Crónica. Por que é preciso falar com as crianças sobre sexualidade?
Aprenda a Saber Viver sem tabus. Todos os meses, a sexóloga Vânia Beliz promete falar abertamente sobre sexualidade, com o propósito de desmistificar questões associadas ao sexo e à intimidade, e para a fazer pensar e refletir sobre temas que podem, mesmo, mudar a sua vida.
Quando falamos em educação sexual, as imagens que surgem na nossa imaginação são quase sempre associadas a sexo. Educar para a sexualidade ultrapassa os órgãos genitais e as relações sexuais, por isso, o argumento de que não se pode falar deste tema com as crianças é inválido.
Inúmeros estudos referem a importância de conversar desde cedo com as crianças, sempre de acordo com a sua idade e compreensão.
Assim, a criança começa a relacionar-se com o corpo desde o nascimento e a curiosidade faz com que observe e queira explorar as suas diferenças.
Os miúdos tocam o seu corpo e procuram ver o dos outros desde cedo, mas esta curiosidade não tem qualquer conotação com o comportamento adulto. O corpo da criança responde aos estímulos e esta resposta é fisiológica. O bem-estar que sentem quando tocam o seu corpo não pode ser visto, de forma alguma, como as nossas satisfações adultas.
As nossas crianças estão atualmente mergulhadas numa sociedade altamente erotizada e sexualizada, por isso, a família tem de ficar atenta e desmontar, desde cedo, conceitos distorcidos que lhes chegam através das séries, música, jogos, redes sociais, entre outros. Já não podemos baixar a guarda.
A ausência destas abordagens coloca-as em risco e precipita que se lancem em procuras perigosas pelas respostas.
Quando, na idade pré-escolar, as crianças querem saber da sua origem e fazem perguntas que tantas vezes nos deixam em silêncio é importante perceber de onde surge a questão e qual o conhecimento que a criança tem daquele tema. Desta forma o terreno fica mais facilitado para a nossa resposta.
A resposta é um direito e a conversa pode orientar-nos sobre o conhecimento que as crianças têm, permitindo às famílias corrigir algum conceito distorcido.
A educação para a sexualidade não tem como objetivos exclusivos prevenir gravidezes e infeções. Isso foi o que fizeram connosco, mas terá mesmo resultado? Hoje em dia, quantos homens usam eficazmente um preservativo? Quantas mulheres falham a toma da pílula ou são conhecedoras do seu corpo?
A educação sexual deve ser reflexiva e empoderadora, protegendo as crianças de temas graves como, por exemplo, a violência sexual e de género. A educação para a sexualidade é um direito e cada dúvida é uma oportunidade.
Mesmo que a criança não pergunte nada de forma direta, é importante estar atenta às suas dúvidas e responder sem medo, de forma a que a criança tenha a resposta adequada às questões que possam surgir.
É importante reconhecer que tudo à nossa volta envia mensagens sobre o que é a sexualidade. Porém, cabe a quem educa, nomeadamente às famílias e escola, mediar e decifrar estas mensagens tantas vezes distorcidas e que em nada contribuem para a saúde e felicidade das nossas crianças e jovens.
Vânia Beliz licenciou-se em Psicóloga Clinica e da Saúde. Mestre em Sexologia e doutoranda em Estudos da Criança na especialidade de Saúde Infantil, na Universidade do Minho, participa em projetos no âmbito dos Programas de Educação para a Saúde (PES) e o Projeto de Educação Sexual “A viagem de Peludim”, para crianças. É autora do livro Ponto Quê?, sobre a sexualidade feminina, e de Chamar As Coisas Pelos Nomes, dirigido às famílias sobre como e quando falar sobre sexualidade.