Made in Portugal: a marca de joias que nasceu do amor à porcelana
A fragilidade da porcelana, a elegância do ouro e a sofisticação do design são as três características principais das peças da Sömmer, a marca portuguesa que lhe damos a conhecer.
Do amor ao design e à identidade portuguesa, Sofia Bártolo criou uma marca de joalharia que une a porcelana, um material tão típico português, ao ouro.
Depois de dez anos a trabalhar como diretora de arte para algumas das melhores agências de publicidade do mundo e como ilustradora para jornais como o Diário de Notícias e La Vanguardia, Sofia Bártolo aliou o conhecimento adquirido pelo caminho ao seu talento e lançou finalmente o projeto com que há muito sonhava.
Então, desde 2018, a Sömmer cresceu e conquistou o seu lugar na indústria como uma marca de joalharia sustentável, inspirada na natureza, com peças sofisticadas pensadas para a mulher moderna, e que conta já com seis coleções, sendo que quatro delas foram lançadas nos primeiros três meses de existência da marca.
Para a fundadora, a Sömmer é nada mais nada menos do que o reflexo da paixão, tempo e dedicação. “As peças que produzo são clássicas e atemporais e albergam uma história de amor, cujo início acontece no atelier e continuará a ser escrita por quem as recebe.”
Saiba tudo sobre esta marca portuguesa, desde a sua idealização à concretização.
Entrevista a Sofia Bártolo, fundadora da Sömmer
Como começa a história da marca?
A Sömmer nasceu num apartamento em Madrid, em resposta ao desejo de criar livremente com as minhas próprias mãos. Fascina-me o trabalho artesanal e aprender a moldar a porcelana estava na minha bucketlist.
Em 2018, senti que chegara a altura de riscar essa vontade da lista e, em outubro de 2019, decidi revelar o projecto que até então tomava forma entre quatro paredes. Foi nesse momento que a Sömmer ganhou um rosto, personalidade e um espaço online.
Quanto tempo demorou até concretizar esta ideia de negócio?
Desde que adquiri os primeiros materiais e produzi as primeiras peças até ao dia do lançamento da marca, passou um ano.
Foi um processo que foi acontecendo organicamente: eu produzia estas esculturas de pequena dimensão em casa, de forma totalmente pessoal, para depois levá-las a um atelier de ceramistas para serem cozidas. Comecei a ver potencial no meu trabalho e espaço no mercado para o receber. As peças que fabrico são singulares, atraem pela elegância — não é comum ver a porcelana associada a acessórios de moda, mas é delicado e atraente. São bonitos detalhes, materializados em acessórios, que sustentam o negócio que hoje é a Sömmer.
Como surgiu a ideia de juntar a porcelana ao ouro?
Trabalhar o ouro sobre a porcelana é uma prática centenária e fascinante. É um trabalho exigente pela parte técnica, mas que em muito compensa pela beleza da peça finalizada.
Eu tinha uma vontade muito grande de aprender esta técnica e comecei a aplicar o ouro ainda nas primeiras peças que moldei.
Ao longo do tempo, fui testando e aperfeiçoando a minha arte: aprendi a ser mais rigorosa com o desenho, a controlar melhor a quantidade de ouro aplicada e fui aligeirando o ciclo térmico do ouro (no forno) para que este saísse com o maior e mais perfeito reflexo.
Quais as principais dificuldades de trabalhar esses materiais?
Tanto a porcelana como o ouro são materiais caprichosos. É preciso respeitar os tempos de espera. Seria impossível conseguir uma destas peças da noite para o dia.
Catorze dias é o tempo mínimo necessário para que cada uma destas esculturas ganhe vida. Entre processos de moldagem, corte, escultura, secagem, esmalte, cozedura e colagem são dedicadas muitas horas a cada peça. Deste tempo nascem acessórios cuidados, realizados com muito carinho e onde coloco tanto de mim. Gerir este compasso de tempo é o maior desafio.
Esculpidas e pintadas à mão, como acontece o processo de criação de uma peça?
O processo de fabricação começa com uma barra de porcelana crua, que tem de ser trabalhada para evitar o aparecimento de bolhas e, ao mesmo tempo, ganhar a flexibilidade necessária.
Em seguida, a porcelana é alisada sobre uma superfície plana, com uma espessura uniforme, para se iniciar o processo de corte. Posteriormente, as peças são deixadas a secar por dias, sem pressa.
Durante esse tempo, a porcelana perde água por evaporação ao ar, à temperatura ambiente e, a partir daqui, as peças estão prontas para serem polidas, manualmente, uma por uma. De seguida, vão ao forno a uma temperatura de 1000ºC e segue-se a aplicação do esmalte.
Embora a porcelana seja um material muito resistente, cada peça é esmaltada para reforçar esta característica e, ao mesmo tempo, permitir pintar os detalhes em ouro puro, à mão.
Existe então um novo ciclo de temperatura, a mais elevada, que atinge os 1250ºC. Apenas as peças que contêm detalhes em ouro têm que passar por um terceiro e último ciclo de forno, para que o ouro se possa desenvolver corretamente durante 36h.
Tempo e dedicação, além de 3 fornos distintos, são o necessário para dar vida a estas peças.
Como acontece o processo criativo?
