O cancro da mama continua a aumentar. Só em Portugal são detetados cerca de seis mil novos casos por ano.
As mulheres entre os 50-70 anos são as mais atingidas, mas ainda há um número preocupante, abaixo dos 40, que contraem a doença. De tal forma que ainda morrem 1500 por ano, em Portugal, nesta faixa etária.
A Saber Viver esteve à conversa com três mulheres, cuja idade ainda não dava “direito” a rastreio, e duas na faixa etária mais afetada. Todas fortes.
Daniela Antão, 46 anos (diagnóstico aos 40)
Daniela Antão começou por desconfiar que algo poderia estar mal, em casa, quando pousou a mão sobre o peito e sentiu uma bolinha dura. “Gelei por uns momentos e depois pensei ‘não há de ser nada’. Amanhã vou ao médico”.
No dia seguinte, a primeira coisa que fez foi ligar ao seu ginecologista e fazer uma ecografia. Durante o exame, o ecografista aconselhou-a de imediato não só a fazer a mamografia e ressonância magnética, como a biópsia. O resultado saiu no dia em que Daniela fez 40 anos.
O cancro de Daniela era do tipo ductal – nos canais da mama que levam o leite para os bebés. Este cancro é alimentado por hormonas femininas, o estrogénio e a progesterona, facto que deixa Daniela sem dúvidas.
“O meu cancro tem causas explicáveis. Vem das agressões a que submeti o meu corpo, com aquela quantidade astronómicas de hormonas que vêm nas pílulas e nas carnes”. Agora só come carne biológica e deixou de tomar a pílula.
“Eu sou determinada. Luto contra o pessimismo. Claro que tive três ou quatro momentos em que comecei a chorar com medo, porque o desespero é muito forte. Tenho três filhos, e o pavor de que eles ficassem sem mim foi enorme”.
Mas conseguiu desligar esses neurotransmissores e ficou fria, racional e determinada a dizer “vou resolver isto e ponto final”. E assim foi.
Resolveu recorrer a tudo: à medicina chinesa (fitoterapia e acupunctura) e informou-se sobre a alimentação que deveria fazer. Começou a descansar e fez imenso desporto, em especial, corrida, para aliviar a tensão emocional.
“Corri muitíssimo, tratei de mim”, enfatizou. Daniela nem imaginava o bem que estava a fazer ao seu corpo, durante esse mês, entre o diagnóstico e a cirurgia.
Os 12 nódulos, verificados na ressonância magnética passaram a três. Só depois da mastectomia total (quando levaram a peça para analisar) é que os médicos e Daniela descobriram esta remissão.
“Então eu fico a pensar, ‘como é que num mês os nódulos reduziram tanto?’ Provavelmente o meu corpo reagiu a este meu novo estilo de vida e esteve a combater a doença. Provavelmente podia ter evitado perder um peito.”
Daniela Antão aproveita para alertar para a importância da alimentação como forma de prevenir o cancro. “A mim choca-me que os oncologistas não prescrevam regime alimentar anti-cancro.”
“Começaram por me dizer que teria de cortar não só a glândula que está dentro da pele, como a própria pele. Eu ouvi e fiquei a digerir esta ideia. Só que depois perguntei ao médico: ‘se os meus nódulos estão nos canais da glândula, por que é que tenho de cortar também a pele?’”
Graças às questões pertinentes de Daniela, lá se fez apenas a mastectomia subcutânea. Rasparam o que tinham a raspar e meteram-lhe um implante por baixo do músculo mamário. Fizeram igual à outra mama, para ficar com as duas iguais.
“Para mim, era óbvio que o meu tratamento oncológico fosse também estético. O médico pôs-me um peito muito bonito.” Mas Daniela apercebeu-se que há mulheres a quem não está a ser feita reconstrução mamária. “Julgo que há omissão de tratamento. Não há direito que se faça isso. Se não há justificação médica, é criminoso”.
A experiência de Daniela deu um livro. Chama-se Crónica de uma Ressurreição e já está nas bancas.
Vera Nabeiro, 37 anos (diagnóstico aos 35)
Vera descobriu que tinha cancro há dois anos. Passou a mão pelo peito direito e sentiu algo estranho. Quando foi ao ginecologista, este desvalorizou. Achou que podia ser um gânglio mamário inflamado. Mas no mês seguinte, depois de um ciclo menstrual, o nódulo mantinha-se. Então, prescreveu-lhe uma ecografia mamária, porque aos 35 anos nunca tinha sido alvo de rastreio.
