Não é novidade para ninguém que as doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em Portugal e, no mês em que se celebra o Dia Mundial do Coração (29 de setembro), vamos olhar para o enfarte agudo do miocárdio, também conhecido como ataque cardíaco.
De acordo com os dados do INE relativos a 2019 e divulgados em março de 2020, esta doença foi responsável por 4275 mortes, o que representa 3,8% da mortalidade total no País. Se compararmos com o ano anterior, há que realçar que se verificou uma diminuição de 7,5% no número de óbitos.
Um dado positivo no meio de um panorama sempre pouco animador, apesar de este grupo de doenças estar intimamente ligado ao estilo de vida, o que significa que, se o alterarmos, podemos diminuir acentuadamente o risco cardiovascular.
Obstrução das artérias
O tabagismo, o colesterol, a hipertensão, a obesidade e o excesso de peso, o sedentarismo, a diabetes, o stresse e a menopausa são os fatores de risco associados ao enfarte agudo do miocárdio, que, à semelhança da angina do peito, afeta as artérias coronárias, responsáveis pela irrigação do músculo cardíaco.
O enfarte acontece, explica Susana Corte Real, médica especialista em Medicinal Geral e Familiar, quando “há uma interrupção súbita do fluxo sanguíneo numa das artérias coronárias, o que faz com que essa parte do músculo cardíaco não seja irrigada, provocando a morte das células da zona devido à falta de aporte de oxigénio”.
A causa mais comum para a obstrução das artérias é a aterosclerose, que se forma ao longo da vida devido a depósitos de gordura, principalmente de colesterol, hidratos de carbono, sangue e produtos sanguíneos, tecido fibroso e depósitos de cálcio.
Sintomas de um enfarte agudo do miocárdio
- Dor tipo aperto no peito, que pode irradiar para os membros superiores e para o maxilar;
- Sudorese;
- Desmaios;
- Sensação de enfartamentos.;
- Enjoos;
- Falta de ar;
- Arritmia;
- Cansaço inexplicável.
Fonte: Susana Corte Real, médica especialista em medicina geral e familiar.
Especificidades femininas
“A dor no peito, que pode irradiar para os membros superiores e para o maxilar, é o sintoma mais típico do enfarte”, diz Susana Corte Real. No entanto, pode existir outra sintomatologia e a médica frisa “que a dor de peito nem sempre acontece no sexo feminino”, o que por vezes dificulta o diagnóstico.
“Nas mulheres, os sintomas de enfarte agudo do miocárdio podem ser enjoos, falta de ar, cansaço inexplicável e arritmia”, sublinha.
Quando se fala de sexo feminino e de ataques cardíacos, é importante realçar o papel da menopausa. “Não é que provoque enfarte agudo do miocárdio, mas, na menopausa, verifica-se uma queda abrupta de estrogénios e essa alteração hormonal leva a que exista uma maior probabilidade de ter hipertensão arterial e provoca alterações no colesterol, ou seja, diminui a quantidade de bom colesterol (HDL) e aumenta a de mau colesterol (LDL). Além disso, nesse mesmo período da vida, as mulheres tendem a aumentar de peso e a gordura que se acumula na barriga provoca uma maior resistência à insulina, favorecendo assim o aparecimento da diabetes”, explica a nossa entrevistada.
12 morrem por dia de enfarte agudo de miocárdio em Portugal
História familiar
Portanto, “até à menopausa, estamos protegidas com os estrogénios, mas quando perdemos essa proteção corremos até maior risco do que os homens”, realça a médica, que exemplifica: “Depois da menopausa, e tendo os mesmos fatores de risco do sexo masculino, o sexo feminino tem uma maior probabilidade de ter eventos cardiovasculares. Uma mulher que fume, após a menopausa, tem 25% mais probabilidade de ter um enfarte agudo do miocárdio do que um homem fumador da mesma idade.”
Ainda na mulher, há outros fatores de risco a considerar, diz Susana Corte Real, entre os quais, a hipertensão e a diabetes gestacionais, a endometriose, bem como a menopausa precoce.
Para ambos os sexos, é importante ainda estar atento à história familiar. “Não podemos impedi-la, mas temos de a conhecer e, a partir do momento em que sabemos que há história de doença cardiovascular precoce na família, podemos atuar nos fatores de risco e prevenir a ocorrência de doenças como diabetes, hipertensão e colesterol”, diz a médica.
Na sua prática clínica, Susana Corte Real usa a ferramenta Score para medir o risco de cada paciente. “Introduzimos os vários fatores de risco, a idade e o género, e o valor obtido diz-nos qual a probabilidade de essa pessoa vir a ter um evento cardiovascular no futuro e, dependendo do nível de risco, podemos atuar de forma personalizada”.
Tratamentos
Análises clínicas e um eletrocardiograma são os meios de diagnóstico do enfarte agudo do miocárdio e uma vez identificado é preciso agir rapidamente de modo a preservar o mais possível o músculo cardíaco e a sua função.
“Se temos uma parte do músculo que deixou de ser irrigada, o coração funciona pior na sua totalidade e uma consequência comum do enfarte agudo do miocárdio é a insuficiência cardíaca”, ressalva diz Susana Corte Real.
No tratamento, são usados em primeiro lugar “fármacos antiagregantes plaquetários que fazem com que o sangue fique mais fluido. Mas pode ainda ser necessário fazer um cateterismo. Na angioplastia, é introduzido um cateter, por exemplo, pela virilha, para tratar a obstrução da artéria coronária do coração e poderá ser possível colocar um stent, que irá manter a artéria desobstruída. Se não for suficiente, faz-se um bypass coronário, que, no fundo, é ir buscar um pedaço da veia safena das pernas para colocar no coração, na zona onde a artéria esta obstruída”, explica a médica.
Após a alta hospitalar, “é obrigatório adotar uma alimentação saudável e a prática de exercício físico, bem como tratar todos os fatores de risco que causaram o enfarte agudo do miocárdio e tomar medicação para controlar a diabetes e o colesterol, reduzir a pressão arterial e a frequência cardíaca e para manter o sangue fluido”, remata a médica.