Saúde

É assim que a saúde vai ser no futuro: mais digital e rápida

Os cientistas preveem grandes mudanças para daqui a 50 anos na área da saúde, mas já há muita a coisa a acontecer no presente. Saiba quais são os benefícios de aliar o digital à medicina.

Untitled-7 Untitled-7 Untitled-7
É assim que a saúde vai ser no futuro: mais digital e rápida É assim que a saúde vai ser no futuro: mais digital e rápida
© Getty Images
Vanessa Pina Santos
Escrito por
Fev. 12, 2020

Por enquanto, ainda pesquisamos os nossos sintomas numa janela do Google à procura de uma resposta imediata para os nossos problemas de saúde. Contudo, num futuro não tão longínquo, a inteligência artificial ligada à saúde estará incorporada em nossa casa e até no nosso corpo.

Na série documental realizada pela RTP1 2077 – 10 Segundos para o futuro, o físico e teórico Michio Kaku afirma que no futuro a nossa casa de banho terá um chip que analisará os nossos fluidos corporais e possíveis proteínas cancerígenas do nosso corpo.

Os benefícios

Tal como em outras áreas, o universo digital traz inúmeros benefícios para a saúde. O aceleramento dos processos como, por exemplo, a interpretação de relatórios médicos – que poderão ser feitos por máquinas a um ritmo muito mais rápido e com maior precisão – é uma dessas vantagens.

Além disso, a saúde digital vai permitir que a relação entre o médico e o doente fique mais próxima, algo que parece “paradoxal, mas a verdade é que a tecnologia vai permitir humanizar os cuidados de saúde, porque podemos ter uma resposta individualizada para cada pessoa e cada caso”, explica-nos José Mendes Ribeiro, economista e autor do livro Saúde Digital – Um Sistema de Saúde Para o Século XXI (Fundação Francisco Manuel dos Santos).

A tecnologia facilita-nos esta interação e, ao mesmo tempo, cria todos os meios para que os médicos se dediquem àquilo que é a sua função primordial – ouvir e aconselhar o doente – José Mendes Ribeiro, economista

A inovação da saúde através do digital terá impacto em duas áreas: na qualidade e no acesso dos tratamentos. No futuro, “teremos de tentar perceber se conseguimos fazer com que certos tratamentos fiquem acessíveis a um maior número de doentes através de ferramentas digitais”, diz Vítor Tedim Cruz, diretor de serviço de Neurologia do Hospital Pedro Hispano Unidade Local de Saúde de Matosinhos e investigador doutorado do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.

“Também poderão existir tratamentos que não existiam antes de aparecerem as ferramentas digitais”, acrescenta.

Outro dos benefícios é a capacidade de resposta que no mundo do digital passa a ser mais imediata. Por exemplo, quando estamos doentes, podemos recorrer à telemedicina em vez de irmos para uma urgência.

“A tecnologia facilita-nos esta interação e, ao mesmo tempo, cria todos os meios para que os médicos se dediquem àquilo que é a sua função primordial – ouvir e aconselhar o doente”, explica José Mendes Ribeiro.

Os médicos têm de se preparar para ter mais tempo para estar com os doentes – Vítor Tedim Cruz, diretor de serviço de Neurologia do Hospital Pedro Hispano

Um apoio complementar

Numa era de inteligência artificial, qual será o papel do médico? Passará muito menos tempo com o doente? As máquinas ocuparão o seu lugar? “Quando penso nos meus doentes de 2002, vejo que são muito diferentes dos de 2019. Antes, aceitavam o que o médico dizia de forma fatalista e passiva”, afirma Vítor Tedim Cruz.

Atualmente, têm mais acesso à informação e mais questões para colocar. Por esse motivo, “os médicos têm de se preparar para ter mais tempo para estar com os doentes”, esclarece o investigador.

Vítor Tedim Cruz alerta para o facto de poder ocorrer um desencontro entre o médico e o doente, porque o primeiro poderá sentir-se muito ocupado, por não ter acautelado tempo para a revolução digital, e o segundo, muito ansioso, porque não consegue obter a resposta de imediato.