Foram descobertos quatro nódulos. O resultado da biópsia chegou quase um mês depois. Deu carcinoma evasivo da mama direita. Depois, seguiu-se uma semana muito intensa de exames.
Vera estava já com um cancro triplo positivo (de estádio 3). Seria um quadro avançado. “A médica disse-me que não poderíamos salvar a mama. Que teria de ser mastectomia total e radical porque teríamos de fazer também esvaziamento axilar”, recorda. O cancro já estava com metástases.
Começou por fazer quimioterapia neoadjuvante, antes da cirurgia, para reduzir ao máximo o tamanho do tumor. Fez quatro ciclos. Resultado: houve uma regressão total do tumor à data da cirurgia, o que não invalidou ter de retirar a mama, por questão de segurança, idade e possibilidade de reincidência.
Vera também foi sujeita a uma TRAM, um procedimento onde se retira gordura da barriga para encher a mama. Para os dois peitos ficarem o mais parecidos possível, a mama saudável foi reduzida. “Eu tinha uma copa D que passou para B porque já não tinha barriga para encher mais”.
E acrescenta: “até conseguimos aproveitar o mamilo direito. As mamas estão um pouco diferentes uma da outra, mas não causa qualquer transtorno. Costumo dizer que fiquei muito melhor, porque agora as maminhas estão mais pequeninas”.
Depois da cirurgia, Vera ainda fez quatro sessões de quimioterapia “para matar tudo”. Foi tudo muito rápido. Depois começou a radioterapia (28 sessões).
“Com a quimioterapia, o corpo fica fraquinho, trémulo e debilitado. Até cheguei a perder a pele da boca e fiquei com a parte ginecológica muito ferida. Tinha episódios de diarreia fortíssimos”, confessa.
E com a quimio vem a queda do cabelo. “Quando comecei a perder o cabelo, tentei enganar-me dizendo que estávamos numa época do ano mais propícia a isso. Mas eu não estava à espera que fosse tão rápido”.
Cabeleireira de profissão, Vera sentia-se preocupada com a filha, na altura com 9 anos. “Não a queria melindrar. Mas ela tinha de viver com o problema”.
Atualmente, colabora no programa “#1500razões para estarmos próximos”, que tem como objetivo aproximar as mulheres, retirar dúvidas e desmistificar. “Fiquei fã, porque estou muito bem e gosto de passar força”, garante.
Mas quando soube do seu cancro também lhe “caiu o mundo em cima”. Mudou completamente. Separou-se do marido. “Estávamos casados há 13 anos e tínhamos uma filha não comum. Eu era um segundo casamento dele e as coisas já não estavam firmes. Depois de um abanão destes, nem todos os casais aguentam. E depois, quando não há amor firme, não é fácil”, conta.
Hoje, mudou a forma de ver a vida. Tem um estilo de vida mais saudável: come melhor e faz hidrocycle. “Sinto-me melhor com o meu corpo”, confessa.
Sofia Duarte, 36 anos (diagnóstico aos 35)
O cancro de Sofia é diferente. Talvez por isso a auxiliar de farmácia demorou a perceber a gravidade do problema.
Começou por ver uma pintinha de sangue no soutien mas não ligou. Pensou que tivesse sido um bichinho ou uma pulga da gata. Depois voltou a verificar uma pintinha de sangue exatamente no mesmo sítio do soutien. “Estranho. O meu filho até já tem quatro anos, por isso não pode ser nada do leite”, pensou.
Passados uns dias, sentiu mesmo algo a pingar-lhe no braço. Era sangue. Há meses que sentia um ardor na mama (esquerda), mas achou que seria do período. “Não tinha nódulos, apenas uma massa não rígida”, disse Sofia. Para mais, esta não era fácil de detetar, porque estava mesmo debaixo do mamilo.
Como não tinha histórico de cancro na família, nunca pensou que fosse do cancro da mama. Achou até estranho a pressa do médico em mandá-la fazer de imediato uma série de exames.
