inferior do esófago, cujo relaxamento permite a entrada dos alimentos no estômago e cujo encerramento evita o seu retorno”.
E continua: “se o EEI relaxar de forma anormal, se enfraquecer ou se houver aumento da pressão abdominal, ficam criadas as condições para o ácido gástrico refluir e inflamar a mucosa do esófago”.
Quais as principais consequências desta condição?
Depois de uma definição e explicação do processo que conduz à azia, procurámos perceber que consequências se podem esperar não só para o organismo, mas para a qualidade de vida, em geral.
Ora, “a azia tende a aparecer cerca de uma hora após a ingestão alimentar e tende a gravar-se com o deitar ou mesmo com a flexão do tronco”, começa por desvendar.
“A sua persistência, contudo, pode levar à restrição alimentar e ao consumo frequente de antiácidos ou de medicamentos anti-secretores ácidos”, declara prontamente o médico.
No caso de integrar a DRGE, pode acompanhar-se de outros sintomas geradores de incómodo como:
- Regurgitação ácida;
- Dor torácica;
- Dificuldade na progressão de alimentos ingeridos (disfagia);
- Tosse irritativa;
- Rouquidão;
- Pieira;
- Episódios de asfixia noturna;
- Sensação de boca amarga.
Segundo nos explica o gastroenterologista, de forma a verem esclarecidas estas queixas, muitas vezes é necessária a realização de consultas e exames em várias especialidades médicas tais como: cardiologia, pneumologia, otorrinolaringologia, estomatologia.
Por sua vez, em relação às principais complicações esofágicas associadas têm-se:
- Estenose benigna;
- Esófago de Barret;
- Cancro (adenocarcinoma).
Já como complicações extra esofágicas consideram-se:
- Asma;
- Laringite crónica.
Existem fatores de risco associados?
Relativamente à existência de pessoas mais vulneráveis e tal como em muitas outras doenças, identificam-se fatores que aumentam o risco para a DRGE:
- Presença de hérnia do hiato;
- Obesidade;
- Gravidez;
- Tabagismo;
- Diabetes mellitus;
- Diminuição da saliva (Sjogren);
- Doenças do tecido conjuntivo (esclerodermia);
- Doenças com aumento da secreção ácida (gastrinoma).
O que podem ser sinais de alarme a considerar?
No que toca aos sinais de alerta a que devemos estar atentos e, tendo em conta que uma das complicações mais temidas na DRGE é o adenocarcinoma esofágico, devem ser levados a um urgente aconselhamento médico os seguintes sinais:
- Nova sintomatologia numa idade superior a 60 anos;
- Dificuldade na deglutinação ou na progressão dos alimentos;
- Presença de hemorragia digestiva;
- Anemia por carência de ferro;
- Anorexia;
- Emagrecimento;
- História oncológica familiar.
Como se processa o diagnóstico?
Em relação à forma como é diagnosticada esta problemática, são-nos referidas três situações distintas.
“No caso dos adultos jovens com azia e/ou regurgitação não são necessários exames médicos para iniciar um tratamento dirigido”, começa o gastroenterologista.
“Já no caso de sintomatologia prolongada, idade avançada, presença de sinais de alarme, alterações imagiológicas ou resposta insuficiente à terapêutica com antisecretores ácidos, aconselha-se a realização de uma Endoscopia Digestiva Alta”, acrescenta prontamente,
Por fim, “o diagnóstico de DRGE em casos menos típicos e a avaliação à resposta terapêutica médica poderão ser confirmadas pela pHmetria 24, um exame que consiste na introdução de uma sonda no esófago para a avaliação do pH durante esse período”, conclui com bastante clareza.
Qual a forma de tratamento mais adequada?
Como formas de prevenir e controlar a azia, o gastroenterologista que nos acompanha nesta conversa, destaca as seguintes medidas:
- Emagrecimento (quando existe excesso de peso);
- Elevação da cabeceira da cama em 15 cm;
- Evitar a ingestão de líquidos e alimentos duas horas antes de deitar e mesmo durante a noite;
- Evitar o consumo de café, chá, picante, gorduras, menta, bebidas gaseificadas, álcool e tabaco.
Por último, damos por finalizada a exploração deste tema junto de Jorge Augusto Ferreira da Costa Esteves, pedindo ao médico que nos fale do que a medicina pode fazer por esta patologia, ao nível de tratamentos disponíveis.
“A maior parte dos casos de azia responde à terapêutica com fármacos antisecressores ácidos, os designados inibidores da bomba de protões”, refere o médico, dando-nos como exemplos do Omeprazol, Esomeprazol, Lansoprazol, Pantoprazol e Rabeprazol.
Por sua vez, “em casos de refratariedade sintomática [quando o paciente continua com sintomas mesmo com a medicação] podem ser aumentadas as doses dos fármacos ou adicionar alginatos ou antagonistas dos recetores de Histamina (Ranitidina), sempre com aconselhamento médico”, refere calmamente.
Finalmente conclui: “a cirurgia antirefluxo está reservada para os doentes que necessitam de doses altas de antisecretores, para doentes com lesões persistentes da mucosa ou em casos associados à existência de hérnia do hiato”.