Nutrição

Crónica. Será intolerância, sensibilidade ou alergia alimentar?

O que são as intolerâncias alimentares? Não é o mesmo que alergia? E o que são as sensibilidades alimentares?

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Crónica. Será intolerância, sensibilidade ou alergia alimentar? Crónica. Será intolerância, sensibilidade ou alergia alimentar?
© unsplash
Inês Soares, nutricionista
Escrito por
Out. 24, 2023

São cada vez mais as perguntas que fazemos sobre estes temas, mas a miscelânea de informação disponível deixa-nos apenas mais confusos.

Assim, resolvi pegar nestas questões para perceber quais as diferenças entre intolerância, alergia e sensibilidade alimentar, dado que os sintomas e a sua perceção podem ser semelhantes. Contudo, existem diferenças que tornam possível separar claramente estas situações.

O que são intolerâncias alimentares?

A intolerância alimentar surge quando o nosso sistema digestivo não consegue digerir, de forma eficaz, os alimentos cosumidos.

Caracteriza-se por uma reação adversa do nosso organismo, que não envolve o sistema imunitário, mas que nos gera desconforto, sobretudo a nível gastrointestinal.

Ou seja, o que acontece é que o corpo, por falta de capacidade de atuação enzimática, não digere o alimento na sua totalidade e os nutrientes não conseguem ser bem absorvidos.

Por trás de uma intolerância à lactose

Já deve ter ouvido falar sobre a intolerância à lactose, certo? A lactose é um hidrato de carbono simples, tratando-se, mais concretamente, do açúcar naturalmente presente no leite de todos os mamíferos.

Quando ingerimos alimentos que contenham lactose, é necessário que, no intestino, a enzima lactase – produzida na mucosa intestinal – divida a lactose em dois compostos mais simples: a glicose e a galactose. Só assim será absorvida pela nossa corrente sanguínea e, posteriormente, nos fornecerá energia.

No entanto, sem a presença desta enzima, não conseguimos digerir os alimentos que contenham lactose e, consequentemente, existe uma reação exagerada do organismo. Posteriormente, depois de contacto continuado, poderá desencadear processos inflamatórios no organismo.

As queixas mais frequentes são:

• Distensão abdominal;
• Flatulência;
• Dor abdominal;
• Dor de cabeça;
• Sensação de mal-estar.

Resolve-se retirando o alimento da dieta ou tomando enzimas digestivas para a otimização da digestão.

Então e a alergia alimentar?

A alergia alimentar ocorre quando ingerirmos determinado alimento e o nosso sistema imunitário identifica uma proteína nos alimentos como “um invasor” e desencadeia uma resposta à base de anticorpos para combater esse mesmo “invasor”.

É assim que surgem reações variáveis na severidade, desde sintomas mais leves a graves, podendo mesmo originar a morte da pessoa em causa.

Ao contrário das alergias alimentares, que afetam o sistema imunitário, as intolerâncias são bem menos severas e não implicam um risco para a vida.
Inês Soares, nutricionista Inês Soares, nutricionista

A alergia alimentar pode envolver diferentes mecanismos imunológicos.

No caso da alergia alimentar mediada por imunoglobulina (Ig)E ou IgE-mediada – a forma mais comum -, resulta na produção de anticorpos de tipo IgE contra o alimento.

A reação é imediata e os sintomas surgem nos primeiros trinta minutos ou até 2 horas após o contacto com o alimento, que pode originar uma reação severa ou até mesmo ser fatal com presenças vestigiais do alimento.

Já numa alergia alimentar não IgE-mediada estão envolvidos outros mecanismos imunológicos, células ou outros anticorpos. Trata-se geralmente de uma reação mais tardia, com início mais de 2 horas após a ingestão do alimento, o que pode dificultar o diagnóstico.

Dentro dos alimentos alergénicos mais frequentes destacam-se:

Leite;
• Frutos secos;
• Amendoins;
• Ovos;
• Marisco;
• Trigo;
Soja;
• Peixe.

Os sintomas mais comuns são falta de ar, urticária e vermelhidão, bem como inchaço nos olhos, boca e língua. Em casos mais sérios, pode originar choque anafilático, que pode ser fatal.

Sem cura

Infelizmente, as alergias alimentares não têm cura e as causas não são totalmente conhecidas. Além disso, podem ser adquiridas ao longo de toda a vida.

O alívio de alguns dos sintomas das alergias alimentares pode ser feito com anti-histamínicos.

Contudo, as pessoas que têm alergias alimentares graves diagnosticadas, devem ter sempre consigo um dispositivo de adrenalina que é prescrito pelo médico alergologista após a deteção da alergia em causa.

Ao contrário das alergias alimentares, que afetam o sistema imunitário, as intolerâncias são bem menos severas e não implicam um risco para a vida.

E a sensibilidade alimentar?

A sensibilidade alimentar refere-se a uma reação adversa ao consumo de um alimento ou ingrediente específico, mas sem o envolvimento direto do sistema imunitário.

As causas da sensibilidade alimentar podem ser variadas e incluem fatores como alterações enzimáticas, sensibilidade a componentes químicos do alimento, entre outros.

Os sintomas podem ser diversos e não se limitam ao sistema gastrointestinal, podendo causar desconforto significativo tais como incluir dores de cabeça, fadiga, dores musculares, entre outros.

Se existir suspeita de ser alérgico, intolerante ou hipersensível a um determinado alimento (constituintes do alimento), deve consultar um médico especialista em imunoalergologia e, posteriormente, um nutricionista.
Inês Soares, nutricionista Inês Soares, nutricionista

Como exemplo, temos a sensibilidade não celíaca ao glúten, que ocorre quando uma pessoa apresenta sintomas semelhantes aos da doença celíaca, mas não tem a doença, dado que não é uma reação alérgica e também não é uma reação autoimune, como a doença celíaca.

Ou seja, como não há destruição da mucosa intestinal decorrente da resposta imunológica ao glúten, tal como na doença celíaca, o diagnóstico é feito, muitas vezes, apenas com base na melhoria de sintomatologia depois da eliminação de glúten da nossa alimentação.

Posto isto, se existir suspeita de ser alérgico, intolerante ou hipersensível a um determinado alimento (constituintes do alimento), deve consultar um médico especialista em imunoalergologia e, posteriormente, um nutricionista para o ajudar na exclusão dos alimentos em causa sem que haja défices nutricionais.

Formada em Ciências da Nutrição, pelo Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz, Inês Soares possui ainda uma pós-graduação em Nutrição Pediátrica, pelo Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa. Neste momento, está a fazer formação em Microbiota, sendo que as áreas que mais estuda são a microbiota intestinal e o sistema gastrointestinal, no geral. Porém, costuma dizer que é uma apaixonada nata pela nutrição. Podem encontrá-la na clinica IaraRodrigues, onde é nutricionista e dá consultas, desde 2017.

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