“O meu nome é Catarina, 26 anos, e tenho endometriose e adenomiose”
O meu nome é Catarina, tenho 26 anos e tenho endometriose e adenomiose. Tratam-se de doenças crónicas que, para além de terem nomes muito estranhos, podem manifestar-se através de sintomas tão debilitantes quanto normalizados.
Foi quando menstruei pela segunda vez na minha vida que senti as primeiras dores menstruais. Sentia que o meu corpo se desfazia por dentro, quase como se tivesse lâminas de liquidificadora a percorrerem-me desde os rins até à parte de cima das coxas.
Creio que, de início, queixava-me ativamente do sofrimento que sentia. Mas, à semelhança de tantas outras mulheres, comecei a “aprender” que:
• esta tortura faz parte de ser-se mulher;
• algumas têm menos sorte que outras no grau de dor;
• há muita gente que sente estas dores e não é o fim do mundo.
Ao longo do tempo percebi que isto era de facto normal e, para poder ter alguma qualidade de vida de cada vez que menstruava, comecei a tomar a pílula.
Até que, aos 25 anos, quando optei por deixar a pílula, descobri que tinha estado enganada o tempo todo: as minhas cólicas eram, na verdade, um sintoma, que se fazia agora acompanhar de muitos outros que nunca tinha sentido na vida.
O que é a endometriose?
A endometriose é uma doença crónica, benigna, que afecta 1 em cada 10 pessoas com sistema reprodutor feminino. É extremamente complexa por variados motivos: ninguém sabe porque ocorre, não existe ainda uma cura ou tratamento e pode ser muito difícil de diagnosticar.
Mas sabemos, pelo menos, em que consiste: todos os meses, durante a ovulação, o endométrio, que é uma camada que reveste o interior do útero, espessa. Se não houver fecundação, o endométrio descama no período menstrual.
Quando há crescimento de tecido semelhante ao do endométrio noutras partes do corpo, nomeadamente na zona pélvica, verifica-se a presença de endometriose. Isto significa que, para quem tem esta doença, este processo (espessamento-descamação) acontece não só no útero, mas também noutras partes do corpo (dentro da musculatura do útero no caso da adenomiose), podendo ser extremamente doloroso.
Embora em raros casos seja assintomática, a doença pode manifestar-se através de dezenas de sintomas, dependendo da pessoa.
Os sintomas mais comuns são as cólicas menstruais (sobretudo se forem piorando ao longo dos ciclos e apenas acalmarem com a toma de analgésico), fluxos muito abundantes, dor durante o ato sexual, alterações intestinais durante a menstruação (obstipação ou diarreia), sangramento anal, presença de sangue na urina, infecções urinárias recorrentes, dor lombar, dor pélvica crónica e/ou dor durante a ovulação.
Como é viver com endometriose?
Fui diagnosticada há um ano e, desde então, a minha vida mudou por completo.
Inicialmente, entrei em pânico – é que não é muito agradável receber uma sentença destas, principalmente se temos 25 anos e achamos que ainda temos os cartuchos todos por queimar. Não. Temos de aceitar que temos uma doença crónica e, pior ainda, que a medicina pouco pode fazer por nós quanto a ela.
Existe também um risco de infertilidade associado à doença e o meu maior sonho desde pequenina sempre foi ser mãe. Saí da clínica de lágrimas nos olhos.
Ao longo deste ano, tive de desaprender muita coisa e acho que isso foi o que mais me custou. Senti-me sozinha. Como é que tanta gente se queixa de períodos horrendos achando que isso é normal? Senti necessidade de abanar os ombros à sociedade e alertar que as dores menstruais não devem ser normalizadas porque podem ser sintoma de endometriose ou adenomiose.
Então comecei a trilhar um caminho de consciencialização. Comecei a estudar muito e criei O Meu Útero. Através do blogue e das redes sociais, transmito informação relativa à doença e a alternativas de tratamento de sintomas. Porque, apesar de não ser possível tratar a doença, existem várias formas de contornar os sintomas, como seja através da alimentação e da adopção de um estilo de vida saudável.
Mudei drasticamente a minha alimentação, o que nem sempre é fácil. Às vezes gostava de poder sentir-me “normal”. Quando os sintomas atacam, tenho de cancelar compromissos e por vezes tenho de faltar ao trabalho.
Felizmente, no meu local de trabalho existe muita compreensão nesse aspecto, mas sei que não é uma realidade para todas as pessoas que sofrem desta doença – muitas vezes o emprego e até relações são colocados em causa.
Rejeitei a toma da pílula e, surpreendentemente, as alterações que fiz ao meu estilo de vida fizeram regredir a maior parte dos meus sintomas. A doença continua lá, eu sei, mas também sei que já está mais que na altura de nos levantarmos e de retaliarmos. Afinal, somos 177 milhões por todo o mundo.
Catarina Maia é a autora do blogue O Meu Útero. Estudou Comunicação Social e Cultural com a vertente de Jornalismo, com mestrado em Comunicação e Liderança. Agora, trabalha com Marketing Digital, sobretudo na criação de conteúdos digitais.
Sofre ou conhece alguém que sofra desta doença? Envie-nos o seu testemunho. Na verdade, as dores menstruais são mesmo comparáveis às de um ataque cardíaco.