Vêm de áreas diferentes – da literatura ao empreendedorismo, da ciência ao trabalho em ONG, sem esquecer a dança –, mas têm três coisas em comum: são jovens, fazem o que gostam e destacam-se no seu ofício, ou seja, o futuro é deles, sem sombra de dúvidas.
Rúben Pacheco Correia, empreendedor — 23 anos
É proprietário de um dos restaurantes mais conhecidos da ilha de São Miguel, o Botequim Açoriano, em Rabo de Peixe. Tem cinco livros escritos, sendo o último uma ode à gastronomia dos Açores, é crítico gastronómico e estudante de Direito.
Por outras palavras, Rúben Pacheco Correia não consegue estar parado e é assim que se quer manter: “Espero continuar a escrever e, sobretudo, a sonhar. Sem metas não podemos marcar pontos”, assevera.
Filho e neto de chefes de cozinha, diz ter uma “ligação à gastronomia inata”, mas recuemos no tempo para perceber o porquê de se ter lançado na abertura de um restaurante com apenas 18 anos.
Foi “o realizar um sonho de família”, realça, acrescentando que a mãe, chefe de cozinha há mais de 20 anos, sempre sonhou ter um restaurante e o pai, que era chefe de bar, sempre desejou que a minha mãe não tivesse este sonho.
“A conjugação perfeita entre uma sonhadora otimista e um calculista pessimista. A minha mãe dá-me a força de que preciso para avançar sem medo nos projetos em que acredito. O meu pai faz-me pensar nos seus riscos e nas consequências que posso vir a ter caso não corram bem”, explica.
Pesando tudo isso decidiu avançar para “um espaço onde todos os elementos da família pudessem dar o seu contributo”. Pensou num lugar “onde a cultura estivesse sentada à mesma mesa da boa gastronomia açoriana” e o nome escolhido é uma homenagem à escritora e poetisa açoriana Natália Correia, que, outrora, imortalizou na capital portuguesa o tão conhecido Botequim da Graça.
“Temos organizado algumas tertúlias, lançamentos de livros, exposições, noites de música e jantares temáticos, tendo sempre como centro de mesa a bandeira dos Açores”, explica.
Sonhos e desafios
O sucesso tem sido tal que já pensou em reproduzir o conceito em Lisboa e no Porto. “Acabou por não acontecer. Pode ser que no futuro aconteça. Sou um rapaz de sonhos e desafios”, garante. Mas os seus sonhos não se ficam por aqui. Outro “é criar um espaço que possa ser merecedor de uma estrela Michelin nos Açores”.
Rúben Pacheco Correia tem “um projeto delineado para, em pouco tempo, colocar os Açores no mapa deste guia”.
“Mas só avançarei se o conseguir concretizar na minha freguesia, Rabo de Peixe, para acabar com os estigmas falaciosos que existem em relação a esta vila piscatória e mostrar ao mundo que, sim, somos diferentes, mas por boas razões. Mais do que um sonho para mim, será uma das maiores felicidades da minha vida ver a minha mãe galardoada com uma estrela. Ela merece”, sublinha.
Atualmente, por causa da pandemia, o Botequim Açoriano tem estado em regime de take-away e Rúben Pacheco Correia pede muita ponderação na abertura dos restaurantes. “Abrir os restaurantes à pressa, mesmo com todas as medidas de segurança, não é solução. Não vale de nada abrirmos a porta se não vamos ter clientes para entrar.”
A que sabem os Açores
Se a gastronomia é uma paixão, a escrita não lhe fica atrás. “O meu contacto com os livros começou muito cedo. Na escola, fui, de certa forma, excluído de alguns grupos que, naturalmente, se formavam. Não gostava de jogar à bola nem de brincar à apanhada e comecei a refugiar-me na biblioteca a ler. E, de forma natural, fui criando os meus textos, as minhas histórias e personagens”.
Foi um desses textos que viu tornar-se livro (Kamel e Lâmpada Árabe, Edições Vieira da Silva) com apenas 14 anos.
Em fevereiro deste ano, juntou os dois amores, os livros e gastronomia, com a publicação de Comer à Moda dos Açores (Contraponto). Viu nele a hipótese de contribuir para “a preservação da gastronomia açoriana mais antiga. Este meu livro é, sem dúvida, uma homenagem às cozinheiras que, longe dos holofotes e da ribalta, nos deixaram como herança este património. Muitas vezes, a escassez de comida e a falta de diversidade de ingredientes e produtos estimulavam a sua imaginação”, explica.
Da gastronomia açoriana diz ser “diversa, rica e apimentada”. Curiosamente, descobriu durante a sua pesquisa para o livro que “é muito difícil dizer que uma receita é desta ou daquela ilha, porque há variações de uma só receita até dentro da própria ilha. Ou o nome é diferente ou apenas difere de um ramo de hortelã para um ramo de salsa. As Sopas do Espírito Santo são um exemplo disto mesmo”.
Teve ainda acesso a histórias incríveis sobre algumas das gastronomias que influenciaram a açoriana (como o Algarve), mas também a influência que a gastronomia do arquipélago teve noutras.
“Destaco, muitas vezes, o exemplo das malassadas que foram levadas por açorianos para o Havai e que neste momento é um dos doces típicos deste Estado”, remata.
Os favoritos de Rúben Pacheco Correia
Prato: “Chicharros fritos com molho de vilão; faz-me recordar a minha bisavó Rosa.”
Ingrediente: “Pimenta da terra, que está na base da maior parte das receitas dos Açores.”
Livro: “Caim. Foi o primeiro livro que li de José Saramago, um dos meus autores preferidos. Este primeiro impacto com a sua escrita despertou-me a curiosidade de depois descobrir a sua obra.”
Escritor: “Português, José Saramago, pela fluidez e diferenciação da sua escrita. Estrangeiro, Fiodor Dostoievski, que é o melhor romancista que conheço.”
Lugar dos Açores: “Lagoa do Fogo, uma das paisagens mais incríveis de São Miguel.”