Quem iria supor que uma pequena glândula – tem entre 15 e 25 gramas, podemos denomina-la assim – em forma de borboleta poderia causar tantos estragos, quando desregulada?
As mulheres, sabe-se, são as mais afetadas, mas as doenças da tiroide têm as suas vicissitudes. É que os seus sinais e sintomas podem ser inespecíficos e de aparecimento insidioso, isto é, são muitas vezes silenciosas.
Ocorre, por exemplo, que muitas pessoas que seguem uma prática regular de exercício físico e uma alimentação saudável, continuam a sentir-se cansadas e com oscilações de peso inexplicáveis.
Dificilmente associamos este encadeamento a alguma patologia, mas saiba que pode estar associado a um problema na tiroide. De facto, ainda existe muito desconhecimento e desinformação sobre o impacto dos distúrbios da tiroide no controlo do peso corporal e não só.
Para nos ajudar a perceber a sua função no corpo humano, os sinais de alerta e as principais doenças associadas, mas também uma possível prevenção e a forma de tratamento mais adequada, falámos com Maria João Oliveira, endocrinologista e Membro do Conselho Consultivo/Científico da ADTI – Associação de Doenças da Tiroide.
Uma glândula endócrina e a sua ocupação
“A tiroide é uma glândula de pequena dimensão, tem aproximadamente 5 cm de diâmetro e localiza-se na base do pescoço, na sua face anterior. Tem a forma de uma borboleta, com cada lobo – asa da borboleta – em cada um dos lados da traqueia.” Maria João Oliveira começa por nos situar.
Mas não a julguemos pela sua presença quase inócua. A sua função é tremendamente importante “produz, armazena e liberta duas hormonas para o sangue – daí o termo secreção endócrina – a T3, a triiodotironina e a T4, tiroxina”. Estas atuam ao nível de quase todas as células do organismo e auxiliam-no:
• No controlo do metabolismo;
• Na utilização de energia e estabilização da temperatura corporal;
• Na regulação dos estados de humor;
• No normal funcionamento do cérebro, músculos, coração e todos os outros órgãos;
• No crescimento e desenvolvimento intelectual nas crianças;
As principais doenças que lhe assistem e como reconhecê-las
Quando procurámos saber sobre as patologias associadas à tiroide, eis o que já sabíamos: as causas exatas de algumas destas doenças ainda são desconhecidas, pelo que podem estar relacionadas com fatores:
• Genéticos (familiares);
• Geográficos (ocorrem mais em zonas interiores, afastadas do mar);
• Dietéticos (consumo insuficiente ou excessivo de iodo, pelo sal na alimentação);
• Outros, como a presença de um nódulo, radioterapia ou a toma de alguns medicamentos.
Estima-se que entre 500 mil a um milhão de portugueses, sobretudo mulheres (80%) a partir dos 35 anos, sofra de alguma forma de doença da tiroide.
“Se a produção de hormonas se tornar insuficiente, o metabolismo desacelera e tem-se o hipotiroidismo, se pelo contrário, houver excesso de produção de hormonas, o metabolismo acelera e tem-se o hipertiroidismo” explica-nos a endocrinologista.
Hipotiroidismo
“O hipotiroidismo é cerca de 10 vezes mais frequente que o hipertiroidismo. A doença autoimune da tiroide – Tiroidite de Hashimoto ou Tiroidite autoimune crónica – é a causa mais frequente de hipotiroidismo em Portugal, assim como em outros países onde há um aporte razoável de iodo” explica Maria João Oliveira. Assim, os principais sinais e sintomas são:
• Cansaço;
• Maior sensibilidade ao frio;
• Queda de cabelo:
• Pele seca;
• Aumento de peso;
• Fraqueza muscular;
• Edemas;
• Depressão;
• Obstipação;
• Irregularidades menstruais;
• O volume da tiroide pode estar aumentado (bócio) ou não.