A mamografia não acusou nada. Foi na ecografia que se notou uma massa. Primeiro até se pensou que fosse um simples papiloma, mas nada grave. Foi a biópsia que acusou células degenerativas, mas não dizia explicitamente que seria algo maligno.
Entretanto, Sofia fez a cirurgia para tirar aquele bocado (grande). Este foi para análise e descobriram-se várias células cancerígenas. Era um carcinoma ductal in situ, no canal da mama, por isso não espalhou para mais lado nenhum.
Seja como for, os médicos acharam por bem tirar tudo, incluindo o mamilo. Só deixaram a pele. Vera colocou então um expansor, uma espécie de balão que tem uma parte metálica que vai injetando a mama com soro, até ficar do mesmo tamanho da outra.
O objetivo era fazer com que a pele ganhasse elasticidade, para depois trocar o expansor pela prótese. “Na mesma operação, ainda me nivelaram as duas mamas. Tiraram o expansor, colocaram a prótese e puxaram a outra para cima”, lembra.
Noutro procedimento, fizeram-lhe a reconstrução do mamilo. “Deram um nó. Ou seja, cortaram um pouco de pele e fizeram um apanhado só para dar aquele aspeto de mamilo”.
Mais tarde, Sofia até decidiu fazer uma tatuagem com a imagem de uma aréola, dirigindo-se a um especialista na matéria, para o efeito.
Sofia Duarte confessa que receber um diagnóstico destes aos 35 anos é devastador. “Fiquei com medo dos tratamentos e de não ficar em condições para tratar dos miúdos (uma filha de oito anos e um menino de quatro).”
Quem olha para Sofia não se apercebe que ela teve a doença, porque não fez quimioterapia nem radioterapia. Não houve necessidade, porque não se tratava de cancro invasivo.
Neste momento, faz exames de seis em seis meses, mas sente-se muito bem. Já nem sente dores, provocadas pela mastectomia. Curiosamente, é na mama oposta, a que puxou para cima, que sente incómodo.
Mas Sofia teve a sorte de ter um homem forte ao seu lado, que lhe deu todo o apoio. “Às vezes culpamos os maridos, mas nós mulheres também nos fechamos muito, porque também nos faz confusão como um homem consegue olhar para nós como mulheres. Sem roupa, está ali uma coisa que substitui a mama e pronto. Nota-se que não são iguais”.
Agora, dá mais valor às pequenas coisas da vida. E, curiosamente, passou a sentir grande influência do clima. “Quando estão dias cinzentos, para mim é horrível. Agora, o verde das árvores é a coisa mais linda do mundo!”
Olga Braz Pereira, 69 anos (diagnóstico aos 51)
Olga Braz Pereira passou pela experiência do cancro há 18 anos, altura em que a medicina ainda tinha muito que percorrer.
Faltavam 15 dias para fazer 51 anos quando fez o rastreio. Não tinha sintomas. Como a própria diz: “fiz o rastreio só por fazer”. Duas semanas depois, foi chamada para uma consulta de aferição, onde lhe confirmaram um carcinoma in situ no canal ductal.
“Fui encaminhada para o IPO de Coimbra. Fiz todos os exames necessários e, a seguir, quatro ciclos de quimioterapia”. Mas nem isso impediu esta professora de português e francês de continuar a dar aulas, até à véspera da cirurgia.
O tumor reduziu bastante com a quimio. Mesmo assim, Olga teve de se submeter a uma quadrantectomia da mama direita. Confessa ainda que as 25 sessões de radio posteriores deixaram-na muito cansada, mas nada comparável com a quimio.
Olga volta atrás no tempo e lembra-se que o primeiro diagnóstico que teve foi de mastectomia. Mas depois da quimio, os médicos decidiram conservar a mama e cortar-lhe apenas um quarto da mesma.
“Disse-lhes que enquanto mulher, claro que gostaria de manter a mama. Mas se durante a cirurgia achassem que a ideia não era viável, que tomassem a decisão mais correta, porque o problema tinha de ficar resolvido. Não queria voltar a passar por uma cirurgia daqui a dias, meses ou um ano”. Não foi necessário!
Mas ao contrário dos testemunhos anteriores, os médicos não lhe equilibraram as duas mamas. Nem lhe foi sugerido. E Olga Braz Pereira nem pensou nisso.
