Nutrição

Crónica. Sensibilidade e bom senso: a natureza de volta ao prato

Recupere a poderosa prática de cozinhar vegetais em água fervente. Sinta-se bem, leve e rejuvenescida com doses diárias de verdes.

Untitled-7 Untitled-7 Untitled-7
Crónica. Sensibilidade e bom senso: a natureza de volta ao prato Crónica. Sensibilidade e bom senso: a natureza de volta ao prato
© twenty20
Paula Azevedo, cronista
Escrito por
Abr. 30, 2021

A claridade marca o ritmo, o calor aumenta e uma chuva branda e fresca cai sobre a terra. O clima da primavera encoraja tudo quanto está vivo a filtrar, a germinar e a crescer. É a altura ideal para abrirmos a nossa cozinha e deixar que o que floresce na terra a encha de vida.

A esperança que se mastiga também é verde

No último artigo falámos da força expansiva da primavera e da relação próxima que mantém com o fígado. Da estabilidade dos nossos humores à agilidade dos nossos tendões e músculos, o fígado rege a gestão de toxinas que circulam no organismo.

Tonificar o fígado é simples: mais movimento e menos estagnação no corpo; menos animais e mais vegetais no prato. Um sangue depurado, que circula sem dificuldade e que chega a todas as extremidades, estimula a flexibilidade mental e física de que se alimenta a paciência e a confiança quando nos queremos abrir a novas possibilidades e caminhos.

Por tudo isto, é frequente assistirmos a tantas dietas, programas e desintoxicações por esta altura do ano. No entanto, uma enorme revolução pode partir de um pequeno gesto.

Comer plantas sazonais

As plantas são excelentes tónicos naturais. Carregadas de sol, de hidratos de carbono, de vitaminas, de fibra, de antioxidantes e de microrganismos, alimentam a nossa vitalidade, nutrindo células, tecidos e pele. Ajudam o corpo diariamente, por ação do fígado, a desintoxicar-se e a restabelecer-se.

E se é certo que se devem comer plantas todo o ano, há para cada estação e para cada região variedades específicas.

Quanto à quantidade, devem ajustar-se ao que as acompanha no prato. Se come mais carne ou peixe, abuse dos verdes, pois servem de contraponto a uma energia mais densa que se acumula com mais facilidade no corpo, causando muitas vezes problemas como doenças cardíacas, colesterol e obesidade.

No limiar entre o frio do inverno e a secura do verão, a Natureza enche-se de verde, de viço e de fertilidade
Paula Azevedo Paula Azevedo

Começar pelo básico: escaldar vegetais

São infinitas as formas de cozinhar vegetais. Decidir o método culinário que mais nos convém é tema para outra crónica, mas comecemos por escaldá-los: cozinhá-los de forma rápida em água fervente.

Esta técnica torna-os mais digeríveis sem desvitalizá-los. Os legumes mantêm a sua vitalidade, frescura e textura crocante, que, do ponto de vista da medicina oriental, são as qualidades que ganhamos quando os consumimos com regularidade.

O que escaldar?

No limiar entre o frio do inverno e a secura do verão, a Natureza enche-se de verde, de viço e de fertilidade. E entre o calor, a humidade e as chuvas, as hortaliças e os vegetais de folha larga e verde, de texturas mais delicadas e flexíveis, ganham força nas colheitas de primavera.

Por esta altura, comece por cozinhar grelos, nabiças, couves, acelgas, agrião, alho francês. Ainda consegue encontrar brócolos, cujas folhas verdes são uma delícia. Encontrará nabos e rabanetes, ou mesmo raízes, como as cenouras, excelentes, que se escaldam todo o ano.

Como fazer?  

1. Coloque uma panela de água a ferver com uma pitada de sal marinho. Não exagere na quantidade de água, o que se pretende é que a água da panela esteja sempre em modo fervente.

2. Arranje delicadamente as folhas, à mão, se quiser. Corte os legumes de textura mais firme em pedaços. Não precisam de ser muito pequenos, mas o tamanho deve ser uniforme, para que cozinhem todos ao mesmo tempo.

3. Quando a água estiver a ferver, junte os vegetais à panela. Pode fazer só uma variedade ou fazer uma mistura de várias plantas, utilizando folhas, tubérculos e raízes. Neste caso, escalde cada variedade em separado, o que também ajuda a conservar o genuíno sabor de cada um. Vá dos sabores mais delicados aos sabores mais fortes e pungentes, e das cores mais claras às mais escuras.

4. Ferva por 3 a 5 minutos. Prove. Coisas diferentes têm tempos diferentes. Vegetais com mais fibra e texturas mais rijas demoram mais tempo. As folhas devem estar cozinhadas e tenras e os legumes devem manter uma textura crocante. Tudo o que escaldar deverá manter a sua cor, que apenas se altera ligeiramente.

5. Quando estiverem no ponto, retire e deixe escorrer a água da cozedura num coador. Reserve separadamente.

6. Se escaldar mais que uma variedade, dê tempo à água para voltar a ferver na panela e junte a próxima leva.

7. Quando tiver terminado, junte todos os elementos escaldados numa travessa.

8. Pode servi-los com um fio de azeite e vinagre, como é mais habitual, mas umas gotas de molho de soja de boa qualidade torna-os deliciosos e mais equilibrados. Varie entre umas gotas de vinagre de ameixa umeboshi, vinagre de arroz, sumo de limão ou mesmo um molho vinagrete feito em casa.

Deixe-se inspirar pela sazonalidade e faça-se valer da sua sensibilidade e do seu bom senso: para escolher, comprar e cozinhar
Paula Azevedo Paula Azevedo

Fast forward

Quando dominar a técnica de escaldar, pode cozinhá-los ao mesmo tempo. Junte à água a ferver os vegetais que demoram mais a escaldar e dê-lhes uns minutos de avanço, para de seguida juntar os legumes mais macios, de cozedura mais rápida. Retire-os da panela ao mesmo tempo.

As desvantagens desta abreviação é que perde o sabor característico de cada variedade mas ganha tempo, que pode ser a diferença entre fazer ou não fazer.

4 detalhes fundamentais

  • Escolha ingredientes frescos e sazonais;
  • Sempre que possível, escolha alimentos de produções biológicas;
  • Cultive o hábito de comprar em feiras, mercados e de pequenos produtores;
  • Respeito o tempo de confeção de cada ingrediente.

Cozinhar vegetais é uma habilidade perdida. Excessivamente cozinhados, espapaçados e sem cor, temos passivamente remetido os vegetais nas nossas mesas para segundo plano.

É tanto assim que acabamos, vezes sem conta, com composições monótonas da alface de estufa com meia dúzia de gomos de tomate verde e ácido, completamente fora de época.

Deixe-se inspirar pela sazonalidade e faça-se valer da sua sensibilidade e do seu bom senso: para escolher, comprar e cozinhar.

Recuperar o prazer de trazer os vegetais de volta ao prato e ao nosso dia a dia é provavelmente um dos passos mais poderosos que podemos fazer pela nossa saúde. Saúde que se sente, mas que também se vê!

Paula Azevedo é consultora, professora e chef de Macrobiótica. Para mais informações, contactar através do e-mail p.narciso.azevedo@gmail.com.

Últimos