Crónica. Mês rosa e a intimidade após o cancro da mama
Aprenda a Saber Viver sem tabus. Todos os meses, a sexóloga Vânia Beliz promete falar abertamente sobre sexualidade, com o propósito de desmistificar questões associadas ao sexo e à intimidade, e para a fazer pensar e refletir sobre temas que podem, mesmo, mudar a sua vida.
Quando falamos do corpo feminino, as mamas têm sem dúvida um papel de destaque.
Na puberdade, com o surgimento do botão mamário e seu aumento, o crescimento das mamas é um dos sinais de que estamos a entrar na adolescência. Quem não se recorda do seu primeiro sutiã?
Na representação feminina, as mamas são uma das partes mais valorizadas e no prazer uma das zonas erógenas. No olhar masculino, também são das zonas mais excitantes do corpo feminino. Contudo, são também das partes do corpo que as mulheres mais transformam.
Há uns anos, o silicone veio revolucionar a insatisfação feminina com as suas mamas. Hoje, multiplicam-se as que procuram através da estética modificar, corrigir ou melhorar esta zona importante através de técnicas cada vez mais avançadas.
Tendo em conta a valorização da mama no corpo feminino, não será difícil de prever as consequências que uma doença como o cancro pode trazer.
O cancro da mama tem uma das consequências mais difíceis para as mulheres quando o tratamento passa pela remoção de parte ou totalidade da mama (ou mamas) da mulher.
A alteração da imagem corporal e a perda da identidade que tantas descrevem trazem consequências para a intimidade e podem mesmo transformá-la para sempre.
Muitas mulheres sentem-se menos femininas, menos atraentes, havendo, dessa forma, uma diminuição do desejo. A verdade é que, após uma cirurgia, os primeiros períodos são de luto, mas depois há que caminhar para a superação.
Uma grande parte das mulheres queixa-se de afastamento dos parceiros e da aversão destes pelo seu corpo, que sentem como mutilado.
Por esta e outras razões, o apoio psicológico é imprescindível, assim como implementar estratégias que visem reforçar a autoestima. Felizmente, o mercado oferece hoje soluções que podem melhorar a relação que as mulheres têm com o seu corpo.
Urge acompanhar estas mulheres e os seus parceiros/parceiras. Urge resignificar este erotismo que não pode ficar confinado a uma parte exclusiva do corpo.
E tudo tem o seu tempo, o necessário para se curarem feridas internas e redescobrir na intimidade e no amor o apoio tão necessário para ultrapassar este momento.
A reconstrução mamária é para muitas mulheres o renascer da sua feminilidade, por isso, seria perfeito se o processo pudesse ser mais rápido. Até lá, as próteses podem ajudar.
É preciso falar de intimidade com as pessoas que passam por este desafio, pois o silêncio, como em tantas áreas, só agrava medos e a insegurança.
Com ou sem reconstrução mamária, as mulheres tentam superar este momento, e a partilha e apoio da família e das instituições são um suporte indispensável.
Não há problema se fizer uma pausa no sexo, o importante é que o amor esteja lá, presente, todos os dias, como um combustível para a cura.
Vânia Beliz licenciou-se em Psicóloga Clinica e da Saúde. Mestre em Sexologia e doutoranda em Estudos da Criança na especialidade de Saúde Infantil, na Universidade do Minho, participa em projetos no âmbito dos Programas de Educação para a Saúde (PES) e o Projeto de Educação Sexual “A viagem de Peludim”, para crianças. É autora do livro Ponto Quê?, sobre a sexualidade feminina, e de Chamar As Coisas Pelos Nomes, dirigido às famílias sobre como e quando falar sobre sexualidade.