“Não é fácil aceitar o diagnóstico de uma doença oncológica. Ficamos sem chão e o céu desaba em nós“, conta-nos Olga emocionada. E admite que o cancro ainda é uma palavra com muito estigma. “Traz consigo interrogações, medo”.
Mas a professora não foi negativa. Respirou fundo e pensou “vamos em frente”. E foi. Olga preferiu ser ela própria a comunicar a doença aos seus filhos e à sua mãe.
“Tive todo o apoio. Necessitamos muito de apoio, mas quem nos rodeia também precisa de nos sentir fortes, ainda que não consigamos ser fortes todos os dias. Necessitamos muitas vezes de estar sós. De chorar para lavar alma”, diz.
E acrescenta que “após uma doença oncológica, há um emergir, um despertar do nosso eu que estava encoberto. Começamos a dar mais atenção às pequenas coisas, ao dia a dia, desvalorizamos pequenos problemas. Depois, passa. Eu faço a minha vida normal. E sinto-me muito bem, abraçando cada dia”.
Hoje, depois de também ter passado por um linfoma, a professora “abraça cada dia”, disponível para quem precisa. Cada vez mais envolvida no voluntariado, é coordenadora regional da Guarda e coordenadora nacional do Movimento Vencer e Viver.
Olga não quis terminar este depoimento sem deixar uma palavra de ânimo às mulheres que estejam a passar pelo cancro da mama. “Apesar da adversidade do momento, nunca deixem de esculpir o momento e a vida com esperança”.
Rita Maria Sebastião, 53 anos (diagnóstico aos 52)
O caso de Rita Sebastião foi muito rápido. De tal forma que os médicos não pensaram que pudesse ter contraído uma doença tão grave.
As dores de Rita na mama direita eram insuportáveis. Foi à médica, mas esta relativizou, dizendo que era do esforço. Isto porque Rita é doméstica e na época ainda cuidava de duas idosas. Mas as dores não largavam e, para mais, sofre de lúpus.
“Comecei a ficar pior até que, um dia, voltei ao hospital e disse que queria fazer exames de urgência. Não deixaram. Teria de fazer consulta com a médica. O pior é que só teria vaga para exames daqui a três meses”.
Rita acabou por conseguir contactar um médico e explicou-lhe que não estava a aguentar a espera. “Parecia que tinha uma escavadora no peito. Inchava imenso e, por vezes, ficava uma bola. Outras, desinchava”. O médico achou que a paciente tinha apenas uma bola de sangue no peito e mandou-a pôr pomada, mas mesmo assim prescreveu-lhe o exame.
Com a requisição, Rita antecipou os seus exames. “Quando entrei para fazer a mamografia, não conseguia. Estava com dores horríveis, a mama estava inchada. Então pararam e passaram-me logo para a ecografia. Na eco, a médica já achou que era uma coisa má. Cancro fulminante!”
A surpresa dos médicos justifica-se no sentido em que Rita tinha feito todos os exames de rastreio dois meses antes de começar a queixar-se com dores e os resultados tinham sido negativos.
Nada faria prever que estaria com cancro da mama. Esta situação levou a que Rita só conseguisse fazer os exames que deram o diagnóstico de cancro dez meses depois do tal rastreio. E oito meses depois de começar a queixar-se com dores.
“Não deitei nem uma lágrima. As assistentes ficaram espantadas com a minha reação. Apenas disse a Deus, ‘se for para ir deste mundo, leva-me. Se não, dá-me forças’”. E teve.
Quando soube da notícia, ficou calma e trabalhou sempre. “A única maneira de me pôr em pé era trabalhar, para me animar. Até porque vivo sozinha. Fiz quimioterapia sempre a trabalhar“, conta.
O cancro de Rita já se estava a ramificar, por isso teve de fazer cinco sessões de quimio (as piores) e depois outras doze, todos os dias, durante seis meses. Perdeu o cabelo, mas também não chorou.
Na operação, só lhe retiraram o nódulo. E, como tinha o peito grande, o médico tirou parte da mama saudável e fez de modo a que as duas ficassem iguais.
Hoje Rita está bem. Trabalha menos, mudou a alimentação (por vontade sua) e mantém-se positiva, acima de tudo!
Depois de ler estes testemunhos, conheça os fatores de risco do cancro da mama e os sinais aos quais deve estar atenta.