Hipertiroidismo
Se, por outro lado, a tiroide está demasiado ativa, então caracteriza-se por uma produção excessiva de hormonas tirodeas, pelo que as funções orgânicas são aceleradas. Os sinais e sintomas refletem este elevado desgaste de energia:
• Perda de peso;
• Aumento da atividade física e do apetite;
• Insónias;
• Cansaço e fraqueza;
• Hipertensão;
• Palpitações;
• Sudorese (transpiração excessiva);
• Tremores;
• Aumento do número de dejeções diárias.
Nódulos
A formação de nódulos pode ser uma outra vertente das doenças da tiroide. Normalmente, manifestam-se através de uma saliência indolor no pescoço. Nem sempre têm significado clínico, mas devem ser sempre vigiados, até porque o cancro da tiroide pode começar assim mesmo, com um nódulo. Desta forma, pode também ocorrer como sinais e sintomas:
• Rouquidão;
• Endurecimento dos gânglios;
• Aumento do tamanho destes no pescoço.
Para todos os casos, o importante é estar sempre alerta. Se dois ou mais sintomas destes persistirem, principalmente no sexo feminino, deve-se consultar um médico assistente.
Situações especiais e consequências na vida
Depois de perceber a função da tiroide, as principais doenças associadas, bem como os sinais e sintomas a ter em atenção, tentámos compreender se existiriam fatores agravantes ou pessoas mais em risco.
“Há algumas circunstâncias nas quais é importante que o médico requisite uma análise à função da tiroide, como: na mulher que pretende engravidar ou após o início da menopausa; no doente com diabetes e nas pessoas submetidas a radiação da cabeça ou pescoço ou que façam tratamento com determinados fármacos” mas também, e acrescenta “no caso de alguns síndromes genéticos como a trissomia 21 ou o síndrome de Turner; na criança que não se desenvolve e em caso de demência ou alterações psiquiátricas”.
Em relação às consequências diárias da população aqui afetada, Maria João Oliveira refere que “o funcionamento da tiroide é essencial para a vida”. Por exemplo, no caso do hipotiroidismo (doença mais frequente na tiroide), apesar de não haver cura e o tratamento ser para a vida toda “praticamente todos os pacientes conseguem o seu controlo por completo, pelo restauro dos níveis hormonais no organismo, que começa então a funcionar de uma forma normal”.
O seu reconhecimento, tratamento, mas também prevenção
O diagnóstico das doenças da tiroide é feito não só pelo historial clínico, mas por um conjunto de exames, sendo os mais comuns as análises ao sangue (quantificação da presença de hormonas tiroideas) e a ecografia à tiroide (para deteção das suas dimensões e características). Por outro lado, para se perceber se um nódulo é benigno ou maligno realiza-se uma citologia, neste caso, uma biopsia.
Já o tratamento, poderá passar por uma medicação que consiste na toma diária de hormonas, geralmente um procedimento para a vida, embora as doses sejam avaliadas e ajustadas. Isto para a situação do hipotiroidismo. Para o hipertiroidismo, adequa-se a medicação com base em fármacos que controlem a produção hormonal.
No caso dos nódulos, se houver dúvida quanto à natureza destes, pode ser recomendada a remoção. O mesmo ocorre se estes forem malignos. No geral, o prognóstico é bom para a maioria dos casos, desde que não se ignorem os sinais, o que nos leva à última questão.
É possível prevenir? “Não há uma forma específica de prevenção” pelo que “a melhor prevenção é mesmo o diagnóstico e tratamento precoce sempre que surjam sinais ou sintomas que possam sugerir uma doença da tiroide, pelo que o médico deve estar atento e requisitar uma análise”.
Desta forma, ficamos com a ideia de Maria João Oliveira de que a “glândula tiroideia tem despertado um grande interesse pela sua importância fundamental na saúde e bem-estar de todos” algo que pretendemos enfatizar na sociedade, assim como com este artigo.