A Tavares celebra 100 anos de história em família (e a ourivesaria estará sempre de parabéns)
É em 1922 que começa a história da Tavares, uma ourivesaria que continua a ser um negócio familiar, homenageando sempre os antepassados que a fizeram erguer-se. A qualidade, o cuidado e o amor pelo ouro serão sempre os pilares de uma marca que é agora centenária.
“Lembro-me de o meu pai estar a atender um fornecedor a comprar pulseiras de prata e eu estar a olhar. Esse mesmo fornecedor olhou para mim e disse: ‘escolhe um miminho para ti’. São estas as recordações que tenho. Lembro-me de estar no armazém onde se guardavam as caixinhas amarelas quase até ao teto. Na altura, tudo aquilo era gigante”, conta Ana Tavares, sócia-gerente da Tavares.
Foi a 1 de outubro de 1922 que Virgílio Aristides Tavares, juntamente com os sócios Gaspar José de Andrade, Miguel da Silva Andrade e Manuel da Silva Andrade, ergueu aquela que viria a ser um marco da joalharia e ourivesaria portuguesa. O número de histórias da marca é quase equivalente à sua idade. Este ano, a Tavares celebra o centenário tendo sempre a família como alicerce do sucesso que tem vindo a conhecer.
“Só criando uma relação com as pessoas é que podemos sobreviver durante 100 anos”, afirma Carlos Tavares, também sócio-gerente. Ao mostrar-nos a loja, que já foi casa da família, o neto de Virgílio Aristides Tavares reforça a importância de “proteger a ourivesaria tradicional”, mas nunca deixando de acompanhar os tempos modernos – ou como se diz, o novo mundo digital.
O centenário não impediu a modernização da marca. Agora com loja online, a terceira geração da família pretende continuar a apostar num mercado cada vez mais jovem e com outras exigências. “A nova geração [da família] ajuda na parte digital, nomeadamente com as redes sociais. O mercado digital é muito atraente, mas muito difícil, pois obriga a grandes investimentos”, admite Carlos Tavares.
Também a pandemia teve o seu peso neste e em tantos outros negócios. Houve uma quebra de 26% em 2020, mas a Tavares conseguiu enfrentar os obstáculos. “A pandemia obrigou-nos a repensar o negócio, mas nunca descurando a celebração do centenário”.
Criaram um catálogo digital e inauguraram uma nova fachada no número 54 da icónica Rua da Junqueira, na Póvoa do Varzim (uma das primeiras ruas pedonais do País), berço da família, com uma montra que homenageia o ouro popular português.
A verdade é que 2021 foi o melhor ano de sempre, com um aumento de vendas em 16%, em relação a 2019, sendo que os casamentos tiveram, aqui, um papel importante nestes números – representando 20% da faturação.
Ao passearmos nesta rua, e ao passarmos pela loja Tavares, não visualizamos o que está para lá da montra. Acontece que esta loja histórica já foi a habitação da família Tavares. O avô Virgílio comprou-a em hasta pública, quando ainda era só um rés do chão, e ao longo dos anos foram aumentando o espaço, renovaram o primeiro andar e, hoje, continua a ser a oficina da marca.
Virgílio Aristides Tavares combateu na primeira guerra mundial, altura em que se notava a importância do ouro, muitas vezes como forma de subsistência das famílias. “O ouro é transportável”, conta-nos Carlos. “Na guerra sempre houve uma corrida às joias. O ouro tem sempre uma tendência de subida quando há conflitos bélicos, económicos e instabilidade no mundo. É um metal raro, com caraterísticas únicas, como a não-oxidação. A única coisa que o dissolve é o mercúrio, o seu único inimigo.”
O ouro pode ter sido sempre o core da ourivesaria Tavares, mas Carlos assegura que hoje já são muito mais do que isso. Se dos anos 70 aos 90 os clientes compravam peças para colecionar, hoje, a tendência de compra já será outra. “As pessoas usavam ouro como símbolo de poder e estatuto social. Em Portugal, e em específico no Norte, as pessoas usavam por fé e devoção e por poupança.”
O coração minhoto é um dos best-seller da Tavares e, em 2014, a atriz Sharon Stone conseguiu aumentar a procura por este ex-libris português, provando, tal como Carlos Tavares nos conta, que é possível usar uma peça tão trabalhada num look casual, de dia a dia. “As pessoas identificaram-se”, diz-nos.
As alianças são uma das grandes procuras dos clientes quando entram na Tavares, mas ainda é possível restaurar peças antigas, como brincos ou alfinetes, e pedir peças mais personalizadas.
Uma loja de histórias
“A visita à loja é, por si só, uma experiência. O atendimento personalizado e todos os empregados são formados”, garante Carlos Tavares. Como já tínhamos referido, a fachada é o mais recente o cartão de visita da Tavares e o primeiro detalhe que o cliente vê antes de pôr o pé dentro desta história.
“Vendemos sonhos e confiança. E confiança é o cliente perceber que pode acompanhar todo o processo de construção, desde o seu fabrico”. Isto acontece porque com uma designer de joias em loja, o cliente pode trazer uma pedra de fora, construir uma peça e até escolher o diamante que quer. O desenho é feito em 3D e todos os passos são acompanhados por si.
Voltando ao espaço físico, ao entrar na ourivesaria Tavares, encontramos do lado esquerdo as fotografias da fundação do espaço, com as gerações que criaram a marca, e com Medalha de Reconhecimento Poveiro, grau prata, pela Câmara Municipal da Póvoa de Varzim.
Estas homenagens estendem-se não só pela loja, como pela oficina, localizada na parte de trás, onde, através de um vidro, consegue observar-se o trabalho de restauro e personalização das peças. Ao todo, a equipa da Tavares junta entre 12 a 14 pessoas
Já na entrada, temos algumas coleções pensadas para o público mais jovem. “Se antes os colares eram para ostentar, hoje querem-se mais simples”, recorda-nos Carlos. Por isso, até as coleções de filigrana são mais leves e algumas não têm o coração minhoto.
No caminho pela loja, e também no balcão que data 1988, encontramos marcas como a Omnia, a Ti Sento ou a Couleurs D’Argent, mas também coleções de maior dimensão, e com valores mais elevados.
O que não se pode negar na família Tavares é a dedicação e o amor pelo negócio de família. Carlos e Ana Tavares vão todos os dias para a loja, trabalham as oito horas certas e nem no confinamento deixaram de marcar presença. “Sabe qual é para mim o dia mais triste da semana? É domingo. Chego ao final deste dia e só quero ir trabalhar, só quero ir para a loja”
Se antes as paredes desta loja eram palco de brincadeiras entre irmãos, agora é uma herança que quer estender-se por mais 100 anos.