Em novembro passado, o fundador da Amazon, Jeff Bezzos, aconselhou os consumidores a adiarem as grandes compras familiares para se prepararem para a crise que se adivinha. Se até a quarta pessoa mais rica do mundo está pessimista, talvez seja boa ideia prestar atenção.
Depois da crise de 2008, da pandemia e da guerra na Ucrânia, já devíamos ter aprendido que as coisas podem ficar sempre pior. Neste caso, mais caras.
A taxa de inflação tem registado aumentos significativos e tudo indica que nos próximos tempos iremos continuar a conviver com a subida generalizada dos preços. No último trimestre de 2022, a inflação chegou a 10,1%, um valor bem acima dos 4,1% do ano anterior, o que nos transportou para um novo cenário de crise e dificuldades financeiras.
Apesar disso, a conjuntura deverá melhorar ainda em 2023. “As previsões das instituições apontam para que os preços continuem a aumentar no próximo ano, mas de forma mais moderada”, avança Sara Antunes, diretora de Comunicação e Conteúdos da plataforma de literacia financeira Doutor Finanças.
“Segundo a Comissão Europeia, no próximo ano a inflação em Portugal deve situar-se nos 5,8 %, e o Governo estima este valor em 4%”, acrescenta.
A descida da inflação não significa que os preços vão descer, atenção, mas sim que irão subir mais comedidamente. Sem conseguir aumentar os rendimentos, poupar pode parecer um milagre, mas nunca foi tão necessário, dizem os especialistas.
Veja como pode fazê-lo.
3 formas de enfrentar a subida de preços
1. Finanças
Usar o PPR para pagar a renda
Existe a “possibilidade de usar o PPR para pagar as prestações do crédito habitação sem penalizações pelo resgate antecipado, desde que o resgate mensal não seja superior a 478,70€ por mês. Até ao final do próximo ano, estes resgates podem ser feitos para pagar o crédito habitação ou para outros fins”, esclarece Sara Antunes.
“O objetivo do Governo é ajudar as pessoas a usarem as suas poupanças para enfrentarem os desafios que se avizinham, seja pelo aumento das prestações de crédito, seja devido à subida generalizada de preços”, acrescenta.
IRS: Mais dinheiro agora, menos depois
“As principais alterações estão relacionadas com as tabelas de retenção na fonte, especialmente na segunda metade do ano, em que será introduzido um novo modelo de cálculo que diminuirá as retenções, o que significa que as famílias verão o rendimento líquido a aumentar“, explica Sara Antunes.
Apesar de constituírem um alívio momentâneo, isto vai revelar-se amargo na altura de fazer o IRS de 2024, data em que, devido à menor retenção na fonte em 2023, o imposto a pagar será inevitavelmente maior – ou a devolução do imposto pago substancialmente menor.
Poupar nas despesas fixas
A maior parte das despesas fixas, como água, luz, gás, Internet e seguros, podem e devem ser renegociadas periodicamente, dizem os especialistas em finanças pessoais.
“No caso da energia, é possível mudar regularmente de fornecedor e aproveitar as melhores condições do mercado. A ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) tem um simulador que nos ajuda a encontrar o comercializador com o melhor preço, seja no mercado liberalizado, seja no regulado”, lembra a diretora de Comunicação.
2. Alimentação
Comer melhor, gastar menos
O custo da alimentação subiu cerca de 19,31% nos últimos meses, de acordo com a DECO. Ainda assim, Joana Mendonça, nutricionista da equipa Celeiro, garante que é possível otimizar as compras sem comprometer a saúde.
“Devemos priorizar os alimentos de base vegetal para uma alimentação saudável, apostando num maior consumo de frutas e vegetais sazonais e até considerar algumas refeições vegetarianas em alguns dias da semana tendo em conta que a proteína vegetal, proveniente das leguminosas tem, por norma, um custo significativamente inferior à proteína animal”, sugere.
Planear, contabilizar, organizar
“Ver os folhetos de promoção e fazer compras semanais possibilita uma melhor gestão dos alimentos mais perecíveis, assim como planear antecipadamente as refeições ajuda a não ir atrás de promoções que nos impulsionam a comprar produtos que não compraríamos de outra forma” reflete a nutricionista.
“No que toca ao planeamento, podemos começar por considerar quantas refeições serão de facto confecionadas em casa, será que vamos comer fora alguma vez esta semana? Na lista, incluir as quantidades exatas de cada produto, evitando comprar em excesso, a não ser em caso de promoções que o justifiquem”, acrescenta.
Evitar o desperdício
• Preparar alimentos perecíveis logo após a compra poupa tempo e aumenta a probabilidade de os consumir mais tarde (ex: lavar e cortar alface);
• Ajustar o tamanho das porções no prato. Comer doses menores, pôr no prato só o que come;
• Não esquecer as sobras. Acondicioná-las corretamente no frigorífico irá permitir que se conservem mais tempo;
• Congelar sobras de refeições feitas em maior quantidade em porções individuais;
• Congelar alimentos como pão, carne e até mesmo alguma fruta que não vá ser consumida dentro de pouco tempo;
• Comprar congelados quando se encontram em promoção, duram cerca de 18 meses no congelador;
• Aproveitar as promoções de frescos e congelá-los, podem ser consumidos no espaço de seis meses.
3. Poupança
Fundo de emergência: poupar para navegar as crises
Desde 2008 que temos vindo a assistir a crises económicas sucessivas, um facto que, segundo o jornalista especializado em assuntos económicos Pedro Andersson, autor, entre outros, do livro Contas-Poupança – Como Superar a Inflação e Ganhar com a Crise, nos devia fazer entender que a nossa situação financeira é sempre frágil.
“Se hoje perdesse o emprego ou tivesse de deixar de trabalhar, tinha dinheiro para pagar as suas despesas durante quantos meses? É esta a importância de ter um fundo de emergência”, diz.
Este deve consistir em ter, numa conta à parte (intocável), o mínimo de seis meses a um ano do dinheiro necessário para cobrir todas as suas despesas fixas e variáveis essenciais.
Orçamento mensal: controle o dinheiro
Se dá por si no fim do mês a perguntar-se para onde fugiu o dinheiro, provavelmente precisa de gerir melhor as receitas e despesas, ou seja, ter um orçamento mensal.
“Faça uma lista de todas as suas despesas mensais (mesmo as mais pequenas). Se, depois de pagar tudo, não lhe sobra 10% dos seus rendimentos, tem de cortar essas despesas até que atinja esse objetivo”, diz Pedro Andersson.
Sair do lodo
Para quem está em situações mais difíceis, pagar as dívidas deve ser uma preocupação cimeira.
“Depois de ter um fundo com pelo menos 1000€ (por ser mais ou menos simbólico), deve começar a dividir as suas poupanças entre o reforço desse fundo e a amortização antecipada de todos os seus crédito/dívidas — exceto o crédito à habitação”, aconselha Pedro Andersson.
“Deve começar por amortizar os créditos com os juros mais elevados. Primeiro, acabar com a dívida dos cartões de crédito e só depois o crédito automóvel, e assim sucessivamente”, adiciona.