A Sömmer é um reflexo do meu tempo e vontade e, por isso, todas as peças nascem de forma orgânica, sem que me sinta pressionada em reger-me por um calendário preestabelecido.
Sempre que tenho necessidade de criar e de explorar novos caminhos criativos, reservo o silêncio, um caderno e um local bonito para o fazer. Talvez uma música ou um lugar singelo para me inspirar como o Selina, aqui na Ericeira — e desenho, desenho muito.
Outras vezes sonho acordada com novas ideias e preciso de ir para o atelier experimentar, testar, ver como se materializa o pensamento. Alguns dos designs da última coleção, por exemplo, ganharam vida neste processo de ensaio e prova e não necessariamente do papel.
Onde procura inspiração para novos designs?
Sem dúvida que a natureza e a figura feminina são os meus principais pilares de inspiração. Gosto imenso de registar lugares brutos e crus como é o caso do Parque Nacional de Timanfaya, em Lanzarote, e que serviu de referência para a coleção de porcelana preta com o mesmo nome.
Quanto à figura feminina, as minhas maiores referências são as mulheres da minha vida, que refletem a complexidade do mundo feminino em toda a sua expressão. Retratar a beleza do universo feminino de forma delicada e bonita é algo que faço através das peças que produzo e isso é muito gratificante.
Quem é a mulher Sömmer?
Gosto de fantasiar que uma mulher como a Amélie (Audrey Tautou em O Fabuloso Destino de Amélie) ou a Maria Luiza (Maria Casadevall em Coisa Mais Linda) poderiam usar uma peça da Sömmer.
É uma marca minimalista, feminina e delicada e, como tal, está pensada para uma mulher elegante, com estilo effortless.
Como símbolo de memória ou expressão pessoal, uma joia é, pela sua natureza, uma forma simples e bonita de complementar um outfit. Acredito que estas peças são muito versáteis: podem completar tanto um outfit de jeans, t-shirt branca e Converse, como um look de verão, com um vestido leve e florido e Josefinas, ou ainda um jumpsuit mais elegante para um jantar especial.
A sustentabilidade é uma das preocupações da marca. Como é que concretiza este conceito?
Para mim foi importante criar a Sömmer assente numa filosofia de menor impacto ambiental possível. Para isso, foi necessário ter atenção a todos os detalhes e criar peças duradouras e garantir um volume de produção controlado. A minha prioridade é o oposto do fast fashion.
A escolha dos materiais utilizados teve um importante papel: a porcelana, uma vez submetida a elevadas temperaturas, é muito resistente e dura para sempre, não perde a cor ou a forma; quanto às partes metálicas, estas são de gold-filled, o que significa que, uma vez cuidadas e devidamente preservadas, têm também uma grande longevidade.
Adquiro os vários materiais imprescindíveis à manufatura de cada peça a fornecedores europeus, certificados, o que significa que a angariação da matéria-prima, bem como as condições de trabalho e o respeito pelo ambiente cumprem os standards da União Europeia.
Não existe desperdício de matéria e o stock não é infinito. Todas as peças são produzidas por mim, no atelier, na Eiriceira, consoante a necessidade de repor unidades, tendo sempre em atenção a máxima rentabilização do forno — a minha maior fonte de gasto energético.
Também a escolha do packaging foi importante. As caixas são de cartão, reciclável e, por último, mas não menos importante, nos envios todas as peças são devidamente acomodadas e protegidas por uma bolsa de tecido, que os clientes devem guardar para as preservar.
Quem são as clientes mais fiéis?
Os clientes mais fiéis não são portugueses e nem sempre são mulheres.
A joalharia está impregnada de significado e está, muitas vezes, associada a um marco importante. Neste sentido, muitas mulheres recebem as peças da Sömmer como um presente, para assinalar uma data, por exemplo.
Quem procura uma peça especial, realizada com carinho pelo próprio artesão, encontra-a na página online da marca, no entanto, muitos clientes do sexo masculino veem no meu trabalho abertura para criar uma peça singular.
Ao longo do último ano foram vários os projetos desenvolvidos em estreita comunhão com os clientes e é cada vez mais comum procurarem a Sömmer para a execução de uma peça única, em porcelana.
O que é que a Sömmer traz de diferente para o mercado nacional?
A reinterpretação da identidade portuguesa, ao trazer para o dia a dia um material que tanto nos caracteriza; um processo cuidado e artesanal que se manifesta em peças tão delicadas e singelas; e uma imagem elegante, colorida e feminina que vem romper com o mercado convencional de retalho de joalharia.
Acredito que com similitude a um livro ou pintura, uma joia pode evocar um sentimento, uma vez associada a um momento, a uma pessoa ou a uma história e, por isso, quem adquire uma peça da marca fá-lo não por impulso, mas pela vontade de realizar uma compra pensada e ponderada, porque atribui valor e significado ao trabalho que realizo.
O que podemos esperar para o futuro?
Depois de um ano tão atípico, a porcelana mostrou-se como um porto seguro, um lugar para me abstrair da nuvem cinzenta que se apoderou do mundo. Neste lugar há sempre cor, amor e uma história bonita. E é, precisamente, nestes termos que os próximos designs e projetos estão a tomar corpo.
Ainda há muito para polir antes destas ideias verem a luz do dia mas, por agora, posso adiantar que outros acessórios — que não brincos e colares — irão incorporar a marca.