Por enquanto, ainda pesquisamos os nossos sintomas numa janela do Google à procura de uma resposta imediata para os nossos problemas de saúde. Contudo, num futuro não tão longínquo, a inteligência artificial ligada à saúde estará incorporada em nossa casa e até no nosso corpo.
Na série documental realizada pela RTP1 2077 – 10 Segundos para o futuro, o físico e teórico Michio Kaku afirma que no futuro a nossa casa de banho terá um chip que analisará os nossos fluidos corporais e possíveis proteínas cancerígenas do nosso corpo.
Os benefícios
Tal como em outras áreas, o universo digital traz inúmeros benefícios para a saúde. O aceleramento dos processos como, por exemplo, a interpretação de relatórios médicos – que poderão ser feitos por máquinas a um ritmo muito mais rápido e com maior precisão – é uma dessas vantagens.
Além disso, a saúde digital vai permitir que a relação entre o médico e o doente fique mais próxima, algo que parece “paradoxal, mas a verdade é que a tecnologia vai permitir humanizar os cuidados de saúde, porque podemos ter uma resposta individualizada para cada pessoa e cada caso”, explica-nos José Mendes Ribeiro, economista e autor do livro Saúde Digital – Um Sistema de Saúde Para o Século XXI (Fundação Francisco Manuel dos Santos).
A inovação da saúde através do digital terá impacto em duas áreas: na qualidade e no acesso dos tratamentos. No futuro, “teremos de tentar perceber se conseguimos fazer com que certos tratamentos fiquem acessíveis a um maior número de doentes através de ferramentas digitais”, diz Vítor Tedim Cruz, diretor de serviço de Neurologia do Hospital Pedro Hispano Unidade Local de Saúde de Matosinhos e investigador doutorado do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.
“Também poderão existir tratamentos que não existiam antes de aparecerem as ferramentas digitais”, acrescenta.
Outro dos benefícios é a capacidade de resposta que no mundo do digital passa a ser mais imediata. Por exemplo, quando estamos doentes, podemos recorrer à telemedicina em vez de irmos para uma urgência.
“A tecnologia facilita-nos esta interação e, ao mesmo tempo, cria todos os meios para que os médicos se dediquem àquilo que é a sua função primordial – ouvir e aconselhar o doente”, explica José Mendes Ribeiro.
Um apoio complementar
Numa era de inteligência artificial, qual será o papel do médico? Passará muito menos tempo com o doente? As máquinas ocuparão o seu lugar? “Quando penso nos meus doentes de 2002, vejo que são muito diferentes dos de 2019. Antes, aceitavam o que o médico dizia de forma fatalista e passiva”, afirma Vítor Tedim Cruz.
Atualmente, têm mais acesso à informação e mais questões para colocar. Por esse motivo, “os médicos têm de se preparar para ter mais tempo para estar com os doentes”, esclarece o investigador.
Vítor Tedim Cruz alerta para o facto de poder ocorrer um desencontro entre o médico e o doente, porque o primeiro poderá sentir-se muito ocupado, por não ter acautelado tempo para a revolução digital, e o segundo, muito ansioso, porque não consegue obter a resposta de imediato.
“O grau de exigência dos doentes vai focar-se no processo de tomada decisão. Os doentes vão querer discutir muito mais sobre quais são os efeitos colaterais e os potenciais benefícios de uma terapêutica”, acrescenta o especialista.
Os gadgets
Atualmente, já existe uma quantidade significativa de gadgets, como os dispositivos de pulso, que, além de recolherem informação sobre a atividade física, também conseguem monitorizar a frequência cardíaca e transmitir a informação de um eletrocardiograma.
“Esta modalidade, que tende a tornar-se acessível, pode trazer, num futuro próximo, uma dinâmica facilitadora de envio de informação para a equipa de saúde que segue os doentes, tornando os dados rapidamente acessíveis”, diz-nos o professor Mário Martins Oliveira, coordenador de Cardiologia no Hospital CUF Infante Santo e cardiologista no Hospital CUF Porto.
Contudo, a utilização destes gadgets pode ter alguns riscos, nomeadamente, “o da excessiva utilização pelo controlo e vigilância do ritmo e frequência cardíacos. Pode até contribuir para o aumento de sintomatologia atípica”, afirma o professor.
Um centro de medicina digital
Inaugurado em abril deste ano, o Centro de Medicina Digital p5, da Escola de Medicina da Universidade do Minho, presta cuidados de saúde através de uma plataforma e de várias aplicações que estão direcionadas para doenças crónicas, como a diabetes tipo 2 e a hipertensão.
“Temos a capacidade de chegar a muito mais pessoas e de servir melhor o sistema de saúde, porque podemos complementá-lo em áreas onde apresenta um perfil menos forte”, diz-nos Nuno Sousa, presidente da Escola de Medicina da Universidade do Minho.
Este centro vem adicionar à medicina p4 o ‘quinto p’, que significa proximidade das pessoas. Através de um smartphone, tablet ou computador, consegue- se aceder à plataforma do centro e ter acesso ao avaliador de sintomas, onde poderá registar os sinais que estão relacionados com a sua condição de saúde.
A boa notícia é que já está acessível a qualquer pessoa. Dependendo dos sintomas, irão aparecer novas perguntas no sentido de conseguir melhorar o seu diagnóstico e tratamento.
No final, será feito um encaminhamento desta informação para os profissionais do centro que, após uma análise, entrarão em contacto com o doente para ele saber qual o tratamento a seguir.
Além desta modalidade, “para as doenças crónicas existe um plano de intervenção em que os profissionais de saúde funcionam um pouco como os coaches pessoais do doente, ajudando-o a cumprir o esquema de intervenção terapêutica”, explica-nos Nuno Sousa.
Tratamento à distância
A Neuroinova é uma empresa que disponibiliza novos instrumentos e métodos de intervenção cognitiva através de várias plataformas digitais. A Cogweb é uma delas e “permite a implementação de programas intensivos de treino cognitivo computorizado e supervisionado presencialmente ou remotamente por neuropsicólogos experientes”, afirma o fundador da empresa, Vítor Tedim Cruz.
Esta plataforma possibilita que pessoas com doenças neurológicas como o Alzheimer ou com doenças psiquiátricas como a esquizofrenia e a depressão major consigam fazer, a partir de casa, testes e exercícios que melhoram a sua condição cognitiva.
“Qualquer doente com indicação para realizar tarefas de treino cognitivo, onde quer que se encontre, consegue contactar a linha Cogweb (Tel.: 911 194 909) e iniciar o seu processo de avaliação neuropsicológica e programa de treino cognitivo específico e personalizado”, explica Vítor Tedim Cruz.