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Cancro do ovário: a doença que pode ser silenciosa e, por isso, merece a sua atenção

Cancro do ovário: a doença que pode ser silenciosa e, por isso, merece a sua atenção

Os sintomas podem não levantar suspeitas para a maioria das mulheres, o que leva o cancro do ovário a passar despercebido. Esteja atenta a estes sinais.

Por Mai. 8. 2023

O estudo O Cancro do Ovário em Portugal: conhecimento e perceções, feito pela Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO), a Sociedade Portuguesa de Ginecologia Oncológica (SPG) e a associação Movimento Cancro do Ovário e outros Cancros Ginecológicos (MOG), em parceria com a GSK, revelou que 79% dos portugueses sabe o que é o cancro do ovário, mas tem pouco conhecimento sobre a doença.

Talvez isto aconteça porque é considerada uma doença rara, não existindo, inclusivamente, uma recomendação de rastreio. É claro que isto acarreta consequências. Por exemplo, 75% das doentes com cancro do ovário são identificadas em estadios avançados (III e IV) o que piora muito o prognóstico da doença.

A taxa de sobrevivência a cinco anos é de 70% a 90% nos estadios iniciais e de cerca 17% a 39% para a doença avançada. Só em 2020, foram diagnosticados, em Portugal, 561 novos casos de cancro do ovário. 408 mulheres morreram desta doença.

Esta pode não ser a doença mais falada no País, mas, certamente, merece a atenção das mulheres. Infelizmente, ainda não é possível identificar as causas, mas há alguns fatores de risco, como a idade, a obesidade, a menstruação precoce, a menopausa tardia, o baixo número de gestações e a história familiar.

“Cerca de 10% a 20% dos cancros do ovário associam-se a uma síndrome de predisposição familiar para o cancro”, diz à Saber Viver, Cristiana Marques, médica oncologista no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/ Espinho.

Podemos ter um exame de imagem a sugerir tratar-se de cancro do ovário, mas a confirmação do mesmo e o seu subtipo, é dada pelo anatomopatologista após análise do tecido tumoral que pode ser obtido por biópsia ou por cirurgia
Cristiana Marques, médica oncologista no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/ Espinho

Os principais sintomas do cancro no ovário

Pode ser difícil identificar os sinais de alerta deste tipo de cancro, por serem sintomas comuns que, por norma, não causam alerta. “Os sintomas são, geralmente, inespecíficos e tardios, daí a importância de serem mantidas rotinas médicas”, afirma a especialista.

Porém, esteja atenta a:

  • Distensão abdominal persistente;
  • Enfartamento precoce;
  • Perda de apetite;
  • Dor abdominal;
  • Sintomas urinários (frequência ou urgência urinária);
  • Alteração do trânsito intestinal (diarreia ou obstipação);
  • Fadiga extrema;
  • Perda de peso.

É ainda importante dizer que existem diferentes tipos de cancro neste local. “Dependendo da célula que origina o tumor, podemos ter cancro do ovário epitelial (origem no tecido epitelial) ou estromal (origem células germinativas ou estroma). O cancro do ovário epitelial é o mais frequente, e dentro deste grande grupo, o subtipo mais frequente é o seroso de alto grau, mas existem outros subtipos como o endometrióide, o células claras, o mucinoso e o seroso de baixo grau”, realça Cristiana Marques.

Posto isto, é de extrema importância que se caracterize o subtipo de cancro para que seja definido o melhor tratamento. A verdade é que esta é a quinta causa de morte por doença oncológica entre as mulheres, sendo o cancro ginecológico com maior taxa de mortalidade.

O diagnóstico é sempre histológico. A médica oncologista explica que “podemos ter um exame de imagem a sugerir tratar-se de cancro do ovário, mas a confirmação do mesmo e o seu subtipo é dada pelo anatomopatologista após análise do tecido tumoral, que pode ser obtido por biópsia ou por cirurgia.”

O que pode não saber em relação ao tratamento de doentes com cancro do ovário é que este só é financiada pelo SNS para doentes que tenham mutações BRCA ou Gbrca. Em 2019, foi lançada a iniciativa saBeR mais ContA, exatamente para esclarecer a população sobre os sinais e sintomas de alguns tipos de cancros, entre os quais o do ovário, e a sua relação com as mutações genéticas.

Até há pouco tempo, Portugal era dos únicos países da Europa sem uma alternativa de tratamento de manutenção em primeira linha para o cancro do ovário

E o que são as sBRCA ou Gbrca?

Como explica a especialista, “os genes BRCA, são responsáveis pela nossa proteção ao aparecimento de cancro.  Mas, quando um gene BRCA sofre uma mutação, perde a sua capacidade protetora, torna-nos mais suscetíveis ao desenvolvimento de tumores malignos, como cancro da mama, ovário, próstata e até mesmo cancro do pâncreas.

Até há pouco tempo, Portugal era dos únicos países da Europa sem uma alternativa de tratamento de manutenção em primeira linha para o cancro do ovário, financiada e disponível no Serviço Nacional de Saúde. Agora, está disponível, sim, mas só para as doentes com as mutações acima referidas. Por outro lado, as doentes que não tenham estas mutações, não têm acesso a estes tratamentos.

“Os ensaios clínicos mostram, de uma forma clara, que as doentes com mutação BRCA são as que têm benefício mais expressivo com os inibidores da PARP, muito embora todas beneficiem em termos de sobrevivência e qualidade de vida”, refere Cristiana Marques.

Importa esclarecer, que as doentes com cancro do ovário sem mutação, têm acesso aos inibidores da PARP a partir da segunda linha. Quanto mais tarde oferecermos o tratamento a uma doente, o benefício que a doente irá obter será menor. Deste modo, não entendo o racional para o não financiamento em primeira linha.”

Questionámos ainda a médica oncologista sobre a eventualidade de o tratamento chegar a todas as doentes. “Acredito que sim. Esta desigualdade no acesso não se coaduna com os princípios de justiça e equidade pelos quais o SNS se rege.”

A prevenção adequada

Ainda que não haja causas associadas ao cancro do ovário, há alguns passos que pode dar para prevenir a doença:

Para as famílias portadoras de mutação no gene que aumenta a susceptibilidade para cancro do ovário ao longo da vida, “é lhes proposto cirurgia redutora de risco, nomeadamente a ooforectomia (remoção dos ovários)”.

Quanto ao tratamento, “o tratamento é definido em equipa multidisciplinar e passa sempre que possível por cirurgia de resseção tumoral, seguida de  quimioterapia com ou sem tratamento de manutenção/consolidação (antiangiogénicos ou inibidores da PARP)”, realça Cristina Marques.

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