“O grau de exigência dos doentes vai focar-se no processo de tomada decisão. Os doentes vão querer discutir muito mais sobre quais são os efeitos colaterais e os potenciais benefícios de uma terapêutica”, acrescenta o especialista.

Os gadgets

Atualmente, já existe uma quantidade significativa de gadgets, como os dispositivos de pulso, que, além de recolherem informação sobre a atividade física, também conseguem monitorizar a frequência cardíaca e transmitir a informação de um eletrocardiograma.

“Esta modalidade, que tende a tornar-se acessível, pode trazer, num futuro próximo, uma dinâmica facilitadora de envio de informação para a equipa de saúde que segue os doentes, tornando os dados rapidamente acessíveis”, diz-nos o professor Mário Martins Oliveira, coordenador de Cardiologia no Hospital CUF Infante Santo e cardiologista no Hospital CUF Porto.

Contudo, a utilização destes gadgets pode ter alguns riscos, nomeadamente, “o da excessiva utilização pelo controlo e vigilância do ritmo e frequência cardíacos. Pode até contribuir para o aumento de sintomatologia atípica”, afirma o professor.

Um centro de medicina digital

Inaugurado em abril deste ano, o Centro de Medicina Digital p5, da Escola de Medicina da Universidade do Minho, presta cuidados de saúde através de uma plataforma e de várias aplicações que estão direcionadas para doenças crónicas, como a diabetes tipo 2 e a hipertensão.

“Temos a capacidade de chegar a muito mais pessoas e de servir melhor o sistema de saúde, porque podemos complementá-lo em áreas onde apresenta um perfil menos forte”, diz-nos Nuno Sousa, presidente da Escola de Medicina da Universidade do Minho.

Para as doenças crónicas existe um plano de intervenção em que os profissionais de saúde funcionam um pouco como os coaches pessoais do doente (…) – Nuno Sousa, presidente da Escola de Medicina da Universidade do Minho

Este centro vem adicionar à medicina p4 o ‘quinto p’, que significa proximidade das pessoas. Através de um smartphone, tablet ou computador, consegue- se aceder à plataforma do centro e ter acesso ao avaliador de sintomas, onde poderá registar os sinais que estão relacionados com a sua condição de saúde.

A boa notícia é que já está acessível a qualquer pessoa. Dependendo dos sintomas, irão aparecer novas perguntas no sentido de conseguir melhorar o seu diagnóstico e tratamento.

No final, será feito um encaminhamento desta informação para os profissionais do centro que, após uma análise, entrarão em contacto com o doente para ele saber qual o tratamento a seguir.

Além desta modalidade, “para as doenças crónicas existe um plano de intervenção em que os profissionais de saúde funcionam um pouco como os coaches pessoais do doente, ajudando-o a cumprir o esquema de intervenção terapêutica”, explica-nos Nuno Sousa.

Tratamento à distância

A Neuroinova é uma empresa que disponibiliza novos instrumentos e métodos de intervenção cognitiva através de várias plataformas digitais. A Cogweb é uma delas e “permite a implementação de programas intensivos de treino cognitivo computorizado e supervisionado presencialmente ou remotamente por neuropsicólogos experientes”, afirma o fundador da empresa, Vítor Tedim Cruz.

Esta plataforma possibilita que pessoas com doenças neurológicas como o Alzheimer ou com doenças psiquiátricas como a esquizofrenia e a depressão major consigam fazer, a partir de casa, testes e exercícios que melhoram a sua condição cognitiva.

“Qualquer doente com indicação para realizar tarefas de treino cognitivo, onde quer que se encontre, consegue contactar a linha Cogweb (Tel.: 911 194 909) e iniciar o seu processo de avaliação neuropsicológica e programa de treino cognitivo específico e personalizado”, explica Vítor Tedim Cruz.

A versão original deste artigo foi publicada na revista Saber Viver nº 235, janeiro de 2020.

Últimos