Disfagia: quando comer deixa de ser um prazer

Comer é essencial para a nossa sobrevivência e um dos maiores prazeres da humanidade, mas, por vezes, é condicionado pela disfagia. Maria Caçador, otorrinolaringologista e coordenadora da unidade da voz e deglutição do Hospital CUF Tejo, explica este problema de deglutição.

Por Jul. 18. 2022

A deglutição é a função fisiológica de engolir, que permite que os alimentos sejam transportados, de forma segura, da boca até ao estômago. É um mecanismo extremamente complexo, em grande parte involuntário, que implica uma coordenação neuromuscular (coordenação entre os nervos e os músculos) muito exigente.

Durante a deglutição é necessário transportar o bolo alimentar até ao estômago de forma segura, ou seja, sem que o alimento seja aspirado para os pulmões.

Este processo implica a ação de mais de 40 pares de músculos da boca e pescoço e uma coordenação perfeita entre os nervos que comandam a ação e os músculos que a executam.

O que é disfagia?

Disfagia é a dificuldade em engolir alimentos sólidos, líquidos, comprimidos ou secreções.

Este sintoma pode surgir associado a múltiplas doenças ou simplesmente ao envelhecimento.

Alguns estudos estimam que 22% das pessoas com mais de 50 anos sofrem de disfagia – Maria Caçador, otorrinolaringologista

Como suspeitar que existe um problema de deglutição?

Deve suspeitar-se de disfagia sempre que a alimentação é acompanhada de:

  • Tosse ou engasgamento durante a alimentação (líquidos, sólidos ou medicamentos);
  • Falta de ar/ dificuldade em respirar;
  • Voz rouca ou voz “molhada” depois da refeição;
  • Dificuldade em mastigar;
  • Dificuldade em fazer progredir a comida da boca ou da garganta para o esófago;
  • Sensação de comida presa na garganta ou no peito;
  • Infecções respiratórias frequentes (por exemplo: pneumonias);
  • Dor a engolir;
  • Babar/ Salivação constante;
  • Sentir a comida voltar à boca ou sair pelo nariz.

Ou se existe:

  • Recusa ou falta de prazer em ir comer fora de casa ou em ocasiões sociais
  • Perda de peso sem razão aparente

Que doenças podem interferir com a deglutição e causar disfagia?

A disfagia é um problema global, que afeta homens, mulheres e crianças, causado por múltiplas doenças como:

  • Acidente Vascular Cerebral (AVC);
  • Doenças neurológicas (doença de Parkinson, esclerose lateral amiotrófica, esclerose em placas, doença de Alzheimer, entre outras);
  • Demência;
  • Paralisia cerebral;
  • Tumores da cabeça e pescoço;
  • Traumatismos da cabeça e pescoço;
  • Pós-operatório de cirurgias do pescoço (cirurgia da tiroide, da coluna cervical, da carótida) e de cirurgias ou intervenções cardíacas;
  • Refluxo faringo-laringeo;
  • Envelhecimento.

Por que é que ter dificuldade em engolir pode ser grave?

A dificuldade em engolir/disfagia pode apresentar-se de formas muito variadas, ter causas muito diferentes e resultar em complicações graves como:

  • Desidratação;
  • Malnutrição;
  • Perda de peso;
  • Pneumonia por aspiração de alimentos;
  • Compromisso significativo da qualidade de vida dos doentes e até morte.
Qualquer suspeita de disfagia deve ser investigada por uma equipa multidisciplinar, numa unidade de deglutição – Maria Caçador, otorrinolaringologista

O diagnóstico da disfagia: consultas e exames

O diagnóstico precoce e uma intervenção eficaz e atempada pode ajudar a obter uma reabilitação funcional e a prevenir complicações graves e a melhorar a qualidade de vida dos doentes com disfagia.

Qualquer suspeita de disfagia deve ser investigada por uma equipa multidisciplinar, numa unidade de deglutição.

Na consulta de deglutição, o otorrinolaringologista vai obter uma história clínica completa, identificar as causas da dificuldade em engolir, verificar a força e o movimento dos músculos envolvidos na deglutição e observar a postura, o comportamento e os movimentos orais durante a alimentação. Realizam-se ainda exames endoscópicos – videoendoscopia da deglutição.

Durante a videoendoscopia da deglutição, um exame endoscópico indolor e bem tolerado, é observada a laringe sem alimentos e enquanto o doente se alimenta, de forma a identificar a patologia específica em causa e definir que alimentos é seguro comer e em que quantidade.

Como se tratam as alterações da deglutição?

Geralmente, o tratamento depende da causa e do tipo da disfagia. Na maioria das vezes a disfagia  pode ser corrigida ou melhorada, mesmo que a cura da doença de base não seja sempre possível.

O tratamento destas situações pode incluir:

  • Terapia da deglutição – ensina técnicas de deglutição;
  • Mudança da consistência dos alimentos de forma a que a deglutição seja mais segura;
  • Alimentação de formas diferentes da alimentação oral;
  • Cirurgia.
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