“Os millennials, em Portugal, não estiveram sujeitos a uma escolaridade obrigatória que vai até aos 18 anos. Ao contrário desta nova geração, que apresenta níveis de qualificação potencialmente maiores em comparação com os mais velhos”, explica-nos a socióloga e a coordenadora do Observatório Permanente da Juventude, Maria Manuel Vieira à Saber Viver.
No entanto, esta é uma geração que enfrenta problemas de integração no mercado de trabalho. “Não quer dizer que seja uma geração com desemprego à entrada, mas a questão é que os empregos que encontram têm condições muito precárias”, diz-nos o sociólogo Bernardo Coelho. Por precariedade entende-se falsos recibos verdes e, principalmente, salários baixos.
A verdade é que nunca uma geração ganhou tão mal em Portugal. O rendimento salarial dos jovens no nosso País está muito abaixo da média da Europa. Este é um problema de geração e também de género, porque, embora as raparigas sejam mais qualificadas do que os rapazes, “enfrentam mais frequentemente esses cenários de precariedade no mercado de trabalho”, diz-nos o sociólogo.
Mas, nem tudo é mau. Uma das diferenças entre esta geração e a anterior é a forma de como ambas as gerações (millennials e geração Z) olham para as soluções. A nova geração encontra facilmente outras alternativas de trabalho, procurando por formas de autoemprego mais ligadas às novas tecnologias. Em comparação com os millennials, a geração Z é muito menos conformista.
“A geração Z quando não está satisfeita com o empregador não tem qualquer problema em sair e procurar outra alternativa que vá ao encontro das suas expectativas”, afirma Solange Soares, team leader da Hays.
Aliando isto às condições precárias do mercado de trabalho, esta é uma geração que tendencialmente, ao longo do seu percurso profissional, passa por diversas empresas. Contudo, não é este o seu desejo. O estudo já citado da Hays, concluiu que “a geração Z é, de todas as analisadas, a que quer trabalhar em menos empresas diferentes”.
Estar oito horas no escritório? Não, obrigado
Esta será a geração que provavelmente terá de trabalhar pelo menos até aos 70 anos. No entanto, a forma como olha para o trabalho está a mudar, uma tendência que já começou com os millennials. Falamos de flexibilidade de horários e da possibilidade de trabalhar a partir de casa. Cada vez mais, os jovens procuram o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. O trabalho deixou de ser um ‘lugar’ para passar a ser ‘algo’ com a mesma importância de outra coisa qualquer.
Com a geração Z, o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal (que pede flexibilidade de horários) tornou-se muito mais importante do que propriamente as recompensas salariais mais valorizadas pelos millennials, por exemplo. No estudo Talento Z, 72% dos jovens da geração Z diz valorizar o bom ambiente no trabalho.
Além disso, esta geração atribui uma maior importância a outro tipo de recompensas, como, por exemplo, seguro de saúde, formações, Internet para uso próprio e dias de férias extra.
Um novo desafio para as empresas
“Em Portugal, temos empresas muito antigas no mercado que, por vezes, têm as quatro gerações a trabalhar e, neste sentido, poderão existir alguns desafios”, diz-nos Solange Soares. Este desafio não é novo. Um estudo, realizado pela consultora PWC, sobre os millennials mostra que mais de metade dos jovens sente que os seus gestores nem sempre compreendem a forma como é usada a tecnologia no trabalho. Trinta e oito por cento afirma que os seniores não se relacionam com a geração mais jovem.
Como a geração Z não tem qualquer problema em se despedir e procurar outras alternativas, é necessário que as empresas criem mecanismos para incentivar estes jovens. Quando questionados sobre o tempo que consideram razoável para subirem de posição, os jovens da geração Z responderam entre um e dois anos, “enquanto que os baby boomers e a geração X estão dispostos a aguardar entre dois e cinco anos por uma promoção”, lê-se no estudo já mencionado da Hays.
Ainda no mesmo estudo refere-se que “para a geração Z, apenas as empresas multinacionais se mostram apelativas.” O que se revela num problema para Portugal, maioritariamente constituído por PME (Pequenas e Médias Empresas).
Neste sentido, a forma como as empresas avaliam o percurso profissional dos seus candidatos também vai ter de mudar. “Hoje em dia, as mudanças constantes de empresa não devem ser mal interpretadas como eram há uns tempos”, explica Solange Soares.
Os caminhos não são lineares
A precariedade do trabalho leva a que as perspetivas de futuro destes jovens sejam construídas com base na incerteza. Por isso, é que tendem a ter mais do que uma alternativa e também a seguir caminhos que são o oposto do tradicional.
“Se, há umas gerações, nós tínhamos os percursos de vida muito lineares, ou seja, estudávamos, começávamos a trabalhar, eventualmente casávamo-nos e tínhamos filhos e íamos progredindo nas nossas profissões, o mesmo já não acontece com a geração Z, porque a entrada no mercado de trabalho também não é tão linear”, explica Bernardo Coelho.
Por outro lado, também existem outras opções que não existiam há uns anos, o que faz com que esta geração experimente várias coisas, até finalmente decidir o que quer. Além disso, a instabilidade em que vivem também faz com que seja difícil sair da casa dos pais mais cedo ou começar uma vida a dois.
Apesar disso, “a família e o trabalho continuam a constituir valores importantes para os jovens”, refere Maria Manuel Vieira. No entanto, está a verificar-se uma alteração na forma como se pensa no conceito de família. “Hoje em dia, há uma pluralidade de possibilidades de famílias que é bastante mais alargada do que foi no passado”, explica a socióloga.
Versáteis e empreendedores
Esta geração foi ensinada a adaptar-se, porque “sofreu na família ou com esta os efeitos da crise económica que afetou muitos pais e provocou muito desemprego. Há uma série de vivências que terão marcado a sua existência”, afirma a coordenadora do Observatório Permanente da Juventude, explicando que a crise teve impactos diferentes entre a geração Z e os millennials. Estes últimos tiveram um embate mais direto, visto que, na altura, estavam a tentar entrar no mercado de trabalho.
“Os millennials passaram por momentos de crise, não estão tão abertos ao risco. Já a geração Z é muito mais propícia a criar o seu próprio negócio, porque nasceu no tempo dos unicórnios (startups tecnológicas que são avaliadas em mais de mil milhões de dólares)”, afirma Solange Soares.