“Ouvi dizer que já não se faz sexo depois dos 40 anos”, disse Miley Cyrus, a cantora de Wrecking Ball, no programa matutino The Today Show da NBC. De facto, embora haja cada vez mais informação disponível sobre a sexualidade ao longo da vida, parece ainda subsistir nas sociedades ocidentais uma espécie de estigma associado à expressão sexual na meia-idade: que deve diminuir de intensidade ou até desaparecer.
Enquanto os homens gozam de comparações ao vinho, que vai ficando melhor com o passar do tempo, as mulheres são associadas a um poço que vai secando. Esta realidade é confirmada por três psicólogas, Cláudia Almeida, M. Joana Almeida e Telma Pinto Loureiro, psicóloga clínica e especialista na área do amor e dos relacionamentos no gabinete Sentimental Mood, que acrescenta que “o direito à igualdade sexual ainda está não plenamente adquirido”. Para sabermos o que é que deve e pode ser feito para alterar a mentalidade vigente, reunimos os conselhos de especialistas e os testemunhos de leitoras da Saber Viver.
Desmascarar preconceitos
No sentido de evitar situações embaraçosas, “a informação sobre sexualidade deve ser abordada desde cedo”, avança Cláudia Almeida, psicóloga clínica especializada em Sexologia Clínica da Oficina de Psicologia. E não apenas os pontos positivos ou superficiais.
O sexo é uma excelente fonte de prazer, estimula a intimidade entre duas pessoas e é um ótimo sonífero e um bom libertador de stresse. A literatura, o cinema, a televisão e a música exacerbam ao ponto de deturpar a realidade. Mas apenas no que toca às faixas etárias dos 20 e 30 anos, porque aos 40 as representações da sexualidade feminina são escassas.
O auge da vida sexual
Aos 40 anos a mulher já experimentou e praticou o suficiente para não estar preocupada com o seu desempenho sexual. Nem com o do seu parceiro.
“Percebemos que quando estamos na cama com alguém é muito mais do que só dois corpos”, declara Cristina Santos, 44 anos. Nesta fase da vida, a mulher sabe como obter prazer, e atingir o orgasmo deixa de ser o objetivo principal.
“Tudo parece mais ‘vivo’: o toque, as sensações, a entrega, o prazer, a forma como ‘estamos’”, explica Cristina Santos. Por outro lado, “os orgasmos das mulheres têm um carácter aprendido, precisam de experiência e treino”, adianta M. Joana Almeida, psicóloga clínica e sexóloga na Clínica Egomed.
As mulheres sentem-se mais à vontade para explorar e os jogos de sedução, as fantasias e outros estímulos adquirem um novo interesse. Afinal, brincar também faz bem aos adultos. A atração física já não está acorrentada a conceitos de beleza inatingíveis, e a mulher descobre que é desejada por ser como é. “Sentimo-nos sexy mesmo se estivermos de pijama de flanela”, ilustra Leonor Correia, 45 anos.
Sexo depois dos 40: bom e recomenda-se
De acordo com a psicóloga Cláudia Almeida, estes testemunhos são apoiados por estudos como o que foi publicado no British Journal of Urology, que mostrou que as mulheres na meia-idade têm uma vida sexual melhor do que aos 20 e 30 anos. Esta investigação, que reuniu respostas de 587 norte-americanas, revela que as mulheres com mais de 40 anos são mais ativas sexualmente e atingem o orgasmo com maior frequência.
A forma como se experiencia o sexo é melhor nesta faixa etária porque “as mulheres encontram-se, muitas vezes, com uma situação financeira mais ou menos estável e aproveitam para cuidar da saúde e da aparência física”, esclarece Cláudia Almeida. A psicóloga acrescenta que praticar desporto ajuda à resposta sexual feminina (facto válido para todas as idades), pois “estimula a produção de hormonas, como a adrenalina, a testosterona, o estradiol, as endorfinas e a serotonina”.
Telma Pinto Loureiro vai mais longe, afirmando que o exercício físico “é também uma forma de afirmação feminina, que contrasta com a posição passiva que as mulheres tinham na vida e na cama até há alguns anos”. Efetivamente, parte do segredo por detrás da plena satisfação entre os lençóis é a qualidade de vida que se tem fora deles.
Sexo: fatores internos e externos
Os benefícios que a experiência e o conhecimento trazem com o passar dos anos são substanciais, e, assegura Telma Pinto Loureiro, “psicologicamente ocorrem mudanças significativas”.
Existem vários aspetos que contribuem para que a mulher desfrute mais do sexo, como a estabilidade emocional, a saúde física, a situação socioeconómica e a vida social. Ao nível fisiológico é importante não esquecer que é na meia-idade que normalmente a mulher atravessa a menopausa. Este é um período de tempo em que se verificam alterações dos níveis hormonais (principalmente redução do estrogénio) que, por sua vez, desestabilizam o organismo e o humor.
Conquanto seja um momento “de readaptação e de crescimento”, como comenta a psicóloga M. Joana Almeida, isso não significa que a vida sexual sofra qualquer alteração”. Uma pessoa que encare o envelhecimento com naturalidade “adapta-se às alterações mais facilmente”.
A importância da imagem
Celebrar o corpo que tem depois dos 40 anos é um dos principais obstáculos para haver total à-vontade no vale dos lençóis. “Quanto maior for a segurança e a confiança da mulher, maior será a sua entrega e maior será o prazer que irá retirar da relação”, Cláudia Almeida. Os padrões de beleza sempre foram altos para cada época, mas atualmente as mulheres já não competem com a biologia.
Imagens manipuladas atravessam-se à nossa frente em todo lado, criando expectativas inacessíveis no público feminino. “O Photoshop veio mostrar-nos corpos ideais e plastificados que levam muitas mulheres a aceitarem mal o seu corpo e a não terem orgulho nas mudanças que os anos lhes trazem”, avança M. Joana Almeida.
O medo de envelhecer preocupa sobretudo as mulheres, que vão investindo desde jovens em cosméticos destinados a adiarem os efeitos da idade. Contudo, ressalva Telma Pinto Loureiro, “existem muitas mulheres que encaram a maturidade e o avançar da idade como uma mais-valia e aprendem a tirar partido do que essa fase lhes pode dar”.
As noções de prazer e de intimidade sexual maturam com as pessoas, e a vergonha deixa de ser um inibidor. Cristina Santos, 44 anos, descreve que “deixamos de reparar na celulite, nas mamas descaídas, nas estrias, para passar a concentramo-nos na pele, nos sentidos, no outro, nas inúmeras formas de viver a sexualidade”.
Esta torna-se mais gratificante porque a mulher passa a gostar mais de si mesma, torna-se mais confiante, mas sabe que a comunicação continua a ser importante para manter a relação com o seu parceiro sexual. “O sexo depois dos 40 baseia-se no que o outro é e não no que se idealiza que ele seja”, acrescenta Leonor Areias, 45 anos. Já não há lugar a tabus, e a linha de diálogo tem de estar sempre aberta. “A sexualidade deve ser vivenciada satisfatoriamente independente da idade”, segundo a psicóloga Cláudia Almeida.
Assim, aproveite o facto de o desejo sexual existir ao longo da vida para ir praticando, se ainda está longe de entrar no grupo dos ‘entas’, e dar asas à imaginação, se já chegou aos 40.